Introdução
A arte sempre foi expressão da alma humana em sua
busca pelo belo, pelo verdadeiro e pelo eterno. Em “Obras Póstumas”,
Allan Kardec, o codificador do Espiritismo, dedicou um capítulo à “Influência
perniciosa das ideias materialistas sobre as artes em geral; a regeneração
delas por meio do Espiritismo”, onde anteviu que a renovação da
sensibilidade artística dependeria da superação do materialismo e da abertura
da consciência para a realidade espiritual.
Mais de um século após essas reflexões,
testemunhamos como certas manifestações artísticas, seja no cinema, no teatro
ou na literatura, caminham na direção daquilo que Kardec vislumbrou: a arte
inspirada pelas ideias espirituais, capaz de emocionar, consolar e educar.
A visão
de Kardec sobre a arte regenerada
Para Kardec, a arte materialista se limitava a
retratar o corpo e a vida terrena, em suas paixões e dramas passageiros. Já a
arte iluminada pelo Espiritismo abriria “um campo inteiramente novo, imenso
e ainda inexplorado”, capaz de traduzir em cores, sons e imagens a vida do
Espírito, sua imortalidade, seus reencontros e provas.
O mestre lionês escreveu que, em vez de personagens
reduzidos à morte física, o artista do futuro mostraria a continuidade da vida,
a presença de entes queridos em formas etéreas, o remorso dos Espíritos
culpados e a beleza radiosa das almas regeneradas. Trata-se de uma nova
estética, na qual o invisível se torna matéria-prima da criação.
O cinema
e a difusão da espiritualidade
No século XX, algumas obras cinematográficas
alcançaram projeção mundial justamente por abordarem temas espirituais. O filme
“Ghost – Do Outro Lado da Vida” (1990), ainda que sem intenção
doutrinária, apresentou a milhões de espectadores uma representação próxima de
certas verdades espíritas: a continuidade da vida, a influência dos Espíritos
sobre os encarnados, a comunicação mediúnica e a lei moral de causa e efeito.
Outro exemplo é o épico “Gandhi” (1982),
que, embora biográfico, ressaltou a dimensão espiritual da vida de um líder que
pregava a não violência e a fraternidade universal. Ainda no Brasil,
destacam-se produções como a novela “A Viagem” (1994), baseada em ideias
espíritas, e filmes como “Nosso Lar” (2010), inspirado na obra mediúnica
de André Luiz por Francisco Cândido Xavier, que levou milhões de pessoas aos
cinemas.
Essas manifestações artísticas cumprem, em parte, o
que Kardec previa: ao mesmo tempo em que entretêm, abrem horizontes de reflexão
espiritual e alcançam públicos que dificilmente seriam tocados apenas pelo
estudo filosófico ou moral.
Arte
espírita e desafios atuais
Se a arte materialista tende a explorar o
sensacionalismo e a exaltação de paixões inferiores, a arte espírita – ou
inspirada pela espiritualidade – deve se orientar pela elevação moral, pela
beleza educativa e pela fidelidade às leis divinas. A questão não é
restringir a liberdade criativa, mas ampliar seus horizontes, permitindo que a
arte cumpra também uma função regeneradora.
Na Revista Espírita de fevereiro de 1868,
Kardec afirma que o Espiritismo deve contribuir para a regeneração da
humanidade em todos os campos da cultura. Isso inclui a literatura, a música, o
teatro, a pintura e, em nossa época, o cinema e as artes digitais.
Em um mundo marcado pela tecnologia e pela
velocidade da informação, cresce a necessidade de conteúdos que, além de
entreter, elevem e inspirem. Nesse sentido, a estética espírita encontra
terreno fértil: há um público aberto a narrativas sobre reencarnação,
comunicação com os mortos, provas e expiações, e sobretudo sobre a vitória do
amor sobre a morte.
Conclusão
Allan Kardec, em sua análise sobre a arte, não
apenas diagnosticou o empobrecimento causado pelo materialismo, mas anteviu uma
verdadeira revolução estética e espiritual. Mais de 150 anos depois, a
realidade confirma sua visão: a arte que aborda o espiritual encontra
receptividade e emoção profunda nos corações, porque responde à sede de
transcendência que a humanidade traz em si.
Cabe aos artistas e pensadores de hoje aprofundar
esse caminho, não como imposição doutrinária, mas como uma contribuição à elevação
da cultura e ao despertar das consciências. Assim, a arte será, como desejava
Kardec, um veículo da beleza eterna e da verdade espiritual, ajudando a
humanidade a compreender que “a vida não termina com a morte” e que o
futuro do homem é o progresso moral e intelectual rumo a Deus.
Referências
- KARDEC, Allan. Obras Póstumas. 1890.
- KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858–1869).
- KARDEC, Allan. A Gênese. 1868.
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 1857.
- XAVIER, Francisco Cândido (pelo Espírito André Luiz). Nosso Lar.
1944.
- ZUCKER, Jerry. Ghost – Do Outro Lado da Vida. Paramount
Pictures, 1990.
- ATTENBOROUGH, Richard. Gandhi. Columbia Pictures, 1982.
- REDE GLOBO. A Viagem. Novela, 1994.
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