Introdução
Na
Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec, encontramos uma visão integral
do ser humano, que vai além da simples concepção materialista da vida. O espírito
(LE, q. 23), ao percorrer sua trajetória de progresso intelectual e moral,
utiliza diferentes instrumentos para se manifestar e para realizar o
aprendizado que lhe cabe no universo. Dentre esses instrumentos, destacam-se o perispírito,
corpo semimaterial que serve de elo entre o Espírito e a matéria, e o corpo
físico, temporário e adaptado às necessidades biológicas do planeta Terra.
Compreender
a importância e a função desses corpos de manifestação é reconhecer também a responsabilidade
que o Espírito em evolução assume para com eles, seja em sua formação,
conservação e uso, seja no respeito às Leis Naturais que regem a vida.
O Espírito e o Princípio Inteligente em Evolução
Allan
Kardec, em O Livro dos Espíritos, ensina que o espírito (LE, q. 23) é
criado simples e ignorante, e progride gradualmente pelas experiências
adquiridas. Nos estágios iniciais, o que denominamos princípio inteligente
manifesta-se nos reinos inferiores da criação, preparando-se para a
autoconsciência.
Quando
atinge a fase humana, o Espírito passa a ter plena responsabilidade moral por
seus atos. Nesse ponto, a encarnação e o uso do corpo físico não são mais
apenas fenômenos naturais, mas provas ou expiações, isto é, experiências
pedagógicas que visam ao progresso.
O Perispírito: Corpo Espiritual de Manifestação
O
perispírito é definido, em O Livro dos Médiuns e em diversas passagens
da Revista Espírita, como o envoltório semimaterial do Espírito, formado
a partir do fluido cósmico universal. Ele cumpre funções fundamentais:
- No mundo espiritual: serve como forma
de manifestação, permitindo que o Espírito se comunique, interaja e atue
nas esferas extrafísicas.
- Na encarnação: atua como princípio
organizador do corpo físico, estabelecendo a ligação vital entre
Espírito (LE, q. 76) e matéria. O corpo carnal se forma obedecendo às leis
da hereditariedade e da biologia, mas é o Espírito, por meio do
perispírito, que imprime sobre ele suas necessidades evolutivas e morais
(cf. A Gênese, cap. XI, item 18).
Sobre
a questão da memória, é importante observar: a lembrança e a consciência
pertencem ao espírito (LE, q. 23),
ser inteligente e pensante. O perispírito, por sua vez, é apenas
veículo de transmissão das impressões. Se fosse nele a sede da memória, esta se
perderia a cada mudança de envoltório fluídico quando o Espírito migra de um
mundo a outro, o que contraria a observação (cf. A Gênese, cap. XIV,
item 9).
Portanto,
o perispírito não guarda por si mesmo os registros das experiências vividas,
mas reflete e transmite ao Espírito as marcas dessas experiências, funcionando
como instrumento de manifestação sensorial e fluídica.
Assim,
cuidar do perispírito significa cultivar pensamentos elevados, sentimentos
nobres e práticas edificantes, pois estas harmonizam sua estrutura e asseguram
melhores condições para a encarnação presente e futura.
O Corpo Físico: Instrumento Biológico e Educativo
O
corpo físico é o veículo que possibilita ao Espírito (LE, q.76) agir
diretamente no mundo material. Sua função vai além da sobrevivência biológica:
- Biologicamente, assegura a
adaptação do Espírito ao meio terrestre, permitindo a interação com os
elementos da natureza.
- Moralmente, funciona como
escola, oferecendo situações de prova, expiação ou missão.
A Revista
Espírita (fevereiro de 1867) destaca que o corpo físico não deve ser visto
como prisão, mas como instrumento educativo. Por isso, é dever do
Espírito cuidar dele, sem, contudo, cair nos extremos do materialismo ou do
desprezo.
O
abuso do corpo pela sensualidade, vícios ou negligência causa não apenas
doenças físicas, mas também impressões negativas no perispírito, que podem
repercutir em futuras encarnações.
Responsabilidade e Cuidado
O
Espírito em evolução, consciente de sua imortalidade e dos instrumentos que lhe
são concedidos, assume deveres claros:
- Respeitar o corpo
físico,
preservando-o pelo equilíbrio nos hábitos e pela higiene moral.
- Zelar pelo
perispírito,
mantendo pensamentos elevados, sentimentos de fraternidade e a busca
constante do bem.
- Reconhecer a função
educativa da encarnação, compreendendo que dores e dificuldades são
oportunidades de progresso e libertação.
Emmanuel,
em O Consolador, explica que “o corpo é a ferramenta do Espírito”, e que
somente pelo uso correto dessa ferramenta o ser pode plasmar os valores de sua
evolução eterna.
Conclusão
Na
Doutrina Espírita, o Espírito não é apenas um viajante no tempo; é um aprendiz
diante das leis divinas. Os corpos de manifestação — perispírito e corpo físico
— são recursos preciosos colocados à sua disposição para que avance no caminho
do aperfeiçoamento.
Cuidar
desses corpos é, portanto, um ato de responsabilidade espiritual. Significa
compreender que o uso que deles fazemos repercute não apenas na existência
atual, mas em todo o curso da evolução imortal.
Referências
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Espíritos. 1857.
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Médiuns. 1861.
- KARDEC, Allan. A
Gênese. 1868.
- KARDEC, Allan. Revista
Espírita. 1858-1869.
- KARDEC, Allan. Obras
Póstumas. 1890.
- XAVIER, Francisco
Cândido (pelo Espírito Emmanuel). O Consolador. FEB.
- XAVIER, Francisco
Cândido (pelo Espírito André Luiz). Evolução em Dois Mundos. FEB.
- MOLLO, Elio. O
Perispírito: definição, origem, natureza, propriedades, funções e questões
doutrinárias à luz da Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec.
Blog A Era do Espírito, 2014.
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