quinta-feira, 16 de outubro de 2025

AS LÂMPADAS QUE AINDA BRILHAM
UMA REFLEXÃO ESPÍRITA SOBRE O OLHAR E A GRATIDÃO
- A Era do Espírito –

Na véspera de Natal, um casal entra em um restaurante. A mulher, serena e alegre, aprecia as pequenas coisas; o homem, preocupado e irritado, lamenta o fracasso nas vendas de sua loja. Enquanto ele reclama, ela se distrai observando a árvore de Natal do local. Ao notar isso, o homem comenta que há uma lâmpada queimada entre as luzes. A esposa, com doçura, o faz refletir: ele percebeu a lâmpada apagada porque está pessimista, sem notar a beleza das muitas outras que continuam acesas — uma lição simbólica sobre como o olhar negativo nos faz ignorar as bênçãos que seguem a brilhar em nossa vida.

Introdução

Em um tempo em que a correria do consumo e a busca por resultados imediatos parecem dominar as relações humanas, o simples gesto de reconhecer as bênçãos que já possuímos torna-se um exercício espiritual de grande profundidade.

A narrativa da “lâmpada queimada” convida à reflexão sobre a tendência humana de fixar-se nas faltas e nas perdas, esquecendo-se das incontáveis dádivas que iluminam o cotidiano.

À luz da Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec, essa metáfora transcende o aspecto moral e adquire valor filosófico e educativo: o modo como percebemos a vida revela o grau de maturidade espiritual que alcançamos.

Ver apenas a lâmpada queimada — e não as dezenas de outras que brilham — é reflexo simbólico do pessimismo e da ingratidão que obscurecem a visão do Espírito diante das lições e oportunidades oferecidas pela Providência Divina.

1. A percepção seletiva e a Lei de Progresso

O olhar humano é seletivo. Somos inclinados, por instinto e hábito, a notar o que falta, o que dói, o que não deu certo. A psicologia moderna confirma que o cérebro tende a registrar com mais força os estímulos negativos do que os positivos — um mecanismo ancestral de autoproteção.

Entretanto, do ponto de vista espiritual, esse padrão de percepção precisa ser educado.

Kardec, em O Livro dos Espíritos (questões 776 a 785), ensina que o progresso moral é resultado do esforço consciente de superação das imperfeições. Entre elas, estão o pessimismo e o desânimo — estados mentais que impedem o Espírito de ver o bem e de trabalhar pela própria elevação.

Assim, aprender a perceber as “lâmpadas acesas” da vida é parte essencial do processo de regeneração íntima.

Cada desafio enfrentado contém uma lição oculta. Mesmo quando algo “não dá certo”, o fracasso pode representar apenas um desvio pedagógico no caminho do aprendizado. A vida, regida por leis perfeitas, nunca se equivoca no endereço das experiências que nos oferece.

2. O valor espiritual da gratidão

Na perspectiva espírita, a gratidão é mais que um sentimento: é uma vibração elevada que sintoniza o Espírito com as forças superiores da Criação. Emmanuel, em Pensamento e Vida, define-a como “luz que aclara os recantos sombrios do coração”.

Ser grato não é negar as dores, mas reconhecer que elas coexistem com bênçãos silenciosas. Mesmo nas noites mais densas, existem estrelas a brilhar.

A mulher da parábola — que vê beleza na árvore, apesar da lâmpada queimada — representa a consciência desperta, capaz de enxergar o bem mesmo quando há sombras.

No campo prático, cultivar a gratidão produz efeitos mensuráveis. Estudos contemporâneos em neurociência apontam que pessoas gratas apresentam níveis mais altos de serotonina e dopamina, hormônios ligados à sensação de bem-estar.

Sob o enfoque espiritual, esse equilíbrio químico é o reflexo material de uma alma em harmonia com as leis divinas.

3. Entre o pessimismo e a fé raciocinada

A Doutrina Espírita não recomenda uma fé cega, mas uma fé raciocinada, construída sobre o entendimento das leis morais e universais.

Ao compreender a justiça e a bondade de Deus, o Espírito aprende a não se fixar nas aparentes perdas momentâneas.

Na Revista Espírita (dezembro de 1863), Kardec registra diálogos espirituais sobre resignação e confiança, destacando que “a verdadeira fé se reconhece pela serenidade diante das provas”.

Essa serenidade não é passividade, mas compreensão de que o mal aparente é, muitas vezes, instrumento do bem futuro.

Ao olhar para a “lâmpada queimada” da existência — seja uma frustração financeira, uma perda afetiva ou um erro cometido —, o aprendiz do Evangelho é convidado a manter o foco nas outras luzes que permanecem acesas: o amor, a saúde, o trabalho, a amizade, a esperança.

4. O convite à visão espiritual

A vida, sob o ponto de vista espiritual, é um vasto campo de luzes intermitentes.

Algumas brilham com força constante; outras se apagam temporariamente para que aprendamos a valorizar o conjunto.

Jesus, em seu Evangelho, ensinou: “Os olhos são a lâmpada do corpo; se teus olhos forem bons, todo o teu corpo terá luz” (Mt 6:22).

Essa metáfora encontra eco no Espiritismo: o olhar moral e espiritualizado é o instrumento que define o tom vibratório de nossa existência.

A verdadeira evolução começa quando treinamos os olhos da alma para enxergar o bem, mesmo onde o mundo vê falhas.

Ao fazermos isso, deixamos de ser meros observadores das sombras para nos tornarmos colaboradores da luz divina.

Conclusão

A lição da “lâmpada queimada” convida-nos a um exercício diário de percepção e gratidão.

No balanço das nossas vidas, sempre haverá falhas, perdas e decepções. Mas o que realmente define nosso estado espiritual não é a ausência de problemas, e sim a capacidade de reconhecer o bem que permanece e transformar a dor em aprendizado.

Sob a ótica espírita, a felicidade possível na Terra nasce da visão equilibrada que reconhece tanto a lâmpada queimada quanto as que ainda brilham — e decide agradecer por todas.

Referências

  • ALLAN KARDEC. O Livro dos Espíritos. 62ª ed. FEB, 2021.
  • ALLAN KARDEC. Revista Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos (1858–1869). FEB.
  • EMMANUEL (espírito), psicografia de Francisco Cândido Xavier. Pensamento e Vida. FEB, 1958.
  • MOMENTO ESPÍRITA. A lâmpada queimada. Disponível em: momento.com.br.
  • J. RAUL TEIXEIRA, Espírito Rosângela. Rosângela, cap. 4. Ed. Fráter.
  • JESUS. O Evangelho segundo Mateus, 6:22.

 

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