Introdução
Muitos
leitores dos Evangelhos se surpreendem ao encontrar passagens em que Jesus,
habitualmente identificado pela brandura e pelo amor, anuncia que não veio
trazer paz, mas a espada. Também causa estranhamento sua afirmação de que veio
lançar fogo sobre a Terra e que tinha pressa em que esse fogo se acendesse.
Essas
declarações, se interpretadas apenas pela letra, parecem contradizer a essência
da mensagem cristã. No entanto, quando buscamos o “espírito que vivifica” —
como orienta Paulo de Tarso — compreendemos que Jesus não se referia à
violência ou à guerra material, mas sim à necessária transformação moral da
humanidade.
A
Doutrina Espírita, surgida no século XIX como o Consolador Prometido (João
14:16), ajuda-nos a interpretar essas palavras à luz da razão e da evolução
espiritual, revelando a profundidade do ensinamento que ultrapassa a aparência
literal.
A missão de Jesus na Terra
Jesus
não trouxe títulos, riquezas ou poder. Viveu de maneira simples, rodeado de
pessoas humildes, transmitindo suas lições em linguagem acessível. Não deixou
escritos, mas imprimiu seus ensinamentos na memória e no coração dos que o
ouviram. Como registra a Doutrina Espírita em O Livro dos Espíritos
(questão 625), Jesus é “o guia e modelo
da humanidade”.
Sua
passagem marcou a história a ponto de dividir as eras em antes e depois dele,
demonstrando que sua missão não se limitou a um povo ou a uma época. Sua
presença transcende fronteiras religiosas e se expande como eixo central da
civilização humana.
A espada e o fogo: símbolos de transformação
Quando
Jesus fala em “espada”, refere-se à divisão inevitável que sua mensagem
causaria. A verdade, ao ser anunciada, naturalmente confronta preconceitos,
interesses estabelecidos e tradições. Essa oposição se manifesta até hoje em
debates entre religiões, famílias e sociedades.
A
espada, portanto, não é de ferro, mas de discernimento. Representa a luta
interior contra nossas próprias imperfeições — orgulho, egoísmo, vaidade e
ignorância — que precisam ser extirpadas para que a luz divina se manifeste em
nós.
Já o
fogo simboliza a depuração moral. Assim como o agricultor queima o campo para
eliminar ervas daninhas, o Evangelho é o fogo purificador que consome erros e
preconceitos, apressando a regeneração espiritual da humanidade.
A Doutrina Espírita e a interpretação das palavras
de Jesus
O
Espiritismo, codificado por Allan Kardec, esclarece o sentido profundo dessas
passagens. Na Revista Espírita (dezembro de 1868), Kardec observa que o
advento do Consolador trouxe à luz “o
fogo novo das ideias” capaz de transformar as estruturas da sociedade,
abalando privilégios e despertando consciências.
O
Espiritismo ensina que não devemos confundir o conflito natural de ideias com
violência. A verdadeira espada cristã é a da renovação moral, que separa o
homem velho do homem novo. Como destaca O Evangelho segundo o Espiritismo
(cap. XXIII), Jesus não pregou a guerra entre pessoas, mas a luta contra os
vícios que ainda escravizam o Espírito.
O futuro das religiões e a síntese em amor e
caridade
Apesar
de ainda haver guerras e divisões em nome da fé, observa-se uma diminuição
significativa desses conflitos em comparação com séculos passados. A humanidade
caminha, mesmo que lentamente, para a compreensão de que o verdadeiro culto a
Deus está no amor e na caridade.
Conforme
ensina o Espiritismo, chegará o tempo em que todas as religiões se fundirão na
prática desses dois princípios universais. Nesse cenário, não importará o
rótulo religioso, mas a vivência sincera dos ensinamentos de Jesus.
Conclusão
A
espada de Jesus não fere a carne, mas desperta a consciência. O fogo que ele
anunciou não destrói, mas purifica. Sua mensagem permanece viva porque nos
convida à luta íntima, à transformação moral e ao cultivo da fraternidade.
O
Evangelho, iluminado pela Doutrina Espírita, revela-se não como um código de
imposições, mas como roteiro de libertação e de paz interior. E à medida que
avançamos em ciência, filosofia e espiritualidade, compreendemos com mais
clareza que a verdadeira vitória está na superação de nós mesmos.
Referências
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Espíritos. FEB.
- KARDEC, Allan. O
Evangelho segundo o Espiritismo. FEB.
- KARDEC, Allan. Revista
Espírita. 1858-1869.
- SILVA, Sérgio
Honório da. Não vim trazer a paz, mas a espada. Artigo.
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