Introdução
Entre
os temas fundamentais da Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec, o pensamento
ocupa lugar central. Não se trata apenas de uma faculdade abstrata, mas de uma força
viva do Espírito, capaz de atuar nos fluidos, estabelecer comunicações e
gerar consequências no campo moral e espiritual. Kardec estudou o tema em
diferentes momentos de sua obra, oferecendo uma visão abrangente que integra
aspectos ontológicos, éticos e práticos.
Este
artigo propõe um estudo didático sobre o pensamento a partir das obras da
Codificação Espírita e da Revista Espírita, buscando destacar sua
natureza, efeitos, responsabilidades e também suas patologias, como a obsessão,
a subjugação e a possessão.
1) O que é o pensamento no Espiritismo
Para
Kardec, o pensamento é atributo essencial do Espírito. Ele não se
restringe à atividade intelectual, mas constitui uma força atuante que
se projeta no meio espiritual e repercute nos fluidos. Assim, pensar é agir
espiritualmente. (A Gênese, cap. XIV).
2) O pensamento e os fluidos: veículo de propagação
Segundo
Kardec, “os fluidos são o veículo do pensamento”, tal como o ar
transmite o som. Essa ação explica a propagação mental, comparável a “ondas e
raios do pensamento” que se cruzam sem se confundir. (A Gênese, XIV).
3) A transmissão do pensamento e a prece
Em O
Evangelho segundo o Espiritismo (cap. XXVII), Kardec explica que a oração e
o pensamento dirigido a alguém estabelecem correntes fluídicas, cujo
alcance depende da intensidade da vontade. A prece sincera cria laços
espirituais, atrai os bons Espíritos e pode alcançar encarnados e desencarnados
à distância.
4) A influência dos Espíritos sobre os pensamentos
humanos
Em O
Livro dos Espíritos (q. 459–472), Kardec indaga sobre a influência oculta
dos Espíritos. A resposta dos Instrutores Espirituais é clara: os Espíritos
influenciam muito mais do que se supõe; frequentemente são eles que nos
dirigem os pensamentos. O homem, entretanto, é responsável pela aceitação ou
rejeição dessas sugestões, devendo discernir pelo conteúdo moral.
5) Pensamento, vontade e ação espiritual
Em
diversas passagens da Revista Espírita e em A Gênese, Kardec
explica que o Espírito age sobre os fluidos pelo pensamento e pela vontade,
assim como o homem age com a mão sobre a matéria. Daí decorre a ideia de que o
pensamento modela formas fluídicas, podendo construir ambientes, irradiar
saúde ou enfermidade, paz ou perturbação.
6) Pensamento e mediunidade
No Livro
dos Médiuns, o fenômeno mediúnico é definido como transmissão de
pensamento do Espírito comunicante para o médium, mediada pelos fluidos. A
psicografia é descrita por Kardec como a passagem do pensamento do Espírito
pela mão do médium, o que evidencia a centralidade do pensamento em todo
processo mediúnico.
7) A qualidade moral do pensamento
O
pensamento possui qualidade moral, que determina a natureza de suas
irradiações e das companhias espirituais que atrai. Kardec ressalta que a prece
verdadeira é aquela que nasce do coração; palavras sem intenção não produzem
efeito real. Dessa forma, a higiene mental consiste na vigilância constante, na
prece sincera, no estudo e na prática do bem.
8) Patologias do pensamento: obsessão, subjugação e
possessão
Kardec
dedicou atenção especial às consequências negativas do uso desequilibrado do
pensamento.
- Obsessão: influência
persistente de um Espírito inferior sobre um encarnado, afetando seus pensamentos
e sentimentos.
- Fascinação: forma mais grave,
em que o Espírito obsessor domina as percepções do obsidiado, iludindo-o.
- Subjugação: verdadeiro
constrangimento, em que o obsidiado se sente dominado, chegando a atos
involuntários.
- Possessão: Kardec aborda o
tema na Revista Espírita (dezembro/1863 e janeiro/1864, caso da
Sra. Júlia) e em A Gênese. A possessão não deve ser entendida como
invasão material do corpo, mas como uma forma extrema de subjugação moral
e fluídica, em que o Espírito obsessor chega a se identificar e agir
intensamente por meio do encarnado.
Em
todos os casos, o antídoto está na educação do pensamento e na sintonia
com os bons Espíritos, alcançada pela transformação moral progressiva, prece
sincera, estudo e trabalho no bem.
9) Síntese doutrinária
- Ontologia: o pensamento é
força do Espírito que age sobre os fluidos.
- Dinâmica: transmite-se por
correntes proporcionais à vontade.
- Ética: sua qualidade
moral define os efeitos e companhias espirituais.
- Patologia: o pensamento
enfraquecido ou viciado pode abrir campo à obsessão, subjugação ou
possessão.
- Práxis: a vigilância
mental, a prece, o estudo e a prática do bem educam o pensamento e
fortalecem a alma.
Conclusão
O
estudo do pensamento em Kardec revela a profundidade da Doutrina Espírita: cada
ideia, cada sentimento é força viva, capaz de construir ou destruir, elevar ou
degradar. Daí a importância da responsabilidade no pensar, pois o
pensamento não é neutro: repercute em nós mesmos, nos outros e no ambiente
espiritual que nos envolve.
Educar
o pensamento é, portanto, educar a própria alma. E na medida em que elevamos
nossa vida mental pelo bem, pela prece e pela vigilância, estabelecemos
comunhão com Espíritos superiores e contribuímos para a regeneração moral da
Humanidade.
Referências
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Espíritos. 1857. Questões 459–472; 658–666.
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Médiuns. 1861. Segunda Parte, caps. XII–XIV, XX, XXIII.
- KARDEC, Allan. O
Evangelho segundo o Espiritismo. 1864. Cap. XXVII.
- KARDEC, Allan. A
Gênese. 1868. Cap. XIV – Os fluidos.
- KARDEC, Allan. Revista
Espírita. Diversos números, especialmente jun/1859, dez/1863,
jan/1864, jun/1868 (“Fotografia do pensamento”, “O caso da Sra. Júlia”).
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