Introdução
Vivemos um tempo em que a informação circula com
velocidade sem precedentes, mas paradoxalmente cresce a tendência de evitar
conversas profundas sobre temas essenciais. Política, questões sociais,
economia, ética, ciência e espiritualidade são frequentemente deixadas de lado
nas rodas de conversa, como se o simples ato de refletir sobre eles fosse um
fardo.
Essa postura, que poderíamos chamar de opção
pela ignorância, não se restringe ao mundo secular. Ela também se manifesta
no meio espírita, quando há preferência por conteúdos de puro entretenimento em
detrimento do estudo sério e metódico. Sob a ótica da Doutrina Espírita, essa
escolha consciente ou inconsciente afasta-nos da lei natural de progresso, que
Kardec apresenta na Questão 780 de O Livro dos Espíritos:
“O
progresso é uma lei da Natureza. O homem não pode opor-se indefinidamente ao
progresso; é uma força viva que o arrasta e aqueles que tentam detê-lo são
esmagados por ele.”
Ignorar a realidade pode parecer, à primeira vista,
um alívio contra as dores do mundo. No entanto, essa fuga nos impede de
compreender nosso papel e de agir para a transformação de nós mesmos e da sociedade.
1.
Alienação: refúgio ou prisão?
O afastamento das discussões mais sérias é, muitas
vezes, resultado da sensação de impotência diante de um cenário instável. Para
alguns, “não saber” parece diminuir a ansiedade e o sofrimento. Contudo, a
Doutrina Espírita nos ensina que a responsabilidade moral é inseparável da
liberdade de escolha.
Na Questão 466 de O Livro dos Espíritos,
aprendemos que somos influenciados constantemente, mas temos o poder de
discernir e decidir. Quando abrimos mão dessa faculdade, entregamo-nos à
condução de interesses externos — sejam materiais ou espirituais — e retardamos
nossa própria evolução.
2. A
superficialidade no movimento espírita
No meio espírita, percebe-se uma tendência de
priorizar obras romanceadas ou leituras de cunho místico, deixando para segundo
plano os estudos doutrinários, científicos e filosóficos. Isso cria um
“espiritismo superficial”, pouco preparado para oferecer respostas lúcidas aos desafios
morais e intelectuais de nossa época.
Kardec, no Livro dos Médiuns (item 230),
enfatiza:
“A
melhor garantia contra a mistificação é o estudo prévio e aprofundado da
teoria.”
Estudar é fortalecer a fé com raciocínio, base
essencial para evitar ilusões e cumprir a missão esclarecedora que o
Espiritismo propõe.
3.
Ignorância e manutenção das desigualdades
A alienação não é neutra: ela alimenta estruturas
injustas. Quando as massas se afastam da reflexão e da ação, favorecem que
poucos decidam por muitos, perpetuando privilégios e desigualdades.
Na Questão 132 de O Livro dos Espíritos,
vemos que o objetivo da encarnação é “atingir a perfeição”, o que inclui
participação ativa na vida coletiva. Na Lei de Sociedade (LE,
questões 766–774), compreendemos que o progresso individual está ligado ao
progresso do conjunto.
Abster-se é, de certo modo, colaborar com o atraso
— e atrasar a regeneração que tanto buscamos para o planeta.
4. O
chamado à consciência
A história humana prova que são as minorias
conscientes que provocam as grandes transformações. No plano espiritual, isso
corresponde ao trabalho de Espíritos e encarnados mais esclarecidos, que
inspiram e impulsionam o avanço moral.
Em Caminho, Verdade e Vida (cap. 2),
Emmanuel afirma:
“Não
é lícito desertar da luta pela melhoria geral, porque a obra de Deus nos
reclama em toda parte.”
Romper com a opção pela ignorância é,
portanto, um ato de coragem e de fidelidade à lei de progresso.
Conclusão
A ignorância deliberada pode parecer um abrigo
contra as dores do mundo, mas é, na verdade, uma prisão que nos afasta da luz.
O Espiritismo nos convida a encarar a realidade com lucidez, a cultivar o saber
aliado à moral e a agir em favor do bem comum.
Estamos todos inseridos num “imenso condomínio” — o
Universo —, no qual nossas escolhas individuais influenciam o conjunto. Fugir
dessa responsabilidade é atrasar não apenas a nossa felicidade, mas a de toda a
coletividade.
A saída está na educação integral do ser:
intelectual, moral e espiritual. Assim, deixamos de ser espectadores e nos
tornamos cooperadores conscientes da obra divina.
Referências
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB.
- KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB.
- KARDEC, Allan. A Gênese. Tradução de Guillon Ribeiro. FEB.
- XAVIER, Francisco Cândido, pelo Espírito Emmanuel. Caminho, Verdade e Vida. FEB.
- SANTOS, Paulo R. A Opção pela Ignorância.
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