Introdução
Em uma pequena tribo da África do Sul sobrevive um
costume ancestral que ensina, com simplicidade e profundidade, o valor do
perdão e da fraternidade. Quando um membro da comunidade erra, em vez de ser
punido, é colocado no centro da aldeia e cercado por todos, que passam dois
dias lembrando-lhe o bem que já realizou. Ao final, o erro se dissolve no
reconhecimento do bem, e o indivíduo se reconecta com a própria essência. As
palavras Sawabona (“eu te
respeito, eu te valorizo, és importante para mim”) e Shikoba (“então, eu existo para
ti”) expressam, em seu conjunto, uma profunda verdade espiritual: “eu sou bom.”
Esse
gesto coletivo de amor e respeito reflete um princípio universal que também é
base da Doutrina Espírita: a crença na bondade essencial do ser humano e na
perfectibilidade do Espírito, criado simples e ignorante, mas destinado à
perfeição.
1. A visão espírita sobre o erro e o progresso
moral
Allan
Kardec, em O Livro dos Espíritos (questões 114 a 122), explica que todos
os Espíritos são criados iguais, com aptidão para o bem, e que as imperfeições
são passageiras, fruto da ignorância e da falta de amadurecimento moral. Assim,
errar não é uma condenação eterna, mas uma oportunidade de aprendizado.
Na
tradição daquela tribo africana, o erro é compreendido como um pedido de ajuda,
não como um sinal de perdição. O mesmo raciocínio se encontra nas lições de
Jesus e na filosofia espírita, que reconhecem o desvio moral como uma
desconexão momentânea do amor e da verdade. Ao invés de castigar, o Espiritismo
convida à reeducação do ser.
Em vez
de exclusão, a tribo oferece acolhimento; em vez de julgamento, oferece
lembrança do bem. A atitude se aproxima do que Jesus ensinou: “Não vim para chamar os justos, mas os
pecadores, ao arrependimento” (Lucas 5:32).
2. A responsabilidade coletiva na regeneração do
ser
O
gesto da tribo — reunir-se ao redor do que errou — revela uma compreensão
profunda da interdependência humana. A regeneração não é apenas um ato
individual, mas também coletivo. Na Doutrina Espírita, essa ideia aparece na Revista
Espírita (abril de 1864), quando Kardec destaca que “ninguém se melhora senão com o concurso dos outros; e ninguém se salva
senão auxiliando seus irmãos”.
Ao envolver
o infrator com palavras de respeito, a comunidade africana realiza um
verdadeiro passe moral: transfere vibrações de fraternidade que o ajudam a
retomar o equilíbrio interior. Da mesma forma, o Espiritismo ensina que o bem é
contagioso e que o amor reeduca mais do que a punição.
A
sociedade moderna, marcada por discursos de ódio e polarização, poderia
aprender com esse exemplo. Em vez de ampliar o abismo da exclusão, a prática do
diálogo, do perdão e da empatia — princípios cristãos e espíritas — pode
restaurar laços e promover o progresso moral coletivo.
3. Sawabona e Shikoba: um reflexo da lei de amor
A
expressão Sawabona Shikoba sintetiza o reconhecimento mútuo do valor
espiritual do outro. Quando alguém diz “eu te vejo”, e o outro responde “então
eu existo para ti”, ambos reafirmam a unidade que os liga. Essa relação de
reciprocidade ecoa a lei de amor e caridade explicada por Kardec em O
Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo XI: “Fora da caridade não há salvação”.
Na
prática, perdoar é devolver ao outro a possibilidade de recomeçar. E, ao
fazê-lo, libertamo-nos também das correntes do ressentimento. O perdão,
portanto, é tanto um ato de amor quanto de libertação espiritual.
O
costume africano nos lembra que o ser humano não deve ser reduzido ao seu erro.
Por trás da falha há sempre uma alma em processo de crescimento, um Espírito
que busca reconectar-se à centelha divina que habita em todos.
4. A lição espiritual para o nosso tempo
Em
tempos de intolerância e pressa, a atitude daquela tribo ressoa como um convite
à reflexão: como reagimos quando alguém erra conosco? Buscamos compreender ou
apenas julgar?
A
Doutrina Espírita, com sua visão consoladora e racional, mostra que todos
estamos em diferentes graus de aprendizado moral. Assim, o erro do outro é
também um espelho que nos ensina a ter paciência, humildade e caridade.
Resgatar
o bem em nós — e reconhecer o bem no outro — é parte da grande obra da evolução
espiritual. Amar o próximo não é ignorar as faltas, mas ajudar o outro a
superá-las. Como ensina Emmanuel em A Caminho da Luz, “a lei do amor é a luz das almas, e somente
sob a sua influência é que o homem encontrará a felicidade a que aspira”.
Conclusão
O
costume Sawabona Shikoba nos recorda que o verdadeiro progresso moral
não nasce da punição, mas da compreensão. Ao reconhecer o bem que existe em
cada ser, reerguemos não apenas aquele que errou, mas também a nós mesmos.
O
Espiritismo reforça essa verdade: somos todos aprendizes da vida, em constante
aperfeiçoamento. Quando amamos, perdoamos e valorizamos o outro, participamos
da grande obra divina de regeneração do mundo.
Referências
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Espíritos. 1857.
- KARDEC, Allan. O
Evangelho segundo o Espiritismo. 1864.
- KARDEC, Allan. Revista
Espírita. 1858–1869.
- XAVIER, Francisco
Cândido (por Emmanuel). A Caminho da Luz. FEB, 1938.
- Momento Espírita. O
bem em cada um. Disponível em: momento.com.br/pt/ler_texto.php?id=7531&stat=0
- RANGEL, Silvana. Você
conhece o significado das palavras Sawabona e Shikoba? Disponível em: somostodosum.com.br
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