1.
Introdução
Platão (427–347 a.C.), discípulo de Sócrates,
desenvolveu uma filosofia marcada pela busca da Verdade e pela valorização do
mundo espiritual em detrimento do mundo sensível. Suas ideias influenciaram
profundamente a filosofia ocidental e a espiritualidade cristã primitiva.
Séculos mais tarde, Allan Kardec (1804–1869), ao
organizar a Doutrina Espírita, ofereceu uma síntese filosófica, científica e
moral sobre a vida espiritual, a imortalidade da alma e a evolução dos seres,
fundamentada nas comunicações dos Espíritos.
Este estudo busca destacar pontos de convergência e
divergência entre Platão e o Espiritismo, mostrando como certas intuições
filosóficas antigas encontram resposta e ampliação na revelação espírita.
2. A
Imortalidade da Alma
- Platão:
Em obras como Fédon, defendeu a imortalidade da alma, argumentando que ela preexiste ao corpo e sobrevive à morte. A alma, para ele, pertence ao mundo das ideias — puro, eterno e perfeito — e o corpo é apenas prisão ou sombra. - Espiritismo:
Kardec confirma a imortalidade da alma (O Livro dos Espíritos, q. 149-165), mas difere de Platão ao rejeitar a noção de corpo como prisão. O corpo é visto como instrumento necessário para o progresso do Espírito no plano material. - Revista Espírita:
Diversos relatos de Espíritos desencarnados reforçam a sobrevivência da alma, trazendo não apenas argumentos filosóficos, mas testemunhos experimentais, o que dá caráter científico à imortalidade.
3. A
Reencarnação
- Platão:
Aceitava a metempsicose (reencarnação), como se vê no Mito de Er (A República, Livro X). A alma retornaria a novos corpos, segundo escolhas e méritos, como aprendizado e expiação. - Espiritismo:
Kardec confirma a reencarnação, mas sem o aspecto de punição arbitrária. Ela é instrumento de justiça divina, progresso moral e intelectual (O Livro dos Espíritos, q. 166-222). - Revista Espírita:
Abundam exemplos de lembranças de vidas passadas, explicações de Espíritos e casos concretos, que ilustram a lei da reencarnação de forma mais precisa do que Platão poderia supor filosoficamente.
4. A
Relação entre Mundo Sensível e Mundo das Ideias / Mundo Espiritual
- Platão:
Propôs a teoria das ideias: o mundo sensível é imperfeito, transitório, cópia do mundo verdadeiro, eterno e perfeito das formas. - Espiritismo:
Kardec ensina que o mundo espiritual é o mundo normal e primitivo; o mundo corporal é apenas transitório (O Livro dos Espíritos, q. 85-87). A semelhança é clara: ambos estabelecem hierarquia entre espiritual e material, mas o Espiritismo vai além, descrevendo como se dá a interação entre os dois planos (perispírito, mediunidade, fluidos). - Revista Espírita:
Mostra como Espíritos relatam sua vida no além, confirmando a preexistência do mundo espiritual como sede da verdadeira vida.
5. O
Conhecimento e o Autoconhecimento
- Platão:
Defendia que conhecer é recordar (anamnesis), pois a alma já contemplou as ideias eternas antes de encarnar. O autoconhecimento era o caminho para a libertação. - Espiritismo:
Kardec destaca a máxima socrática-platônica "Conhece-te a ti mesmo" (O Livro dos Espíritos, q. 919). O progresso moral depende do exame de consciência e da reforma íntima. A teoria da reminiscência se aproxima da ideia espírita de que a alma traz experiências de existências anteriores, mas difere quanto ao processo (não é simples recordação, mas aquisição gradativa). - Revista Espírita:
Diversos Espíritos orientam para o autoconhecimento como base da elevação moral, confirmando a tradição socrático-platônica sob nova luz.
6. A
Justiça e a Lei Moral
- Platão:
Em A República, descreve a justiça como harmonia da alma e da cidade, alcançada quando cada parte cumpre sua função. O destino das almas no além é proporcional à sua conduta. - Espiritismo:
Ensina a lei de causa e efeito, onde cada ação gera consequências que repercutem na vida presente ou futura (O Livro dos Espíritos, q. 963-1009). A justiça divina é perfeita, baseada na misericórdia e na oportunidade de progresso. - Revista Espírita:
Casos de expiação e provas dos Espíritos desencarnados ilustram a aplicação dessa lei de justiça, mostrando sua exatidão prática.
7.
Diferenças Fundamentais
- Platão: Filosofia especulativa, baseada em
raciocínios e mitos (como o da caverna, do carro alado, de Er).
- Espiritismo: Filosofia experimental, fundamentada em
fatos, observação e método científico, aplicados às manifestações dos
Espíritos. Kardec supera a especulação platônica, confirmando com dados
objetivos aquilo que era apenas intuição no pensamento grego.
8.
Convergências Relevantes
- Imortalidade da alma.
- Preexistência e sobrevivência além do corpo.
- Reencarnação como mecanismo de aprendizado.
- Mundo espiritual como realidade superior.
- Autoconhecimento como caminho de libertação.
9.
Conclusão
O diálogo entre Platão e o Espiritismo revela que
muitas intuições filosóficas do grande pensador grego encontraram confirmação e
desenvolvimento na Doutrina Espírita. O que para Platão era hipótese e mito,
para o Espiritismo se tornou experiência e lei.
Assim, Allan Kardec, apoiado nos Espíritos e no
método científico, ampliou a filosofia espiritualista, trazendo-a do campo da
especulação para o da observação, conciliando razão, fé e ciência.
Platão intuiu; o Espiritismo confirmou e
esclareceu.
Referências
- PLATÃO. Fédon. A República. Mênon.
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. O Livro dos Médiuns.
A Gênese. O Evangelho segundo o Espiritismo.
- KARDEC, Allan (dir.). Revista Espírita – Jornal de Estudos
Psicológicos (1858-1869).
- Obras de filosofia clássica e estudos comparativos sobre a tradição socrático-platônica e o Espiritismo.
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