Na casa da minha tia havia um
vaso com um exuberante brinco-de-princesa. Suas flores delicadas e pendentes
sempre me encantaram. Em meu aniversário, ganhei dela um exemplar da planta.
Pendurei-o na sacada e, por um tempo, admirei suas flores com entusiasmo. Mas,
com a correria da vida, fui negligente: regava quando lembrava, não podava, nem
adubava.
Meses depois, levei um choque ao ver a planta quase morta. Restava apenas um galhinho com algumas folhas verdes.
Liguei para minha tia, aflita. Ela me ouviu com atenção e disse:
— Você pode salvá-la, mas terá que se empenhar. Ela está morrendo por falta de cuidado, atenção e amor. Se der isso a ela, ela vai renascer.
Com paciência, orientou-me: cortar os galhos vivos, colocá-los na água limpa, trocar a água todos os dias, esperar as raízes brotarem, depois replantar em terra adubada, regar com constância e deixar na luz indireta. Anotei tudo, entre arrependida e esperançosa.
Segui cada passo. Sem perceber, o tempo passou. Um ano depois, o vaso estava verde, cheio de vida. E então, os botões floresceram. O brinco-de-princesa havia renascido — mais belo do que nunca.
Chamei minha tia para ver. Ela me abraçou e disse:
— Esse renascimento é um símbolo da alma humana. Precisamos podar os galhos secos, que são nossos defeitos; mudar os pensamentos, que são nossas raízes; plantar no vaso da fé, regar com amor, viver sob a luz do Cristo.
Em silêncio, compreendi: todos podemos recomeçar. E todos podemos ajudar o outro a florescer, sendo jardineiros da alma — com paciência, cuidado e compaixão.
Uma Leitura Espírita da Narrativa
Em uma singela narrativa sobre o cultivo de um brinco-de-princesa, somos conduzidos a refletir, à luz da Doutrina Espírita, sobre a trajetória da alma humana. Embora muitas vezes negligenciada ou descuidada, jamais está irremediavelmente perdida. Há sempre a possibilidade de recomeço, desde que haja vontade sincera, amor e perseverança.
Assim como uma planta murcha por falta de cuidado, o Espírito pode se enfraquecer quando se afasta de suas raízes divinas e da luz que o sustenta. Mas, como ensina o Espiritismo, ninguém está condenado à estagnação moral — todos fomos criados para progredir e florescer.
1. Negligência Espiritual: O Esquecimento de Si
A planta murcha representa muitas almas que, consumidas pelas exigências da vida material, esquecem de nutrir sua vida interior.
A Doutrina Espírita ensina que o mal persiste mais por falta de vontade do que por impossibilidade. Em O Livro dos Espíritos, Kardec pergunta se o homem pode vencer suas más inclinações. Os Espíritos respondem:
“Sim, e frequentemente fazendo esforços muito insignificantes. O que lhe falta é a vontade.” (LE, q. 909)
Bastaria um pouco mais de atenção, reflexão e oração para evitar o ressecamento moral que afasta o Espírito do seu destino evolutivo.
2. A Capacidade de Regeneração Moral
Ao perceber que ainda restava um galho vivo, renasce a esperança. Esse pequeno sobrevivente simboliza aquilo que nunca se perde em nós: o potencial do bem.
Mesmo abatido, o Espírito conserva em si sementes de renovação, pois a alma está destinada a progredir. Os Espíritos Superiores afirmam:
“A marcha do progresso é uma consequência da natureza humana.” (LE, q. 776)
A regeneração é sempre possível, desde que o Espírito se abra à renovação com humildade, esforço e fé.
3. Cuidado Amoroso: A Verdadeira Caridade
A tia que, com ternura e paciência, orienta o processo de recuperação da planta encarna o verdadeiro espírito da caridade.
No Evangelho segundo o Espiritismo, aprendemos que a caridade vai além da esmola: é amparo moral, incentivo silencioso, instrução generosa. Ela não faz pelo outro — ensina a fazer, com confiança no potencial de regeneração de cada alma.
4. Cortar os Galhos Secos: A Transformação Íntima
Podar os galhos secos é metáfora clara da transformação íntima, essencial na Doutrina Espírita. É preciso remover o que impede o crescimento da alma: orgulho, egoísmo, ressentimento, vaidade, impaciência...
“Conhece-te a ti mesmo.” (LE, q. 919, comentário de Santo Agostinho)
A transformação íntima é trabalho constante — feito de pequenas conquistas sobre si — mas indispensável à plenitude do Espírito.
5. Luz, Água e Terra: Símbolos do Evangelho Vivo
A planta renasce com luz, água limpa e terra fértil. Esses elementos traduzem os nutrientes espirituais que sustentam nossa alma:
- Luz
indireta: representa a iluminação moral progressiva, que
orienta sem ferir;
- Água
limpa: simboliza os bons sentimentos, atitudes
constantes e purificadoras;
- Terra adubada: imagem do coração receptivo ao Evangelho, como o solo fértil da parábola do semeador (Mt 13:8).
Viver o Evangelho é regar a alma com amor, sob a luz da verdade e no solo da boa vontade.
6. O Espírito é como a Planta: Perfectível por Natureza
Ao fim, a planta revigorada torna-se símbolo da alma regenerada. Como disse a tia:
“Todos podemos nos recuperar, desde que tenhamos uma boa terra, uma boa
rega, a luz do amor e a vontade de prosseguir nos passos de nosso Mestre
Amado.”
Essa mensagem é profundamente espírita. O Espírito é criado simples e ignorante, mas destinado à perfeição. (A Gênese, cap. III)
Não importa o quanto nos afastamos de nós mesmos, de Deus ou do próximo — sempre é possível recomeçar, com amor, humildade e fé.
Conclusão: Jardineiros da Alma
Essa narrativa nos convida a uma reflexão íntima e consoladora:
- Temos
cuidado da nossa alma com a atenção que ela merece?
- Temos
ajudado outros corações a florescer?
- Sabemos ver, além da aparência seca, o potencial de vida que ainda pulsa?
O Espiritismo nos lembra que todo Espírito pode florescer. Para isso, são necessários:
- vontade firme, esforço sincero e o apoio compassivo de jardineiros do bem — que, como a tia, sabem instruir sem humilhar, cuidar sem dominar, amar sem exigir.
Que saibamos cultivar em nós e no próximo o Evangelho vivo, com a água da esperança, a luz da fé e o adubo do amor. Assim, floresceremos, cada qual a seu tempo, sob os cuidados do Divino Jardineiro — que é Jesus.
Referências DoutrináriasKARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Questões 190, 776, 909 e 919.
KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Capítulos VI ("O Cristo Consolador")
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