Introdução
A parábola do filho pródigo, narrada por Jesus e
comentada em O Evangelho segundo o Espiritismo, é um manancial de
ensinamentos para compreender a misericórdia divina e, ao mesmo tempo, refletir
sobre a missão dos pais terrenos. Este artigo propõe uma leitura simbólica
dessa parábola, comparando o retorno do filho arrependido à festa da
reencarnação, oportunidade que Deus concede para que o Espírito cresça, aprenda
e se aperfeiçoe.
Se o Pai Celestial concede liberdade, respeito ao
livre-arbítrio e acolhimento incondicional, os pais humanos, muitas vezes, agem
de forma diversa: tutelam em excesso, retardam a independência ou limitam-se a
transferir bens materiais, esquecendo-se da verdadeira herança espiritual — o
amor, a educação moral e a formação para a vida.
A Doutrina Espírita ensina que a paternidade e a
maternidade são missões sagradas confiadas pela Providência, com implicações
profundas para o destino dos filhos e para o futuro da humanidade.
A Missão
dos Pais segundo o Espiritismo
Em O Livro dos Espíritos (questões 582 e
583), Kardec indaga sobre a missão dos pais. Os Espíritos respondem que
paternidade e maternidade são deveres de alta responsabilidade, pois Deus
confia os filhos aos pais como tarefa e prova. Cabe a estes orientar a criança
para o bem, desenvolver suas potencialidades, corrigir suas más tendências e
auxiliá-la em sua caminhada evolutiva.
Na Revista Espírita (setembro de 1863, “A
família espírita”), Kardec reforça que a família não é fruto do acaso, mas uma
escola moral. Nela, Espíritos, muitas vezes unidos por débitos e compromissos
do passado, reencontram-se para reparar falhas, fortalecer laços e aprender a
amar. Negligenciar essa missão é falhar com a lei divina.
Assim, enquanto o Pai da parábola oferece liberdade
ao filho para crescer por meio da experiência, muitos pais terrenos negam aos
filhos a oportunidade de amadurecer, seja pelo excesso de tutela, seja pela omissão.
O resultado é a formação de gerações despreparadas, frágeis diante das provas e
presas fáceis das ilusões do mundo.
Violência
Silenciosa: a Negligência Educativa
A violência não se resume ao crime que assola as
ruas. Existe também a violência silenciosa, cometida sob o amparo da lei
humana: a negligência educativa. Muitos pais oferecem roupas, conforto material
e educação escolar, mas negam aquilo que é mais essencial: amor, orientação
moral, limites justos e exemplos de retidão.
Do ponto de vista espírita, essa omissão constitui
grave violência contra a esperança e contra a oportunidade de evolução do
Espírito reencarnado. Léon Denis, em O Problema do Ser e do Destino,
ressalta que a verdadeira educação deve ser integral, unindo ciência, moral e
espiritualidade. Preparar um filho apenas para o sucesso material é deixá-lo
vulnerável à queda moral e ao vazio existencial.
O Filho
Pródigo e a Reencarnação
A parábola do filho pródigo pode ser vista como uma
representação da lei de reencarnação. O filho que parte simboliza o Espírito
que se afasta do Pai em busca da experiência terrena; o retorno, por sua vez,
expressa o arrependimento e o desejo de recomeçar.
Cada nova encarnação é, portanto, uma “festa do
retorno”: o Espírito regressa à escola da vida para corrigir-se, experimentar,
aprender e amadurecer. Nesse processo, os pais são colaboradores de Deus,
auxiliando no desenvolvimento moral e intelectual dos filhos. É seu dever
favorecer a autonomia progressiva, sem abdicar da responsabilidade educativa
que dá estrutura e direção à liberdade.
Responsabilidade
Pessoal e Coletiva
Quando pensamos em violência, logo lembramos dos
grandes crimes que chocam a sociedade. Contudo, a Doutrina Espírita nos alerta
que a verdadeira violência nasce nas pequenas atitudes: no orgulho que humilha,
no egoísmo que explora, na indiferença que abandona.
Assim como os pais têm deveres para com os filhos,
cada Espírito tem responsabilidade diante da vida. Ao reencarnar, recebemos “o
quinhão do Pai”: o corpo físico, a inteligência, o tempo e os recursos da
natureza. Usá-los mal, por ignorância ou descuido, é desperdiçar os bens
divinos — tornando-nos, ainda, filhos pródigos que não aprenderam a administrar
a herança recebida.
Conclusão
A parábola do filho pródigo, vista à luz do
Espiritismo, convida-nos a refletir tanto sobre a missão dos pais quanto sobre
nossa própria responsabilidade como filhos da vida. Educar não é apenas prover sustento
ou transmitir patrimônio; é, sobretudo, formar consciências para o bem,
orientar pelo exemplo, corrigir com amor e preparar para a liberdade.
Quando os pais cumprem sua missão, colaboram com
Deus na grande obra da regeneração humana. Quando falham, alimentam a violência
silenciosa que corrói os alicerces da sociedade.
Que cada lar se converta em uma escola de almas,
onde a maior herança seja o amor e a educação moral. Assim, estaremos todos nos
preparando, como filhos pródigos, para o reencontro jubiloso com o Pai
Celestial, que sempre nos aguarda de braços abertos.
Referências
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 1857.
- KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. 1864.
- KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858-1869). Diversos
artigos.
- DENIS, Léon. O Problema do Ser e do Destino.
- XAVIER, Francisco Cândido. O Consolador. Pelo Espírito
Emmanuel.
- PEREIRA, Yvonne A. Seareiros de Volta.
- SERRANO, Octávio Caúmo. A Violência e a Lei.
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