Introdução
Se
cada ser humano recebesse diariamente um depósito de oitenta e seis mil e
quatrocentas moedas, com a condição de gastar tudo em um único dia, sem
possibilidade de acumulação ou transferência, provavelmente não
desperdiçaríamos nenhum centavo. Esse exemplo simbólico nos conduz a uma
reflexão maior: todos recebemos esse “capital”, mas em forma de segundos. São
oitenta e seis mil e quatrocentos instantes diários, irrecuperáveis, que
constituem a matéria-prima de nossa vida.
Na
sociedade atual, marcada pela aceleração digital, pela sobrecarga de
informações e pela valorização da produtividade em detrimento da qualidade de
vida, o tempo tornou-se um bem cada vez mais disputado. A Doutrina Espírita,
codificada por Allan Kardec, oferece elementos fundamentais para compreender o
uso do tempo não apenas como recurso material, mas como oportunidade
espiritual.
O Tempo como Tesouro Divino
De
acordo com os ensinamentos espíritas, o tempo não é apenas uma convenção
humana, mas parte da Lei Natural, que regula as etapas do progresso. Na Revista
Espírita (1859), Kardec destacou que a vida terrena é um período de
aprendizado e de preparo, em que cada hora pode ser aproveitada para a construção
do bem.
O
Espírito Emmanuel, pela psicografia de Francisco Cândido Xavier, reforça essa
visão em Caminho, Verdade e Vida, quando afirma que o tempo é um talento
concedido por Deus. Assim como na parábola dos talentos, registrada por Jesus,
cada segundo é uma semente que pode gerar frutos de luz ou se perder na
esterilidade da inércia.
Usos e Abusos do Tempo
A
realidade contemporânea mostra que muitos ainda “matam o tempo” em futilidades,
como o excesso de entretenimento vazio, as disputas nas redes sociais ou a
prática de maledicências, que apenas multiplicam infelicidade. Outros reduzem o
tempo à lógica materialista do “tempo é dinheiro”, esquecendo que o verdadeiro
valor está naquilo que agrega à alma.
Estudos
atuais da Organização Mundial da Saúde (2024) indicam que o mau uso do tempo,
especialmente em jornadas de trabalho desequilibradas ou em excesso de
exposição digital, está diretamente ligado ao aumento de transtornos de
ansiedade e depressão. Ou seja, não se trata apenas de perda de produtividade,
mas de desgaste físico, emocional e espiritual.
O
Espiritismo ensina que esse desperdício não é sem consequências. A Lei Divina
estabelece que todo excesso encontra limite. Se não aprendemos a valorizar o
tempo, somos naturalmente conduzidos a situações em que ele parece escasso,
como forma de aprendizado e disciplina.
O Tempo como Oportunidade de Evolução
Paulo
de Tarso, em sua epístola aos Romanos, já advertia que aquele que valoriza o
dia, “para o Senhor o faz”. O tempo, nesse sentido, é campo sagrado para a
realização do bem.
A
Doutrina Espírita acrescenta que, ao utilizarmos nossos segundos em atos de
amor, estudo, trabalho honesto e serviço ao próximo, estamos semeando condições
melhores para o futuro espiritual. Em contrapartida, o uso inconsciente ou
egoísta do tempo resulta em atrasos evolutivos que precisarão ser reparados em
novas experiências reencarnatórias.
Cada
minuto dedicado ao cultivo da harmonia íntima, da solidariedade e do
aprendizado é investimento que jamais se perde. Como ensina Kardec em O
Livro dos Espíritos (questão 132), a vida na Terra é uma missão, e o tempo,
sua ferramenta mais valiosa.
Conclusão
O
tempo é o banco divino que nos oferece diariamente um capital precioso. Cabe a
cada um de nós decidir se vamos dissipá-lo em distrações estéreis ou aplicá-lo
em investimentos espirituais duradouros.
À luz
do Espiritismo, compreender o valor do tempo é reconhecer que cada segundo
carrega a possibilidade de renovar a própria vida, auxiliar o próximo e
contribuir para a construção de um mundo mais justo e fraterno. Em última
análise, o tempo é oportunidade de aproximar-nos de Deus.
Referências
- Allan Kardec, O
Livro dos Espíritos, FEB.
- Allan Kardec, Revista
Espírita (1858-1869), FEB.
- Francisco Cândido
Xavier, pelo Espírito Emmanuel, Caminho, Verdade e Vida, cap. 1,
ed. FEB.
- Momento Espírita, Preciosidade
do tempo, momento.com.br/pt/ler_texto.php?id=2107&stat=0
- Roger Patrón Luján,
Um presente especial, cap. A verdadeira riqueza, ed. Aquariana.
- Organização Mundial
da Saúde (OMS), Relatório sobre saúde mental e uso do tempo, 2024.
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