Por que, no mundo, a
influência dos maus frequentemente sobrepuja a dos bons?
Essa
questão, formulada por Allan Kardec na questão 932 de O Livro dos
Espíritos, recebeu uma resposta direta e desconcertante dos Espíritos
Superiores:
“Por fraqueza destes. Os
maus são intrigantes e audaciosos, os bons são tímidos. Quando estes o
quiserem, preponderarão.”
Esse
alerta moral, claro e profundo, nos convida a refletir sobre o papel ativo e
transformador do homem de bem na sociedade. O Espiritismo, quando bem
compreendido e vivido, não é doutrina de isolamento ou passividade, mas de ação
responsável, esclarecida e solidária. O bem precisa ser ativo, operante,
corajoso. Se os que desejam o bem se omitem, abrem espaço para que o mal,
ousado e barulhento, dite os rumos da sociedade.
O Espiritismo e a Transformação Social
A
Doutrina Espírita possui uma dimensão ética e social clara. Os princípios
contidos em O Livro dos Espíritos — quando aplicados aos costumes, às
instituições e às relações humanas — têm poder para transformar os hábitos,
influenciar estruturas sociais e renovar o funcionamento das comunidades
humanas com base na justiça, no amor e na verdade.
Como
afirmam os Espíritos na questão 917:
“Quando bem
compreendido, se houver identificado com os costumes e as crenças, o
Espiritismo transformará os hábitos, os usos, as relações sociais.”
Isso
significa que o Espiritismo oferece ao mundo uma contribuição filosófico-política
no sentido mais elevado do termo: colaborar para que a sociedade se organize
conforme as Leis Divinas, com justiça distributiva, solidariedade, fraternidade
e respeito à dignidade de todos.
Felicidade na Terra: um Compromisso Coletivo
Ao
tratar da possibilidade de felicidade na Terra, Kardec pergunta, na questão
922, se há alguma soma de felicidade comum a todos os homens. A resposta
espiritual é simples, mas profunda:
“Com relação à vida
material, é a posse do necessário. Com relação à vida moral, a consciência
tranquila e a fé no futuro.”
Essa
síntese traduz uma diretriz para a ação espírita: lutar para que todos tenham o
necessário à vida física (alimento, vestuário, moradia, saúde, educação), e, ao
mesmo tempo, cultivar em si e nos outros a paz da consciência e a confiança na
imortalidade.
A
Doutrina Espírita amplia esse entendimento ao afirmar, na questão 927,
que:
“Verdadeiramente infeliz
o homem só o é quando sofre da falta do necessário à vida e à saúde do corpo.”
Portanto,
o espírita consciente deve atuar socialmente, não apenas em ações assistenciais
isoladas, mas também influenciando as estruturas sociais para que assegurem o
mínimo necessário a todos. É ação política no sentido mais nobre: promover o
bem comum, contribuir para uma sociedade justa e fraterna.
Uma Sociedade segundo a Lei do Cristo
Na questão
930, os Espíritos advertem:
“Numa sociedade
organizada segundo a lei do Cristo, ninguém deve morrer de fome.”
A
pobreza extrema e a miséria material, segundo os princípios da Doutrina, não
são desígnios de Deus, mas resultado das falhas humanas — especialmente da má
organização social, do egoísmo e da indiferença.
Kardec,
em comentário esclarecedor, observa que numa sociedade justa, “ao homem só
por sua culpa pode faltar o necessário”, e mesmo essa culpa, em muitos
casos, é consequência do meio onde ele foi colocado.
Logo,
a missão do espírita não se resume à transformação íntima pessoal — ela se
estende à reforma do mundo em que vive. O verdadeiro espírita busca melhorar a si
mesmo para melhor servir, e isso inclui transformar, com amor e coragem,
o meio social em que está inserido.
Política: Expressão Coletiva do Amor
O
Espírito Lázaro, em O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. IX, item 8,
afirma:
“Cada época é, assim,
marcada pelo cunho da virtude ou do vício que a devem salvar ou perder. A
virtude da vossa geração é a atividade intelectual, seu vício é a indiferença
moral.”
A
indiferença moral é uma forma disfarçada de conivência com o mal. O espírita,
enquanto cidadão do mundo, não pode se omitir. É chamado a agir — com
discernimento, humildade e firmeza — para que as instituições sociais,
políticas e econômicas reflitam os princípios da caridade e da fraternidade.
Amar é
querer o bem do outro. Fazer política, sob esse enfoque, é trabalhar pelo bem
de todos. A expressão política do amor é a busca do bem comum. Portanto,
participar da vida pública — com ética, espiritualidade e responsabilidade —
é um dever do espírita.
O Exemplo que Transforma
Na
mesma questão 917, os Espíritos concluem:
“Sirva de base às
instituições sociais, às relações legais de povo a povo e de homem a homem o
princípio da caridade e da fraternidade e cada um pensará menos na sua pessoa,
assim veja que outros nela pensaram. Todos experimentarão a influência
moralizadora do exemplo e do contato.”
Essa
influência moralizadora começa com o exemplo pessoal, mas não deve terminar aí.
O espírita deve se engajar na construção de uma sociedade que assegure, para
todos, dignidade, liberdade, equidade e solidariedade.
A
omissão dos bons fortalece os maus. É hora de deixar a timidez e o silêncio, e
fazer com que os valores da justiça, da caridade e da verdade ecoem em todas as
áreas da vida social.
Conclusão: o Bem Precisa de Voz e Ação
O
Espiritismo não é apenas consolo — é também proposta de transformação. Ensina
que a transformação íntima e a reforma social não se excluem, mas se completam.
Quem compreende e vive os princípios da Doutrina tem o dever de agir no mundo,
em favor de um futuro mais justo, fraterno e espiritualizado.
Não
basta desejar o bem: é preciso agir em nome dele.
Referências
doutrinárias:
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Espíritos. Questões 917, 922, 927, 930, 932.
- KARDEC, Allan. O
Evangelho segundo o Espiritismo. Cap. IX, item 8.
- NOVAES, Albino A.
C. de. “A Política e a Ação Social Espírita”.
- Federação Espírita
Brasileira. Edição digital.
- momento.com.br — textos
doutrinários de apoio.
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