“Bem-aventurados os misericordiosos, porque
alcançarão misericórdia.” (Mateus 5:7)¹
A lição contida nas bem-aventuranças é um convite
permanente ao aprimoramento moral e espiritual do ser humano. No versículo
citado, Jesus nos conduz ao entendimento de que a misericórdia é não apenas um
sentimento nobre, mas um caminho seguro para a verdadeira felicidade.
Entre as manifestações da misericórdia, a compaixão
ocupa papel central. Na visão da Doutrina Espírita, codificada por Allan
Kardec² e enriquecida pelos ensinamentos de Espíritos elevados, a compaixão não
é mera emoção transitória, mas virtude ativa que impulsiona a prática da
caridade, alicerçada no amor ao próximo.
O Olhar
Interior: Vendo a Trave no Próprio Olho
No Evangelho Segundo o Espiritismo³, Kardec
relembra o ensinamento de Jesus sobre o argueiro e a trave (Mateus 7:3-5)¹. A
tendência humana de apontar falhas alheias antes de reconhecer as próprias é
expressão clara do orgulho, que impede a vivência plena da caridade.
A verdadeira compaixão requer humildade. Quem se
detém em criticar o próximo, fechando-se ao autoexame, cria barreiras à
indulgência e ao socorro. Jesus, ao combater o orgulho, nos alerta que este é obstáculo
ao progresso moral e espiritual, pois neutraliza a simplicidade e a abnegação
que sustentam a misericórdia.
Assim, antes de nos colocarmos na posição de
juízes, é essencial retirar a “trave” de nossos olhos, purificando o olhar com
que enxergamos o outro.
Chamados
para Abençoar, Não para Julgar
No ensinamento do Espírito Emmanuel, psicografado
por Francisco Cândido Xavier⁴, encontramos um retrato claro da missão que cada
discípulo do Cristo recebe: não fomos chamados para criticar, condenar ou expor
as chagas morais de nossos irmãos, mas para abençoar, justificar e socorrer.
A compaixão verdadeira age onde há dor, constrói
onde há ruína moral e aquece onde o frio do desânimo ameaça apagar a chama da
esperança. Para isso, é preciso abandonar “as exigências do inquisidor” que
ainda persistem em nossa intimidade, substituindo-as pelo compromisso de ser
sustentáculo da Bondade Divina no mundo.
Piedade e
Compaixão: Fontes da Ação Caridosa
Segundo Angel Aguarod⁵, a piedade e a compaixão são
virtudes que impulsionam a beneficência e a filantropia. Elas nascem do amor a
Deus e, por consequência, do amor ao próximo.
A piedade, em sua expressão mais elevada, é virtude
que aproxima a criatura de Deus, levando-a a sentir as dores do outro como
próprias e a se esforçar por aliviar-lhe o fardo. Nesse sentido, a compaixão
não se limita a um sentimento passivo; ela conduz à ação, motivada pela
abnegação e pelo sacrifício, tornando-se caminho seguro para a elevação
espiritual.
A humanidade, porém, ainda se mostra carente desse
sentimento. Muitas vezes, é diante de grandes catástrofes e infortúnios que o
coração humano desperta para a compaixão. Enquanto esta não for cultivada
espontaneamente em cada indivíduo, a paz e a felicidade coletivas permanecerão
distantes.
O Cultivo
da Compaixão no Cotidiano
Desenvolver a compaixão é tarefa que exige esforço
consciente. Algumas práticas essenciais nesse cultivo são:
- Autoanálise constante – Reconhecer as próprias
imperfeições antes de julgar o próximo, evitando a postura condenatória.
- Empatia ativa – Procurar compreender as circunstâncias que
levam o outro ao erro ou à dor.
- Ação concreta – Transformar o sentimento em atos que
aliviem a necessidade alheia, seja material ou moral.
- Educação do sentimento – Ler, ouvir e meditar
sobre ensinamentos que despertem a sensibilidade, fortalecendo a
disposição de ajudar.
Cristo:
Modelo Supremo de Compaixão
Jesus é o exemplo maior de compaixão. Veio não para
os sãos, mas para curar os enfermos; não para os justos, mas para amparar os
pecadores (Lucas 5:31-32)¹. Sua vida foi um testemunho de entrega e sacrifício,
iluminando com ternura os caminhos sombrios da humanidade.
Seguir Seus passos significa tornar-se, cada qual à
sua medida, um “mestre de compaixão”, oferecendo alívio, esperança e
compreensão onde reinam a dor, o erro e a solidão.
Conclusão
Ser misericordioso é muito mais que sentir piedade:
é agir movido por amor, colocando-se ao lado do que sofre, sem julgamentos, e
oferecendo o melhor de si para o seu alívio.
À luz da Doutrina Espírita, a compaixão é virtude
que aproxima o homem dos Espíritos superiores e o eleva na escala espiritual.
No cultivo diário desse sentimento, purificamos nosso coração, vencemos o
orgulho e nos tornamos instrumentos da paz e da bondade que Jesus espera encontrar em cada um de nós.
*“Sigam,
pois, as pegadas do Redentor do Mundo, esforçando-se por se converterem em
Mestres de Compaixão, personificando-a pela palavra e pelo fato.”*⁵
Referências
- BÍBLIA SAGRADA. Mateus 5:7; 7:3-5; Lucas 5:31-32. Tradução de João Ferreira de Almeida. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2009.
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 84. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2022.
- KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 96. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2022.
- XAVIER, Francisco Cândido. Pão Nosso. Pelo Espírito Emmanuel. Rio de Janeiro: FEB, 2016.
- AGUAROD, Angel. Grandes e Pequenos Problemas. 2. ed. São Paulo: IDE, 1990.
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