sábado, 4 de outubro de 2025

CARÁTER E APARÊNCIA: REFLEXÕES ESPÍRITAS
SOBRE O SER E O PARECER
- A Era do Espírito -

Introdução

Vivemos em uma sociedade marcada pela valorização da imagem, onde a aparência muitas vezes se sobrepõe ao conteúdo. O consumo, a visibilidade e o prestígio social parecem ditar o que é considerado valioso, em detrimento de princípios éticos e morais. No entanto, como adverte John Wooden, “o caráter é o que você é, e a reputação é o que os outros pensam de você”. Essa distinção simples, mas profunda, convida-nos a refletir sobre a primazia do ser sobre o parecer.

A Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec no século XIX, oferece uma perspectiva esclarecedora sobre essa questão. Nos ensina que a evolução verdadeira do ser humano não se encontra na forma exterior, mas na transformação íntima, no progresso moral que molda o Espírito imortal.

Aparência e beleza: direitos e ilusões

A busca pelo belo acompanha a história da humanidade. A filosofia kantiana (*) já indicava a importância do belo e do sublime para a experiência humana, enquanto a sociedade contemporânea amplia essa busca por meio da estética corporal, das artes, da arquitetura e do consumo cultural. O direito a viver em espaços belos e saudáveis é legítimo.

Todavia, a Doutrina Espírita nos alerta que a forma é transitória. O corpo físico é apenas um instrumento temporário, sujeito à decadência natural. O Espírito, ao contrário, conserva os frutos de sua experiência moral e intelectual. Kardec, em O Livro dos Espíritos (questões 91 a 101), destaca que a beleza espiritual dos Espíritos elevados reflete a pureza de seus sentimentos, e não a conformação material de seus corpos de prova.

(*) A filosofia de Immanuel Kant estabelece o belo e o sublime como categorias centrais para a experiência estética, focando na capacidade humana de sentir prazer desinteressado (belo) ou de ser confrontado com o infinito e superá-lo com a razão (sublime). A sociedade contemporânea amplifica essa busca ao aplicar esses conceitos a diversas esferas: a busca por um corpo idealizado na estética corporal, a expressão artística em diversas mídias, a experiência da grandiosidade ou imponência na arquitetura e o deleite através do consumo de bens culturais, que se tornam objetos de juízo estético e de identificação social. (https://www.google.com/search?)

O ideal de beleza e os preconceitos sociais

O imaginário popular ainda associa figuras angelicais a padrões helênicos ou arianos, reproduzindo estereótipos culturais e raciais. Contudo, o Espiritismo afirma que não existe “raça pura” no sentido espiritual. O corpo físico é resultado da lei biológica e da herança cultural, mas o Espírito é universal, acima de nacionalidades e etnias.

A miscigenação, longe de ser um problema, representa uma riqueza para a humanidade, ao unir características diversas e estimular o aprendizado coletivo. A Revista Espírita (dezembro de 1861) já mencionava a importância da fraternidade universal, que só se concretiza quando se reconhece a igualdade essencial entre todos os seres.

O caráter como fundamento da evolução

Para os romanos, como mostra o conhecido provérbio sobre a esposa de César, não bastava ser honesto, era preciso parecer honesto. Essa valorização da forma em detrimento do conteúdo persiste até hoje. Porém, do ponto de vista espírita, somente o caráter sólido — construído pelo esforço moral — sustenta a evolução verdadeira.

Em O Evangelho segundo o Espiritismo (cap. XVII, item 3), os Espíritos ensinam que o “verdadeiro homem de bem” se reconhece não pelas aparências, mas pelo exercício constante da justiça, do amor e da caridade. Assim, a transformação da sociedade exige não apenas reformas externas, mas a mudança íntima de cada indivíduo.

Conclusão

O desafio contemporâneo é cultivar o caráter em um mundo que privilegia a aparência. O Espiritismo nos convida a resistir à superficialidade, lembrando que a verdadeira beleza é a da alma em progresso. Reputação e imagem podem ser circunstanciais, mas o caráter — fruto das escolhas morais e do esforço constante de melhoria — acompanha o Espírito em sua jornada eterna.

Seguir esse caminho é, de fato, um ato de resistência contra a lógica de consumo e de exclusão que ainda marca o mundo. É também a realização da proposta espírita de transformação do ser humano, preparando a Terra para uma sociedade mais justa, solidária e fraterna.

Referências

  • KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 1857.
  • KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. 1864.
  • KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858-1869).
  • LARA, Eugenio. A aparência e o caráter.
  • KANT, Immanuel. Crítica da Faculdade do Juízo.
  • WOODEN, John. Thoughts for Daily Living.

  

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