domingo, 19 de outubro de 2025

A PRECE E O PODER DE ELEVAÇÃO MORAL
UMA LEITURA ESPÍRITA CONTEMPORÂNEA
- A Era do Espirito - 

Introdução

Em um mundo marcado pela pressa, pela competitividade e pela ansiedade coletiva, o ato de orar — muitas vezes relegado ao plano da tradição ou do hábito — readquire, à luz do Espiritismo, uma profunda dimensão racional e moral. Longe de ser mera repetição de fórmulas, a prece, segundo a Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec, é um ato de comunhão entre a criatura e o Criador, em que o pensamento, movido pela fé e pela sinceridade, se torna uma força viva de transformação interior.

Mais do que uma prática religiosa, a prece é uma lei natural de sintonia espiritual, regida pela afinidade vibratória e pela intenção que anima o sentimento. Kardec, em O Livro dos Espíritos (questões 658 a 666), define-a como ato de adoração e instrumento de progresso moral, cujos efeitos ultrapassam o campo psicológico, estendendo-se ao campo fluídico e espiritual.

1. A Prece como Ato de Adoração e Sintonia com Deus

A prece, afirma Kardec (questão 659), é “um ato de adoração”, isto é, um movimento de elevação da alma em direção ao seu princípio criador. Orar é pensar em Deus, entrar em comunhão com Ele e com as inteligências superiores que O representam no universo. Nesse sentido, a prece não é uma barganha nem uma súplica mística, mas uma atitude de harmonização interior, na qual o Espírito reconhece a própria pequenez diante das leis divinas e busca nelas inspiração, consolo e direção.

Essa concepção rompe com o modelo teológico de um Deus que “intervém” arbitrariamente no destino humano. Conforme ensinam os Espíritos superiores, a prece não muda os desígnios divinos, mas nos muda diante deles. Ao orar, o ser se reequilibra, pacifica-se e atrai o concurso dos bons Espíritos, que o inspiram e fortalecem na luta moral do cotidiano.

2. O Valor Moral e Transformador da Prece

Em O Livro dos Espíritos (questão 660), lê-se que “a prece torna o homem melhor”, porque quem ora com fervor e confiança recebe o amparo dos bons Espíritos e se torna mais resistente às tentações do mal. A força da prece, portanto, não reside na palavra, mas no estado vibratório da alma.

Muitos se perguntam por que pessoas que “oram muito” permanecem vaidosas, invejosas ou intolerantes. A resposta dos Espíritos é clara: “O essencial não é orar muito, mas orar bem” (660-a). A prece verdadeira exige sinceridade, humildade e vontade de transformação. É o momento de autoexame e autossuperação, não de fuga moral.

A prece eficaz é, portanto, pedagógica. Ela convida o indivíduo ao arrependimento sincero, à Transformação íntima e à prática do bem. Nas palavras dos Espíritos (questão 661), “as boas ações são a melhor prece, porque os atos valem mais do que as palavras”.

3. A Prece Intercessora: Orar pelos Outros e pelos Espíritos

A Doutrina Espírita amplia o alcance da prece ao mostrar que o pensamento é uma força ativa. Quando oramos pelos outros, desencarnados ou encarnados, emitimos ondas mentais de auxílio que atraem Espíritos benfeitores em benefício daqueles a quem dedicamos nossa intenção.

Segundo O Livro dos Espíritos (questão 662), a prece por outrem é um ato da vontade dirigida ao bem. Quando sincera e ardente, ela cria uma corrente fluídica de amparo, ligando aquele que ora ao que recebe a prece, sob a mediação dos Espíritos superiores. Assim, o auxílio espiritual não se dá por milagre, mas por leis de sintonia e afinidade fluídica, dentro da ordem natural instituída por Deus.

Essa visão explica também o poder da prece em favor dos Espíritos sofredores (questões 664 e 665). Orar pelos desencarnados não altera a justiça divina, mas os consola e os estimula ao arrependimento, despertando neles o desejo de progredir. As vibrações de ternura e solidariedade que lhes são dirigidas funcionam como bálsamo moral, abrindo-lhes o coração para o amparo dos Espíritos mais elevados.

Kardec observa, em perfeita coerência com o ensinamento do Cristo, que negar a prece pelos mortos seria contrariar a própria lei do amor fraterno: “Amai-vos uns aos outros”, disse Jesus, o que implica também socorrer espiritualmente os que mais necessitam.

4. A Oração como Exercício de Cocriação e Responsabilidade

A oração não é um refúgio para os fracos, mas um instrumento de ação espiritual consciente. Pela vontade e pelo pensamento, o Espírito coopera com a ordem divina, tornando-se participante da harmonia universal.

Como lembra a resposta à questão 663, embora a prece não possa eliminar as provas necessárias ao progresso, ela nos fortalece para suportá-las com resignação e coragem. Essa força interior, nascida da fé raciocinada, é o verdadeiro “milagre” da prece: a transformação moral que conduz o Espírito à paz e à serenidade.

Em tempos de sofrimento coletivo, desigualdade e desorientação moral, a prece bem compreendida e bem sentida continua sendo um canal de equilíbrio vibracional e espiritual, que liga o homem às fontes superiores da vida, ajudando-o a agir com mais lucidez, empatia e esperança.

Conclusão

A prece, vista à luz da Doutrina Espírita, é uma lei de comunicação entre os planos da vida. Ela não suprime as causas naturais, mas integra o ser humano na dinâmica do amor universal, convidando-o à responsabilidade, à transformação íntima e à cooperação com o bem.

Quando feita com sinceridade, a prece é força viva que harmoniza o perispírito, renova o pensamento, atrai os bons Espíritos e estabelece sintonia com Deus. Ela é, ao mesmo tempo, um ato de humildade e de liberdade: humilde, porque reconhece a grandeza divina; livre, porque ativa o poder criador do Espírito em sua própria renovação.

Orar é, em última análise, pensar bem, sentir bem e agir bem — trilha segura para o aperfeiçoamento moral e para a paz interior.

Referências

  • Allan Kardec. O Livro dos Espíritos, 3ª parte, capítulo II – Lei de Adoração: “Da Prece”.
  • Allan Kardec. O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo XXVIII – Coletânea de Preces Espíritas, I. “Preces Gerais: Oração Dominical”.
  • Allan Kardec. Revista Espírita (1858–1869). Diversos artigos sobre a eficácia moral e fluídica da prece.
  • Emmanuel (Espírito). Caminho, Verdade e Vida. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.
  • André Luiz (Espírito). Nos Domínios da Mediunidade. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.

 

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