O trecho do poema “Urânia – Os Médiuns sem o Saber”,
de Porry de Marseille, publicado na Revista Espírita de novembro de 1859
por Allan Kardec, nos apresenta uma visão sublime e poética da evolução da alma
— visão essa que ecoa uma antiga máxima atribuída a sabedoria hindu:
“A alma dorme no mineral, sonha no vegetal, se
agita no animal e desperta no homem.”
Neste artigo, vamos refletir sobre essas duas
expressões — o poema francês e a frase oriental — e compreender como elas se
entrelaçam de maneira harmoniosa à luz da Doutrina Espírita.
O Verbo Criador e a Centelha
Divina
“O Verbo criador na planta dormita,
Sonha no animal, e no homem desperta...”
No poema, o Verbo é apresentado como o princípio
criador universal, assim como no prólogo do Evangelho de João:
“No princípio era o Verbo...”
Ele é a Força divina que, como uma centelha, anima
tudo o que existe. Essa centelha jamais perece, e percorre todas as
etapas da criação, das mais simples às mais elevadas.
A Escala da Evolução Espiritual
O poema de Porry descreve com beleza o progresso do
espírito ao longo dos reinos da natureza:
Estágio |
Poema
de Porry |
Sabedoria
Hindu |
Interpretação
Espírita |
Mineral |
"a pedra começa" |
"a alma dorme no mineral" |
Princípio inteligente em estado latente, sem consciência |
Vegetal |
"na planta dormita" |
"sonha no vegetal" |
Início da vitalidade, vida sem sensibilidade individualizada |
Animal |
"sonha no animal" |
"se agita no animal" |
Desenvolvimento dos instintos e da percepção |
Homem |
"e no homem desperta" |
"desperta no homem" |
Consciência moral, razão, livre-arbítrio |
Arcanjo |
"o arcanjo termina" |
(implícito na sabedoria oriental) |
Espírito puro, em comunhão com a Vontade Divina |
Essa trajetória é explicada de forma clara em O
Livro dos Espíritos (questões 540 a 610), onde Allan Kardec expõe o
processo de evolução do princípio espiritual rumo à perfeição.
A Liberdade no Cume da Evolução
O poema traz um detalhe belíssimo:
“Esse arcanjo elevado [...]
Está livre para guardar sua personalidade,
Ou de se fundir no seio da Onipotência...”
Ou seja, quando o Espírito atinge o grau máximo de
elevação, ele não perde sua individualidade, mas pode se tornar tão
puro, tão harmonizado com Deus, que se une à Sua Vontade por amor, num
grau de sintonia espiritual tão grande que beira a fusão simbólica com o Todo.
Esse não é um aniquilamento da alma, mas sim uma comunhão
voluntária com o Bem Supremo.
O Orgulho como Obstáculo
O poema alerta:
“Outros, invejando sua glória soberana [...]
Quiseram do Mais Alto discutir os decretos;”
Aqui encontramos a queda pelo orgulho, que
também é explicada no Espiritismo como uma das causas do sofrimento espiritual.
Espíritos dotados de livre-arbítrio podem usar mal sua liberdade, afastando-se
da luz e atrasando seu próprio progresso.
Harmonia entre Ocidente e Oriente
Apesar das origens culturais distintas, tanto o poema
francês quanto a máxima hindu revelam a mesma verdade universal:
A alma é uma centelha divina em constante evolução,
que atravessa os reinos da natureza até despertar plenamente no homem,
e que pode ascender ao estado sublime do Espírito puro,
em comunhão com Deus.
O Espiritismo reconcilia e explica essa
ideia com base em uma filosofia progressista, racional e moral.
🌟 Conclusão: O Espírito é o
Arquiteto de Seu Destino
A Doutrina Espírita nos ensina
que:
- Deus cria o princípio inteligente simples e ignorante;
- Ele evolui gradualmente pelas experiências dos diversos
reinos da natureza;
- E atinge a perfeição por meio do progresso intelectual e moral.
Essa ascensão é sempre feita com liberdade,
e cada Espírito constrói seu caminho pela vontade, pelo amor ou pelo orgulho.
Somos todos sementes de luz, caminhando da pedra ao
arcanjo.
Que possamos escolher a direção do Alto, guiados
pelo bem, pela verdade e pelo amor.
Referências:
- Revista Espírita, novembro de 1859 — Allan
Kardec (Poema “Urânia – Os Médiuns sem o Saber” de Porry de Marseille)
- O Livro dos Espíritos, Allan Kardec – questões
540 a 610
- Máxima tradicional da sabedoria oriental: “A alma dorme no
mineral...”
- Evangelho de João 1:1: “No princípio era o Verbo...”
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