domingo, 17 de agosto de 2025

O PERISPÍRITO
- A Era do Espírito -

Definição, origem, natureza, propriedades, funções e questões doutrinárias à luz da Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec

Introdução

O estudo do perispírito ocupa lugar central na Doutrina Espírita, pois ele é o ponto de ligação entre o Espírito imortal e o corpo físico transitório. Nas obras fundamentais de Allan Kardec — O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, A Gênese e a Revista Espírita — encontramos bases seguras para compreender a sua natureza, propriedades e funções, sempre sob o critério da razão e da observação dos fatos.

O presente artigo se propõe a responder, à luz da Codificação e com apoio em documentos complementares, algumas questões fundamentais: O que é o perispírito? Qual a sua origem e natureza? Quais são as suas propriedades e funções? É ele a sede da memória e da sensibilidade? Constitui o molde do corpo físico?

1. O que é o perispírito? Definição, origem e natureza

Allan Kardec introduz o conceito comparando-o ao perisperma, que envolve a semente de um fruto (O Livro dos Espíritos, Introdução). Assim, o perispírito é o invólucro semimaterial do espírito (LE, q. 23), formado pela condensação do fluido cósmico universal em torno de um foco de inteligência.

  • Origem: o espírito (princípio inteligente (LE, q. 23) extrai seu perispírito dos elementos próprios de cada mundo (LE, q. 94).
  • Natureza: semimaterial, porque participa da essência da matéria pela sua origem e da espiritualidade pela sua sutileza.
  • Função básica: servir de laço entre o Espírito (LE, q. 76) e o corpo, tornando possível a encarnação e a comunicação com o mundo material.

Kardec observa que, ao mudar de mundo, o espírito (LE, q. 23) muda também de perispírito, assim como mudamos de vestimenta (LE, q. 94a). Essa maleabilidade é um ponto fundamental para compreendermos suas propriedades.

2. Propriedades do perispírito

O estudo das propriedades perispirituais encontra-se em O Livro dos Médiuns e em A Gênese, bem como em diversos relatos da Revista Espírita. Entre elas, destacam-se:

  1. Expansibilidade e irradiação: O perispírito não se limita ao contorno do corpo físico: irradia em torno do organismo, formando uma espécie de atmosfera ou halo fluídico (O Livro dos Médiuns, cap. I, item 4).
  2. Assimilação dos fluidos: Por sua natureza semelhante à do mundo espiritual, o perispírito absorve facilmente os fluidos que o cercam, reagindo sobre o corpo físico e podendo gerar sensações salutares ou enfermidades, segundo a qualidade desses fluidos (A Gênese, cap. XIV, item 18).
  3. Instrumento das manifestações: O Espírito, sendo imaterial, não poderia atuar diretamente sobre a matéria grosseira; é pelo perispírito que se dá essa ação, tornando-se o princípio das manifestações espíritas (Obras Póstumas, “Perispírito, princípio das manifestações”).
  4. Plasticidade: O perispírito é suscetível de modificações sob a vontade do Espírito, podendo tornar-se visível, tangível ou assumir formas diversas, como observado em fenômenos de materialização (Revista Espírita, 1859-1866).

3. Funções do perispírito

As funções do perispírito decorrem de sua natureza e propriedades:

  • Organismo de individualização
    Após a morte, o Espírito (LE, q. 76) conserva sua individualidade graças ao perispírito, que lhe fornece uma forma definida e reconhecível (LE, q. 150a).
  • Órgão sensitivo
    O perispírito é o intermediário da sensação. O corpo recebe impressões externas, o perispírito as transmite, e o espírito, ser inteligente (LE, q. 23), as percebe. O inverso também é verdadeiro: da vontade do Espírito ao movimento do corpo (LE, item 257).
  • Agente das comunicações
    Nos fenômenos mediúnicos, é pelo perispírito que o Espírito (LE, q. 76) atua sobre os fluidos, sobre os médiuns e sobre a matéria. Ele constitui a chave de todos os fenômenos espíritas de ordem material (O Livro dos Médiuns, cap. VI, item 109).
  • Veículo de ação fluídica
    Nos passes e curas espirituais, é o perispírito o intermediário da transmissão das energias, atuando como condutor entre o Espírito do doador e o doente (A Gênese, cap. XIV, item 31).

4. É o perispírito a sede da memória e da sensibilidade?

Essa questão exige rigor doutrinário. Alguns autores espiritualistas atribuíram ao perispírito a função de “arquivo da memória”. Contudo, Allan Kardec esclarece:

  • Memória: pertence ao espírito (LE, q. 23), ser pensante e inteligente. O perispírito, sendo matéria, não pensa nem conserva por si mesmo lembranças (A Gênese, cap. XIV, item 9). Se fosse nele a memória, ela se perderia sempre que o espírito mudasse de envoltório, o que contraria a observação.
  • Sensibilidade: também é atributo do espírito. O perispírito apenas transmite as impressões, mas não as cria nem as sente por si mesmo (LE, item 257, §7).

Portanto, a memória e a sensibilidade são faculdades exclusivas do espírito, que utiliza o perispírito como instrumento de manifestação.

5. O perispírito é o molde do corpo físico?

Aqui encontramos um ponto de debate. Muitos autores pós-Kardec utilizaram a expressão “molde” para descrever a relação entre perispírito e corpo. Todavia, à luz da Codificação, a conclusão é outra:

  • O corpo físico obedece às leis biológicas e genéticas, transmitidas pelos pais (LE, q. 207; João 3:6).
  • O Espírito se liga ao corpo nascente por meio de um laço fluídico, que é expansão do perispírito (A Gênese, cap. XI, item 18).
  • É o Espírito quem molda o seu envoltório, adaptando-o às suas necessidades evolutivas, e não o contrário (A Gênese, cap. XI, item 11).

Assim, o perispírito não é o molde fixo do corpo físico, mas o princípio organizador que assegura a ligação entre Espírito (LE, q. 76) e matéria, ajustando-se à estrutura corporal que se forma a partir da herança genética.

Conclusão

O estudo do perispírito, à luz da Doutrina Espírita, revela-o como elemento essencial da constituição humana e chave de compreensão dos fenômenos espirituais. Ele é:

  • O invólucro semimaterial do espírito (LE, q. 23), extraído do fluido universal;
  • O elo indispensável entre Espírito (LE, q. 76) e corpo;
  • O instrumento das manifestações e das comunicações;
  • O veículo de transmissão das sensações e energias.

Entretanto, a memória e a sensibilidade são do espírito (LE, q. 23), não do perispírito. Da mesma forma, o corpo físico se organiza segundo as leis da hereditariedade, e o perispírito apenas se ajusta a ele, servindo como laço vital.

Compreender o perispírito é compreender melhor a interação entre o mundo espiritual e o mundo corporal, bem como a continuidade da vida após a morte. É um campo vasto, que ainda desafia a ciência humana, mas que a Doutrina Espírita, com seu método de observação e experimentação, já nos legou bases seguras para estudar com seriedade e bom senso.

Referências

  • KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB.
  • KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB.
  • KARDEC, Allan. A Gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB.
  • KARDEC, Allan. Obras Póstumas. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB.
  • KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858-1869). Diversos artigos sobre manifestações perispirituais.
  • O Evangelho segundo João, cap. 3, v. 6.

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