domingo, 19 de outubro de 2025

A ESPIRITUALIDADE DOS ANIMAIS
A EVOLUÇÃO DO PRINCÍPIO INTELIGENTE
À LUZ DA DOUTRINA ESPÍRITA
- A Era do Espírito -

Introdução

Em 15 de outubro de 1978, a Unesco proclamou a Declaração Universal dos Direitos do Animal, afirmando que “todos os animais nascem iguais perante a vida e têm os mesmos direitos à existência”. Tal documento representou um marco civilizatório no reconhecimento da dignidade dos seres não humanos. Contudo, muito antes dessa formulação ética moderna, o Espiritismo, codificado por Allan Kardec no século XIX, já elucidava a condição espiritual dos animais, situando-os em um processo contínuo de evolução anímica, em que o princípio inteligente se elabora progressivamente “do átomo ao arcanjo”.

Ao retirar da mediunidade o véu do misticismo, dignificar a mulher e situar o homem como agente consciente da lei divina, a Doutrina Espírita também resgatou o papel dos animais na escala evolutiva da Criação, conferindo-lhes uma importância que ultrapassa a simples função biológica. Kardec e os Espíritos reveladores estabeleceram, com clareza racional e científica, que os animais possuem um princípio espiritual individualizado, que pensa, sente e progride, ainda que em estágios rudimentares.

1. A Visão Espírita e o Resgate da Dignidade Animal

Na tradição ocidental, herdeira do dualismo platônico e das teologias antropocêntricas, os animais foram historicamente relegados à condição de seres sem alma e sem transcendência. A ciência materialista moderna, por sua vez, ao rejeitar a espiritualidade, reduziu-os a organismos biológicos complexos, movidos apenas por instintos.

O Espiritismo, no entanto, oferece uma visão integradora e racional: reconhece nos animais a presença de uma alma em desenvolvimento, um princípio inteligente que, embora destituído de livre-arbítrio e consciência reflexiva, possui sensibilidade, afetividade e inteligência instintiva.

Kardec esclarece em O Livro dos Espíritos (questão 585) que os animais “possuem, além da vitalidade, uma espécie de inteligência instintiva, limitada, e a consciência de sua existência e individualidade”.

Essa afirmação rompe com o paradigma mecanicista e antecipa concepções contemporâneas da etologia e da neurociência que reconhecem nas espécies não humanas comportamentos emocionais e cognitivos complexos.

2. A Evolução Anímica: Continuidade entre os Reinos

A Doutrina Espírita não admite a metempsicose — a reencarnação de Espíritos humanos em corpos animais —, mas estabelece um elo evolutivo de continuidade entre o princípio espiritual nos reinos da Natureza.

Conforme a questão 607 de O Livro dos Espíritos, “o Espírito passa por uma série de existências que precedem o período que chamais humanidade”, evidenciando que o princípio inteligente se individualiza progressivamente, alcançando no homem a razão e a consciência moral.

O cientista espírita Gabriel Delanne denominou essa trajetória de Evolução Anímica, teoria que demonstra a transição gradativa do instinto à razão. Outros pesquisadores, como Gustave Geley e Ernesto Bozzano, ampliaram esse entendimento, apontando para uma dinâmica evolutiva psíquica que abrange os reinos inferiores e superiores da vida.

Léon Denis sintetiza essa concepção de modo poético e filosófico: “Na planta, a inteligência dormita; no animal, sonha; só no homem acorda, conhece-se, possui-se e torna-se consciente.”. Tal imagem simboliza o continuum evolutivo do princípio inteligente, sustentado pela lei divina de progresso.

3. Emoções e Psiquismo Animal: O Elo da Sensibilidade

A convivência cotidiana com os animais demonstra a presença de emoções rudimentares, como alegria, medo, ciúme, tristeza e gratidão. Esses sentimentos, observáveis empiricamente, confirmam o que o Espiritismo já ensina há mais de um século e meio: o psiquismo animal é embrião das futuras faculdades humanas.

Embora a ciência ainda relute em admitir uma espiritualidade animal, pesquisas etológicas recentes — como as de Frans de Waal e Marc Bekoff — reconhecem que os animais possuem empatia, memória social e capacidade de aprendizagem moral elementar.

Tais descobertas, longe de contradizerem o Espiritismo, corroboram sua visão evolucionista espiritual, segundo a qual toda inteligência é manifestação graduada de um mesmo princípio divino.

4. Ética, Direito e Espiritualidade na Relação Humano-Animal

O reconhecimento da alma animal implica consequências éticas e jurídicas. Tratar os animais com respeito e compaixão é dever espiritual, pois se trata de irmãos menores na senda evolutiva.

A Declaração Universal dos Direitos do Animal (1978) representa um passo importante nesse sentido, mas ainda limitado à esfera legal. O Espiritismo vai além: convida o homem à fraternidade universal, que inclui todos os seres vivos.

O Espírito André Luiz, em Evolução em Dois Mundos, explica que as formas biológicas são instrumentos de manifestação do princípio inteligente, e que a natureza é “oficina divina em permanente construção”. Assim, maltratar um animal é ofender o próprio Criador, pois cada ser é expressão de Sua sabedoria.

A civilização que aspira à regeneração espiritual precisa elevar sua ética para abranger a totalidade da vida, compreendendo que os animais são parceiros evolutivos e não recursos utilitários.

Conclusão

O Espiritismo oferece à humanidade uma síntese racional entre ciência, filosofia e moral, capaz de restituir aos animais sua verdadeira dignidade espiritual. Ao reconhecer que o princípio inteligente neles evolui, sente e aprende, a Doutrina revela que a vida é una em sua essência e múltipla em suas formas.

Nessa perspectiva, a fraternidade não se limita ao homem: estende-se a todos os seres criados, pois cada um é parte da obra divina em marcha para a perfeição.

O modo como tratamos os animais é reflexo de nosso grau de humanidade — e, portanto, de nossa evolução espiritual.

Referências

  • KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB, ed. atual.
  • KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858-1869). Diversos volumes.
  • DENIS, Léon. O Problema do Ser e do Destino.
  • DELANNE, Gabriel. A Evolução Anímica. FEB.
  • GELEY, Gustave. Do Inconsciente ao Consciente. Paris, 1919.
  • BOZZANO, Ernesto. Animais e Fenômenos de Materialização. FEB.
  • ANDRÉ LUIZ (Espírito). Evolução em Dois Mundos. Psicografia de Chico Xavier e Waldo Vieira.
  • UNESCO. Declaração Universal dos Direitos do Animal, 15 de outubro de 1978.
  • LARA, Eugênio. “A Espiritualidade nos Animais.” Fevereiro de 2010.
  • BEKOFF, Marc; DE WAAL, Frans. The Emotional Lives of Animals. Nova York, 2007.

 

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