Introdução
A
mediunidade é um dos pilares da Doutrina Espírita, conforme delineado por Allan
Kardec, mas seu exercício exige seriedade, discernimento e fidelidade aos
princípios evangélico doutrinários. Desde os tempos da Revista Espírita
(1858-1869), Kardec advertia sobre os perigos do entusiasmo exagerado, da
leviandade e da exploração dos fenômenos espirituais. Nos dias atuais, a
proliferação de publicações mediúnicas — muitas vezes sem a devida base moral e
doutrinária — reacende a necessidade de reflexão sobre o verdadeiro papel do
Espiritismo.
Este
artigo busca analisar os desvios presentes em parte da produção mediúnica
contemporânea e propor, à luz da Codificação, caminhos de retorno à essência da
Doutrina: a revivescência do Evangelho de Jesus como roteiro de vida e educação
do espírito imortal.
A Questão da Qualidade das Obras Mediúnicas
O
crescimento editorial das últimas décadas, embora revele interesse do público,
nem sempre corresponde a um avanço qualitativo. Observam-se livros que:
- atacam
sistematicamente dirigentes e instituições espíritas, em prejuízo do ideal
de unificação;
- descrevem de modo
mórbido regiões espirituais inferiores, exaltando o poder das trevas sem
apontar soluções;
- propagam mensagens
desestimulantes, que desvalorizam o estudo e a renovação íntima;
- exploram
investigações estéreis sobre reencarnações passadas, contrariando as
advertências de Kardec em O Evangelho segundo o Espiritismo,
capítulo V (“O Esquecimento do Passado”).
Essas
publicações, em vez de esclarecer, geram confusão, medo e descrédito, desviando
o Espiritismo de sua missão educativa e consoladora.
O Perigo das “Revelações Fantasiosas”
Kardec
sempre defendeu a análise criteriosa das comunicações espirituais, alertando
contra os “Espíritos pseudosábios” (O
Livro dos Médiuns, cap. XXIV). No entanto, multiplicam-se obras que
apresentam narrativas grotescas ou doutrinas fantasiosas, como a hipótese de
resgates coletivos por “naves
planetárias”. Tais ideias, além de carecerem de base científica, ferem o
bom senso e expõem a Doutrina ao ridículo.
Na Revista
Espírita (dezembro de 1861), Kardec já censurava os exageros e as
mistificações mediúnicas, lembrando que a missão do Espiritismo não é
satisfazer a curiosidade, mas iluminar a razão e formar consciências.
A Missão Moral do Espiritismo
A
grande lacuna das obras superficiais está na ausência de foco sobre as Leis
Morais, terceira parte de O Livro dos Espíritos. Nesse conjunto de
princípios, que poderia ser chamado de verdadeira “Sociologia Espiritual”, encontram-se os temas mais urgentes para a
humanidade: lei de justiça, de amor e caridade, de sociedade, de família, de
reprodução, de trabalho, de igualdade.
Kardec
e os Espíritos da Codificação ofereceram vasto manancial de ensinamentos que
ainda carece de aprofundamento e aplicação prática. Emmanuel, André Luiz e
outros benfeitores espirituais que se afinam com a Codificação não se afastaram
dessa diretriz: educação moral, evangelização, responsabilidade familiar e
social.
A Família e a Educação do Espírito
O
esquecimento das orientações quanto à infância revela grave descuido. No item
383 de O Livro dos Espíritos, os benfeitores espirituais afirmam que a
fase infantil é a mais propícia à educação moral do Espírito, porque nele ainda
prevalece a maleabilidade. Daí a importância de uma ação evangelizadora
precoce, que prepare a alma para os desafios da vida.
No
entanto, muitos médiuns e autores se perdem em descrições mórbidas do
além-túmulo, quando poderiam dedicar-se a fomentar o estudo da vida em família,
da responsabilidade nos lares e da orientação dos recém-encarnados. Essa seria
a verdadeira contribuição para um mundo melhor e para o Movimento Espírita.
O Verdadeiro Sucesso do Centro Espírita
Kardec
lembrava que o valor do Espiritismo está em sua força moral e transformadora, não
em números ou em aparências exteriores. O mesmo vale para as instituições
espíritas: seu êxito não deve ser medido pela quantidade de passes ou de bens
materiais distribuídos, mas pela capacidade de encaminhar almas — encarnadas e
desencarnadas — na direção do Bem e da vivência do Evangelho.
Conclusão
A
proliferação de publicações mediúnicas sem fundamento moral e racional ameaça a
seriedade do Espiritismo. Para que a Doutrina permaneça fiel à sua missão, é
indispensável retomar os critérios da Codificação: estudo metódico,
discernimento crítico e fidelidade ao Evangelho de Jesus.
A
Doutrina Espírita não se destina a satisfazer curiosidades nem a gerar
sensacionalismo, mas a formar homens e mulheres novos, capazes de viver em
fraternidade e contribuir para a regeneração da humanidade.
Referências
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Espíritos. 1857.
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Médiuns. 1861.
- KARDEC, Allan. O
Evangelho segundo o Espiritismo. 1864.
- KARDEC, Allan. Revista
Espírita (1858-1869).
- XAVIER, Francisco
Cândido. Os Mensageiros. Pelo espírito André Luiz. Federação
Espírita Brasileira, 1944.
- XAVIER, Francisco
Cândido. A Caminho da Luz. Pelo espírito Emmanuel. Federação
Espírita Brasileira, 1939.
- PASSINI, José.
“Best Sellers Mediúnicos”. Artigo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário