sexta-feira, 17 de outubro de 2025

 

FÉ, CORAGEM E RESISTÊNCIA
O ESPIRITISMO DIANTE DA IDEOLOGIA MATERIALISTA
- A Era do Espírito -

Introdução

Se sabeis essas coisas, bem-aventurados sois se as fizerdes” (João 13:17).

O ensinamento de Jesus sintetiza a ética ativa que o Espiritismo convida a viver: conhecer o bem é um passo; praticá-lo, é o dever que autentica a fé. Ao longo da história, essa coerência entre saber e fazer foi testada em tempos de perseguição e censura, quando a fé precisou florescer sob regimes que negavam o espírito.

A narrativa do tcheco Vladimir Sládeček (Vlado), que manteve viva a chama espírita mesmo sob o jugo do comunismo na antiga Tchecoslováquia, é um exemplo contemporâneo dessa fé operante. Enquanto o materialismo tentava silenciar a espiritualidade, ele e outros companheiros traduziam, escondiam e divulgavam obras espíritas, sustentando a esperança de um mundo além da opressão ideológica.

Este artigo propõe uma reflexão espírita sobre a resistência moral e intelectual diante da ideologia materialista, à luz da Doutrina codificada por Allan Kardec, das lições da Revista Espírita (1858–1869) e das obras complementares que analisam o papel do Espiritismo na formação de uma consciência livre e espiritualizada.

1. O Materialismo e o Esvaziamento da Alma

Allan Kardec, em O Livro dos Espíritos (questão 147 e seguintes), demonstra que negar o espírito é mutilar a própria compreensão da vida. Para o materialismo, a existência se encerra no túmulo; para o Espiritismo, ela apenas se transforma. Essa diferença de visão estabelece a fronteira moral entre o desespero e a esperança, entre o egoísmo e a fraternidade.

No século XX, regimes materialistas tentaram suprimir a liberdade religiosa e extinguir a fé no invisível. O comunismo europeu, como relatado por Josef Jackulak, reprimiu brutalmente o Espiritismo, confiscando centros, aprisionando médiuns e destruindo obras doutrinárias. Todavia, o que sobreviveu foi justamente o que o materialismo não podia tocar: a fé interior.

Em A Gênese (cap. I, item 55), Kardec afirma que “as ideias dominantes de uma época não se extinguem por decretos”. Assim como não se apaga o sol com fumaça, o espírito não se cala sob imposições humanas. O materialismo pode dominar o espaço público, mas não o íntimo santuário da consciência.

Hoje, porém, a ameaça não vem apenas de regimes políticos, mas da indiferença espiritual moderna — um materialismo disfarçado de progresso, que valoriza a técnica, mas despreza o sentido da vida. A Doutrina Espírita, por sua vez, propõe equilíbrio entre ciência e moral, afirmando que o conhecimento só é libertador quando se alicerça no amor e na fé racional.

2. O Espiritismo como Resistência Moral e Intelectual

Desde O Livro dos Médiuns, Kardec esclarece que o estudo dos fenômenos espirituais exige serenidade, recolhimento e pureza de intenção. Essa exigência moral faz do Espiritismo não apenas uma ciência de observação, mas também uma escola de caráter.

Quando o materialismo tenta dominar a cultura — infiltrando-se nas universidades, nas mídias, nas escolas —, o Espiritismo responde com luz e discernimento, reafirmando o valor da alma. É uma forma de resistência sem armas, mas com ideias; sem imposição, mas com consciência.

O exemplo de Vlado é emblemático: traduziu ilegalmente mais de cem obras espíritas para o alemão e o esperanto, incluindo mensagens de Emmanuel e André Luiz. Fez da clandestinidade um altar, e da coragem, uma prece viva. Ele compreendeu, como Emmanuel ensina em Caminho, Verdade e Vida (cap. 87), que “a fé sem obras é morta, mas a obra sem fé é estéril”.

Em sua trajetória, vemos o retrato do verdadeiro discípulo de Jesus — aquele que não se acomoda. Como recorda Emmanuel, muitos falam do Cristo, mas “como sonâmbulos inconscientes”, esquecendo-se de viver Sua exemplificação. O Espiritismo, portanto, não é doutrina para sonhadores adormecidos, mas para trabalhadores despertos.

3. O Brasil e o Desafio Contemporâneo

O Brasil, país onde o Espiritismo floresceu com liberdade e vigor, enfrenta hoje um desafio menos visível, porém mais profundo: o avanço da ideologia materialista moderna, travestida de ceticismo, consumo e indiferença ética. Trata-se de um materialismo que não persegue templos, mas seduz consciências — minando valores morais, relativizando princípios e banalizando o sagrado.

A luta espírita, portanto, é pela preservação da alma diante do império da matéria. Emmanuel alerta, em Pensamento e Vida, que “a mente é o espelho da vida em toda parte”. Se a mente se obscurece pela descrença, toda a sociedade adoece.

Nesse sentido, o movimento espírita brasileiro tem papel essencial no equilíbrio moral da nação. Kardec já previa que o Espiritismo encontraria terreno fértil nas terras do Sul (ver Revista Espírita, jan. 1861), onde “os corações simples acolheriam a fé raciocinada”. O desafio é não permitir que a liberdade de crença se torne apatia espiritual, nem que a difusão doutrinária se confunda com proselitismo político ou ideológico.

A verdadeira resistência espírita é moral, e seu instrumento é o exemplo: nas famílias, nas escolas, nas redes sociais, o espírita é chamado a viver o Evangelho como “ciência da alma”, e não apenas como crença teórica.

4. Fé, Coragem e Amor: A Tríplice Força do Resgate Espiritual

O Espírito Manoel Philomeno de Miranda, em suas obras sobre os bastidores espirituais, destaca que todo trabalho de desobsessão ou resgate requer “clima de total doação, empatia e amor fraterno”. O mesmo princípio se aplica ao enfrentamento das sombras ideológicas que buscam dominar consciências.

O amor é a força mais revolucionária que existe. Como lembrou Léon Denis em O Socialismo e o Espiritismo (1924), “não será através do crime e pelo sangue que se poderá fundar um regime de fraternidade e de amor”. A regeneração da Terra não virá pela violência ou imposição, mas pela iluminação moral dos indivíduos.

A fé, portanto, não é fuga — é resistência pacífica. A coragem não é beligerância — é fidelidade ao bem. E o amor, em sua essência divina, é a resposta permanente à escuridão da ignorância.

Vlado compreendeu isso. Trabalhou, sofreu, esperou. Sabia que o fruto maduro só nasce depois da estação do cuidado. Sua história é símbolo do chamado de Jesus: “Se sabeis essas coisas, bem-aventurados sois se as fizerdes.”

Conclusão: A Liberdade do Espírito é Invencível

O Espiritismo não teme regimes, porque fala à eternidade. Suas raízes estão na lei natural e em Deus, e não nas estruturas humanas. Pode ser calado por um tempo, mas jamais extinto.

Quando o materialismo se apresenta como solução, o Espiritismo responde com razão e fé; quando o medo tenta paralisar, ele recorda que a consciência é livre; quando o poder oprime, ele reacende o evangelho de amor.

A grande tarefa espírita contemporânea é despertar consciências, preservar a liberdade moral e reafirmar a imortalidade da alma. Como ensinou Jesus, não basta saber: é preciso fazer.

E, como mostrou Vlado, é possível fazer — mesmo sob as sombras mais densas — quando se tem a luz da fé e o amparo do Cristo.

Referências

  • KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 88ª ed. FEB.
  • KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Cap. VII. FEB.
  • KARDEC, Allan. A Gênese. Cap. I e XVII. FEB.
  • KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858–1869).
  • XAVIER, Francisco Cândido. Caminho, Verdade e Vida, caps. 87–88. Espírito Emmanuel. FEB.
  • MIRANDA, Manoel Philomeno de. Tramas do Destino. FEB.
  • DENIS, Léon. O Socialismo e o Espiritismo (1924).
  • FORMIGA, Luiz Carlos. O materialismo e a tarefa de Vlado.
  • JACKULAK, Josef. Entrevista sobre o Espiritismo na Europa Central. Sociedade Allan Kardec de Viena.
  • Site: Visão Espírita BR.
  • Blog Jorge Hessen: O diálogo mais difícil; A elevada missão da ciência espírita.
  • FRANCO, Divaldo Pereira. Convites da Vida. Espírito Joanna de Ângelis. Ed. LEAL.

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