sábado, 26 de julho de 2025

A ÁRVORE DOS PROBLEMAS: UMA LIÇÃO ESPÍRITA 
DE AMOR E DESPRENDIMENTO
- A Era do Espírito -

A Árvore dos Problemas

Havia poucos dias desde que me mudara para minha nova casa.

Os móveis haviam finalmente chegado e precisavam ser montados. Para isso, contratei os serviços de um marceneiro.

Era um homem experiente e dedicado. Em apenas três dias, montou sozinho todos os móveis do quarto, da sala e da cozinha com eficiência e capricho.

Além do trabalho bem feito, ele também era bastante comunicativo. Entre uma martelada e outra, puxava conversa sobre os mais variados assuntos.

Ora falava sobre política, ora exaltava as qualidades do seu time de futebol. Às vezes comentava o tempo, as notícias do dia ou algum fato curioso que vira nos jornais. Mas seu tema preferido, sem dúvida, era a família.

Falava com entusiasmo sobre a dedicação da esposa e sobre os filhos, sempre destacando a inteligência e a educação deles. Seus olhos brilhavam quando tocava nesses assuntos, irradiando orgulho e alegria genuínos.

Contudo, no terceiro dia de trabalho, ao chegar à minha casa para concluir a montagem, percebi algo diferente em seu semblante. Estava visivelmente abatido.

Passou o dia praticamente em silêncio. Preocupado com aquela mudança repentina de comportamento, não resisti e perguntei se estava tudo bem.

A resposta revelou um dia difícil. Logo pela manhã, o carro que usava para o trabalho havia quebrado e precisaria passar dias na oficina. Enquanto esperava o ônibus, um assaltante o abordou e levou sua caixa de ferramentas — ferramenta essa essencial para o seu sustento.

Dentro da caixa, infelizmente, também estava sua carteira, com todos os documentos pessoais. Era compreensível que estivesse abalado e irritado.

Quando ele terminou seu trabalho, vendo seu cansaço e ainda sensibilizado com tudo o que havia ocorrido, ofereci-lhe uma carona até em casa. Ele aceitou, agradecido.

Ao chegarmos, convidou-me para entrar e conhecer sua família.

Na frente da casa havia uma imponente árvore, de tronco largo e copa frondosa. Antes de abrir o portão, ele se aproximou da árvore e se recostou por alguns segundos. Fez isso em silêncio. Quando se virou, seu rosto havia mudado completamente: sereno, leve, sorridente.

Entrou em casa sorrindo, abraçando e beijando a esposa e os filhos. Voltou a ser o homem falante e alegre dos dias anteriores.

Sua esposa, muito gentil, me convidou para o jantar. A noite foi agradável, cheia de risos e afeto familiar.

Na hora da despedida, tomado pela curiosidade, perguntei sobre a árvore e aquele momento em que ele se deteve diante dela.

Com um sorriso calmo, ele me respondeu:

— Aquela é a minha árvore dos problemas. Todas as vezes que chego em casa, deixo ali tudo o que me aflige. Minha família não tem culpa dos meus fardos. Eles não merecem carregar o peso das minhas dificuldades.

E acrescentou:

— Amanhã, quando eu sair para trabalhar, passo por ela de novo. Recolho os problemas e, com a ajuda de Deus, vou enfrentá-los um a um.

Poucos ensinamentos morais tocam tanto o coração quanto aqueles extraídos da vida cotidiana. A história do marceneiro e sua “árvore dos problemas” é um desses exemplos simples, mas profundos, que nos convidam à reflexão e ao aperfeiçoamento íntimo. Vista à luz da Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec, essa narrativa revela valiosas lições sobre responsabilidade, disciplina emocional e amor ao próximo — virtudes indispensáveis ao progresso do espírito imortal.

A Vida em Dois Planos

Segundo o Espiritismo, o ser humano é um Espírito imortal em experiência temporária no corpo físico. Isso significa que, embora vivamos inseridos nas lutas materiais, nossa verdadeira vida é a espiritual. Essa compreensão amplia nossa forma de ver os problemas do cotidiano: eles são provas e expiações que nos ajudam a crescer, mas não devem ser usados como justificativas para ferirmos quem caminha ao nosso lado.

