Introdução
Ao longo
dos séculos, a palavra liberdade foi entoada como grito de dor e de
esperança por povos escravizados, perseguidos políticos, religiosos silenciados
e indivíduos privados de dignidade. No entanto, nem sempre a humanidade
compreendeu o verdadeiro alcance desse princípio. A Doutrina Espírita,
codificada por Allan Kardec, esclarece que a liberdade não é apenas uma
conquista social ou política, mas sobretudo uma Lei Divina, gravada na
consciência e presente em cada etapa da evolução espiritual.
No Livro
dos Espíritos, capítulo “Lei da Liberdade” (questões 825 a 872),
encontramos respostas que nos auxiliam a distinguir entre as várias formas de
liberdade — física, de ação, de pensamento e espiritual. Este artigo tem como
objetivo refletir sobre tais dimensões, confrontando-as com exemplos históricos
e atuais, à luz dos ensinos espíritas e das observações publicadas por Kardec
na Revista Espírita (1858-1869).
1. Liberdade Física: Movimento e Limitações
A
liberdade mais elementar é a de movimento. O ser humano primitivo já usufruía
dessa condição ao deslocar-se em busca de alimento e abrigo. Com o tempo, sua
engenhosidade permitiu ampliar tal liberdade: aprendeu a nadar, a usar meios de
transporte e, mais tarde, a conquistar os céus.
Mas, como
lembra Kardec, é justamente nas restrições que a liberdade física revela seu
valor. Prisões injustas, doenças incapacitantes ou barreiras sociais mostram
que a liberdade de movimento pode ser limitada. Nelson Mandela, após 27 anos de
cárcere, e Stephen Hawking, preso a uma cadeira pela esclerose lateral
amiotrófica, demonstraram que a limitação do corpo não impede a grandeza moral
e intelectual do Espírito. O Espiritismo ensina que tais provas são
instrumentos da Justiça Divina para o progresso individual.
2. Liberdade de Ação: O Desafio Social e Moral
A
liberdade de ação refere-se ao uso do livre-arbítrio nas relações sociais. A
escravidão, explicitamente condenada nas questões 829 a 832 de O Livro dos
Espíritos, constitui aberração contra a Lei de Deus. Embora juridicamente
abolida, persiste em formas modernas de exploração, como o trabalho análogo à
escravidão e a exploração sexual.
Outra
restrição é a dominação de um povo por outro, ainda observada em tensões
geopolíticas contemporâneas. Contudo, a maior limitação da liberdade de ação é
natural: decorre do convívio social. Como afirmam os Espíritos (q. 826), a
liberdade absoluta só seria possível ao eremita isolado. A vida em sociedade
exige respeito mútuo, condição indispensável para a verdadeira fraternidade.
3. Liberdade de Pensar: Um Dom Absoluto
Se a ação
sofre limitações, o pensamento, ao contrário, é absolutamente livre.
Nenhuma prisão ou regime político pode impedir o Espírito de pensar. Essa faculdade,
no entanto, pode ser bênção ou tormento. Quando mal orientado, o pensamento
gera doenças psíquicas e físicas, além de compromissos espirituais negativos.
A Revista
Espírita registra diversos casos de manifestações mediúnicas que evidenciam
o poder criador da mente, capaz de plasmar formas no mundo espiritual. Essa
realidade confirma a afirmação dos Espíritos (q. 833): no pensamento, o homem
encontra liberdade ilimitada, cabendo-lhe direcioná-la para o bem.
4. Liberdade de Expressão da Consciência
A
consciência é a bússola interior que indica ao Espírito o que convém ou não
realizar. Entretanto, sua expressão pode ser restringida por fatores sociais,
culturais, religiosos ou políticos. A história registra perseguições a
filósofos, cientistas e reformadores espirituais, muitos dos quais se tornaram
mártires da liberdade de consciência.
Hoje, com
a Internet, essa liberdade alcançou novos patamares. Se, por um lado, se
multiplicam conteúdos superficiais e até nocivos, por outro, nunca foi tão
ampla a difusão do conhecimento, da ciência e da espiritualidade. Cabe ao
discernimento individual filtrar o que edifica.
5. Livre-Arbítrio e Constrangimento Espiritual
A
liberdade encontra sua expressão plena no livre-arbítrio, faculdade que
permite ao ser humano escolher seus caminhos. Contudo, suas escolhas sempre se
submetem à lei de causa e efeito. A obsessão — influência de Espíritos
inferiores sobre encarnados — é um dos mais sérios constrangimentos
espirituais. Kardec e diversos colaboradores na Revista Espírita
documentaram casos em que a mente e o corpo sofriam sob esse jugo invisível,
confirmando a importância da vigilância e da prece.
6. A Verdadeira Liberdade: Emancipação Espiritual
Jesus
afirmou: “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” (João 8:32).
A verdadeira liberdade não se encontra apenas em direitos civis, na saúde
física ou na livre circulação de ideias. Ela reside na libertação interior,
alcançada quando o Espírito domina suas paixões, cumpre a lei de amor e se
torna discípulo do Cristo.
Emmanuel,
em Palavras de Vida Eterna, lembra que a fé sem obras é estéril. Ser
livre, na essência, é agir em harmonia com as Leis Divinas, servindo com amor e
construindo o bem. Nesse estágio, o Espírito não mais depende de circunstâncias
externas para sentir-se livre, pois encontra sua emancipação no próprio
interior.
Conclusão
A
liberdade, tantas vezes proclamada em batalhas humanas, é, no fundo, expressão
de uma lei universal que conduz o Espírito ao seu destino de perfeição. As
restrições físicas, sociais ou espirituais não anulam, mas educam, preparando o
ser para a liberdade plena.
À luz do
Espiritismo, compreendemos que a verdadeira liberdade só se conquista com a transformação
íntima, a vivência do Evangelho e o uso responsável do livre-arbítrio. Essa
liberdade espiritual é inviolável, porque nasce da união do Espírito com a
Verdade Eterna.
Referências
- KARDEC, Allan. O Livro
dos Espíritos. Questões 825 a 872. FEB.
- KARDEC, Allan. O
Evangelho Segundo o Espiritismo. FEB.
- KARDEC, Allan (dir.). Revista
Espírita (1858-1869).
- XAVIER, Francisco Cândido. Palavras
de Vida Eterna, pelo Espírito Emmanuel. CEC.
- MIRANDA, Manoel Philomeno
de. Painéis da Obsessão, psicografia de Divaldo P. Franco. LEAL.
- UBALDI, Pietro. A Grande
Síntese. Instituto Pietro Ubaldi.
- BÍBLIA SAGRADA. João 8:32.
- COSTA, Renato. A
Liberdade, Artigo
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