Introdução
A sociedade contemporânea vive sob o predomínio do
materialismo, estruturada em torno da lógica do mercado, do consumo e da
concentração de riquezas. O homem, reduzido muitas vezes a mero instrumento de
produção, perde de vista sua essência espiritual, alienando-se de si mesmo e do
próximo. A luta incessante pelo poder e pela posse gera desigualdades, crises e
sofrimentos, pois, como já advertia Allan Kardec, "o egoísmo é a chaga da humanidade" (O Evangelho
Segundo o Espiritismo, cap. XI).
O texto em análise nos convida a refletir sobre o
papel do livre-arbítrio e da responsabilidade moral na construção de uma
sociedade mais justa e solidária. A Doutrina Espírita, em sua visão ampla e
racional, ilumina os dilemas sociais e éticos do presente, apontando que o
progresso material, embora necessário, deve estar subordinado ao progresso
moral, para que o homem encontre sua verdadeira finalidade: o aperfeiçoamento
do Espírito imortal.
O
Materialismo e a Alienação do Ser Humano
A atual estrutura econômica, baseada no hedonismo e
no consumismo, transforma o trabalho humano em mercadoria e coloca a riqueza
acima da dignidade da vida. Este quadro se aproxima das análises feitas por
Kardec na Revista Espírita (abril de 1866), quando advertiu que a
sociedade colhe os frutos de suas próprias paixões desordenadas, e que os
abusos das instituições humanas só podem gerar sofrimentos e crises, como
lições corretivas da Lei Divina.
O materialismo, ao negar a vida espiritual, cria um
vazio moral. O homem passa a buscar apenas o prazer imediato, como afirmado na
filosofia hedonista, esquecendo-se de que a vida é apenas um capítulo da longa
jornada evolutiva do Espírito. Kardec, em O Livro dos Espíritos, questão
943, ensina que “a causa do desgosto da
vida, mesmo no seio da abundância, é a saciedade. Aquele que se baseia apenas
nos bens materiais está condenado à eterna insatisfação.”
Livre-Arbítrio,
Lei de Causa e Efeito e Responsabilidade Social
Apesar das influências sociais e externas, o
Espírito conserva sempre a faculdade de discernir entre o bem e o mal. Na
questão 544 de O Livro dos Espíritos, os Espíritos superiores afirmam
que o homem pode sofrer sugestões exteriores, mas é livre para escolher o rumo
de sua conduta, respondendo por suas ações perante a Lei de Causalidade.
Essa liberdade, contudo, não é absoluta, mas
relativa ao grau de progresso espiritual de cada um. Assim, governantes,
empresários, legisladores e dirigentes, ao utilizarem seu poder em favor do
egoísmo, assumem graves responsabilidades espirituais, pois suas escolhas
afetam a coletividade. Como diz a questão 780 da mesma obra, o progresso
intelectual aumenta a responsabilidade do homem por seus atos, e se não for
acompanhado do progresso moral, torna-se fonte de desigualdades e injustiças.
A Doutrina Espírita deixa claro que o
livre-arbítrio não é apenas uma concessão individual, mas também um dever
coletivo: nossas escolhas repercutem no equilíbrio social, e a solidariedade
deve ser o princípio norteador da vida em sociedade.
O Orgulho
e o Egoísmo: Obstáculos à Regeneração
Os Espíritos superiores identificam o orgulho e o
egoísmo como as duas maiores chagas da humanidade (O Livro dos Espíritos,
questão 785). Estes sentimentos, exacerbados pela cultura materialista, geram
indiferença ao sofrimento alheio, desigualdade social e corrupção.
A sociedade hedonista e consumista, que privilegia
a aparência e o poder, distancia-se da fraternidade, levando os homens a
glorificar os vencedores, mesmo que desonestos, e a desprezar os vencidos,
ainda que justos. Tal postura revela o quanto ainda nos encontramos na infância
espiritual, guiados mais pelo instinto do que pela razão iluminada pela
moralidade.
O Papel
do Espiritismo na Transformação Social
O Espiritismo surge como luz a esclarecer a razão e
o coração, relembrando ao homem sua condição de Espírito imortal e sua
responsabilidade perante as leis divinas. Kardec, na Revista Espírita
(dezembro de 1868), destaca que a transformação da sociedade só pode ser
duradoura quando se fundamenta na regeneração moral do indivíduo.
A Doutrina Espírita propõe, portanto, uma ética
racional e universal, baseada na lei de amor, como chave para superar o egoísmo
e construir uma sociedade mais justa. Como ensina a questão 888-a de O Livro
dos Espíritos: “Amai-vos uns aos outros,
eis toda a lei. O amor é a lei de atração para os seres vivos e organizados, e
a atração é a lei de amor para a matéria inorgânica.”
Conclusão
Vivemos tempos de transição, em que as estruturas
sociais baseadas no egoísmo mostram sinais de falência. As dores e crises que
testemunhamos são convites à renovação moral, ao despertar da consciência e à
vivência do amor e da fraternidade.
O livre-arbítrio, exercido com responsabilidade,
permite-nos optar entre a continuidade da alienação materialista ou a construção
de uma nova civilização, fundada nos valores do Espírito. Como ensinou Jesus: “Bem-aventurados os que têm fome e sede de
justiça, porque serão saciados” (Mateus 5:6).
A tarefa é árdua, mas é também o caminho para que a
humanidade adentre, enfim, a era da regeneração.
Referências
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. FEB.
- KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. FEB.
- KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858-1869).
- MEIRA, Rubens. A questão social e o livre-arbítrio.
- Obras subsidiárias e complementares da Doutrina Espírita.
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