O marceneiro da história vivia, como tantos de nós, as dificuldades comuns do dia a dia: problemas financeiros, violência urbana, perdas materiais. Mas sua postura diante desses fatos o elevava espiritualmente. Ele sabia separar a dor da reação impulsiva, e não permitia que suas frustrações se transformassem em agressividade para com a família.

A Sabedoria da Renúncia

Na Doutrina Espírita, o verdadeiro mérito espiritual não está apenas em suportar os problemas com resignação, mas em agir com elevação moral mesmo em meio à adversidade. O marceneiro não negava os seus problemas — ele os reconhecia, enfrentava e os deixava "na árvore", símbolo do desapego momentâneo e da confiança em Deus.

Essa atitude reflete a sabedoria da renúncia ativa, tema caro à filosofia espírita. Como ensinam os Espíritos superiores na questão 918 de O Livro dos Espíritos, o verdadeiro homem de bem é aquele que “faz o bem pelo bem, sem esperar retorno, e se sacrifica pelo próximo sem lamento”.

Família: Núcleo de Amor e Aprendizado

A casa do trabalhador simboliza o núcleo afetivo da vida espiritual encarnada. A família, conforme nos ensina a Doutrina, é o primeiro campo de provas e de reconstrução moral. Muitos dos que hoje convivem sob o mesmo teto foram, em outras existências, adversários, vítimas ou desafetos, reunidos novamente pela misericórdia divina para que o amor vença os débitos do passado.

Por isso, é essencial proteger o ambiente familiar dos reflexos negativos do mundo exterior. Como nos ensina o Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo XIV, “Honrai vosso pai e vossa mãe”, a convivência em família é uma oportunidade bendita de crescimento mútuo. Transferir para o lar a impaciência e a irritação acumuladas fora dele é desperdiçar essa oportunidade.

A Árvore dos Problemas como Símbolo Espiritual

A árvore diante da casa é um símbolo poderoso. Representa o ponto de equilíbrio entre o mundo de fora e o santuário do lar. Nela, o trabalhador deixa, por instantes, as preocupações que não cabem dentro de sua casa. Em termos espíritas, isso é um exercício de autoeducação emocional e espiritual, uma prática silenciosa de caridade para com os entes queridos.

Essa imagem nos convida a também criarmos, simbolicamente, nossa “árvore dos problemas”. Um lugar — físico ou mental — onde possamos descarregar o peso das dificuldades, entregando-as à confiança em Deus, e não à amargura dos nossos. Pois, como o próprio marceneiro afirma, “com a ajuda de Deus, saio para resolvê-los”.

Conclusão: O Bom Ânimo e a Elevação Moral

A história nos recorda que as dificuldades passam, mas as consequências morais de nossas atitudes permanecem. O mau-humor, a agressividade, a aspereza nas palavras podem ferir profundamente aqueles que mais amamos. Já a paciência, o carinho e o bom ânimo edificam laços espirituais duradouros.

A Doutrina Espírita nos convida ao esforço contínuo de transformação íntima. Mesmo nos dias mais difíceis, somos chamados a escolher entre o impulso da impaciência e o exercício da serenidade. Como nos ensina Jesus, “o que fizerdes ao menor dos meus irmãos, a mim o fizestes” (Mateus 25:40).

Que possamos, então, cultivar nossa própria árvore dos problemas — não como fuga, mas como ato de sabedoria e amor. Porque os desafios da vida são inevitáveis, mas o que fazemos com eles é decisão de nossa alma.

Referências Doutrinárias:

  • KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, questões 918 e 895.
  • KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulos IX (Bem-aventurados os brandos) e XIV (Honrai vosso pai e vossa mãe).
  • KARDEC, Allan. Revista Espírita.
  • www.momento.com.br/pt/ler_texto.php?id=4239&let=Q&stat=0

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