Na Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec, a
relação entre o mundo material e o espiritual é compreendida como uma realidade
dinâmica, contínua e essencial para a evolução do ser. Esses dois mundos não
estão isolados, mas em constante comunicação, regidos por leis morais e
naturais que revelam a grandiosidade da criação divina e o propósito da
existência.
Essa compreensão nasce da aplicação do método
espírita, baseado na observação dos fatos, no raciocínio lógico, na
experimentação e, sobretudo, no controle universal do ensino dos Espíritos
— um critério de universalidade, coerência e concordância progressiva das
revelações espirituais, conforme Kardec expôs em O Evangelho segundo o
Espiritismo (Introdução, item II).
OS DOIS MUNDOS: DISTINTOS, MAS
INTERLIGADOS
1. O
Mundo Material: Escola de Aprendizado e Provação
O mundo material é o plano onde se dá a encarnação
dos Espíritos. Aqui, o Espírito veste temporariamente um corpo físico e
mergulha nas experiências da vida carnal com o objetivo de progredir
intelectualmente e moralmente. Como ensina O Livro dos Espíritos
(questão 132), a encarnação tem como finalidade principal o aperfeiçoamento do
ser.
Nesse plano, o Espírito encontra as condições
necessárias para reparar equívocos do passado e desenvolver virtudes,
enfrentando provas e expiações que lhe são úteis à sua elevação.
2. O
Mundo Espiritual: A Verdadeira Pátria do Espírito
O mundo espiritual, por sua vez, é o plano de
existência natural do Espírito. Como afirma Kardec em O Céu e o Inferno
(Primeira Parte, cap. II), o Espírito é o ser essencial, e a vida corpórea é
transitória. O retorno à vida espiritual após a desencarnação é um despertar da
consciência para a continuidade da vida e das responsabilidades adquiridas.
No mundo espiritual, o Espírito conserva sua
individualidade, suas lembranças e o resultado de suas conquistas morais. Ali
ele encontra Espíritos afins, instrutores e benfeitores que o auxiliam no
preparo para futuras reencarnações.
3. A Interação: A Influência
Recíproca Entre os Planos
Uma das revelações mais consoladoras e profundas do
Espiritismo é o ensinamento de que os mundos material e espiritual se
interpenetram e influenciam mutuamente. Como destaca O Livro dos Médiuns
(cap. II), os Espíritos estão em toda parte, observam, influenciam e participam
da vida humana, muitas vezes sem serem percebidos.
Essa interação se manifesta de várias formas:
- Inspirações e intuições
oriundas dos Espíritos protetores;
- Manifestações mediúnicas
variadas, como visões, audições e comunicações escritas;
- Influência mental e moral,
que pode ser benéfica ou perturbadora, dependendo da afinidade vibratória entre
os encarnados e os desencarnados.
O Espiritismo nos alerta, com base em observações
criteriosas, para a importância do discernimento e da elevação moral, pois os
Espíritos inferiores podem exercer influência negativa sobre os pensamentos
humanos (O Livro dos Espíritos, questões 459 e 467).
Além disso, o Espírito São Vicente de Paula nos lembra, na questão 888-a
de O Livro dos Espíritos, que:
“Não olvideis jamais que o Espírito, qualquer
que seja o seu grau de adiantamento, sua situação como reencarnado ou na
erraticidade, está sempre colocado entre um superior que o guia e aperfeiçoa e
um inferior perante o qual tem deveres iguais a cumprir.”
Essa afirmativa reforça a noção de uma ação
incessante e mútua entre os Espíritos em diferentes níveis de progresso —
encarnados ou desencarnados — promovendo a evolução coletiva e solidária do ser
imortal e do meio onde ele atua.
FUNDAMENTOS QUE REGULAM ESSA
INTERAÇÃO
A Lei de
Causa e Efeito
A lei de causa e efeito, apresentada com clareza
por Kardec em A Gênese (cap. XI), estabelece que tudo o que o Espírito
semeia em termos de pensamento, palavra ou ação retorna a ele como consequência
natural. Essa lei divina regula tanto os acontecimentos da vida presente quanto
as condições futuras do Espírito, inclusive nas suas reencarnações.
O sofrimento ou a alegria vivenciados, no plano
material ou espiritual, têm suas raízes nas escolhas do passado. Mas essa mesma
lei, longe de ser punitiva, é instrumento de justiça e regeneração.
A
Reencarnação como Mecânica da Evolução
A reencarnação é o processo pelo qual o Espírito
retorna ao mundo corporal para continuar sua trajetória evolutiva. Conforme
ensinado em O Livro dos Espíritos (questões 166 a 171), cada existência
corporal é uma oportunidade de reparação e progresso.
Por meio das múltiplas encarnações, o Espírito
adquire experiências, desenvolve habilidades, e burila suas imperfeições
morais, aproximando-se gradualmente da perfeição.
A reencarnação também explica as aparentes
desigualdades da vida e reafirma a justiça divina, como detalhado em O
Evangelho segundo o Espiritismo (cap. V – Bem-aventurados os aflitos).
UMA JORNADA DE TRANSFORMAÇÃO
INTERIOR
A interação entre os dois mundos não é um simples
intercâmbio de informações ou fenômenos. Ela é, acima de tudo, um convite
constante à transformação íntima do ser, por meio da vivência do bem, da
superação do egoísmo e do cultivo das virtudes.
A verdadeira preparação para a vida espiritual não
está apenas no conhecimento teórico, mas na prática diária do amor ao próximo,
na caridade, na humildade e no perdão. Essa renovação moral é o caminho para
alcançar a paz interior e elevar-se a esferas espirituais mais felizes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Doutrina Espírita, fundamentada no controle
universal do ensino dos Espíritos, oferece uma visão clara e lógica da
realidade espiritual. Ensina que o mundo espiritual não é uma abstração
distante, mas uma dimensão viva, que interage com o mundo físico e participa da
vida cotidiana da humanidade.
Compreender essa interação nos desperta para a
responsabilidade de nossas ações e nos consola com a certeza de que não estamos
sozinhos. Somos sempre assistidos por Espíritos amigos, e cada esforço de
melhoria é acompanhado por forças maiores.
A imortalidade da alma, a justiça das reencarnações
e a influência dos Espíritos são verdades acessíveis à razão e à experiência,
conforme demonstrado por Kardec em todas as obras fundamentais e na Revista
Espírita, cuja riqueza de observações e estudos continua a iluminar
consciências até hoje.
“O Espiritismo é, ao mesmo tempo, uma ciência de
observação e uma doutrina filosófica.” (Allan Kardec – O que é o
Espiritismo, Preâmbulo)
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. FEB.
KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. FEB.
KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno. FEB.
KARDEC, Allan. A Gênese. FEB.
KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. FEB.
KARDEC, Allan. Obras Póstumas. FEB.
KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858–1869).
DENIS, Léon. Depois da Morte. FEB.
DENIS, Léon. O Problema do Ser, do Destino e da Dor. FEB.
BOZZANO, Ernesto. Os Fenômenos de Bilocação. FEB.
FLAMMARION, Camille. A Morte e o Seu Mistério. FEB.
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