Introdução
A natureza, em sua diversidade organizada nos
reinos mineral, vegetal, animal e hominal, revela-nos um espetáculo contínuo de
evolução. Este artigo propõe uma reflexão sobre essa trajetória, que se inicia
no equilíbrio atômico e alcança a inteligência humana em busca da convivência
harmônica. Mas a questão central permanece: a evolução cessa no homem físico
ou prossegue além da matéria?
A Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec a
partir de 1857, ilumina essa questão. Mostra que a marcha da evolução não se
limita ao desenvolvimento biológico, mas se estende à dimensão espiritual,
orientando o destino da humanidade rumo à perfeição moral e intelectual.
A
Natureza como Escola da Alma
Segundo O Livro dos Espíritos (questões 540
a 585), todos os reinos da natureza cumprem papel essencial no progresso
universal, desde os elementos minerais, que revelam as primeiras formas de
organização, até o homem, ser dotado de razão e livre-arbítrio.
Na questão 540, os Espíritos superiores ensinam que
“tudo se encadeia na natureza, desde o átomo primitivo até o arcanjo, que
também começou por ser átomo”. Essa afirmativa sintetiza a lei de
solidariedade universal: não há saltos nem interrupções na obra da Criação, mas
uma continuidade harmônica em que cada estágio prepara o seguinte. O mineral, o
vegetal, o animal e o hominal não são compartimentos isolados, mas degraus
sucessivos de uma mesma escada de aprendizado, em que a matéria e o Espírito se
interpenetram em função do progresso.
A observação do átomo, com seu núcleo e seus
elétrons em permanente movimento, já nos revela o equilíbrio e a harmonia que
sustentam a criação divina. No reino vegetal, surgem os primeiros sinais do
instinto, manifestos na sensibilidade e nas reações diante de estímulos. No
animal, esse instinto se refina e aproxima-se da inteligência, preparando o
caminho para o desenvolvimento da razão. No homem, inteligência e moralidade
despontam, mas em graus desiguais: encontramos desde o selvagem, ainda preso às
necessidades mais elementares, até o cientista que explora os espaços cósmicos
em busca de novos horizontes.
A Doutrina Espírita explica que essa diversidade
resulta do progresso do Espírito imortal, que evolui através das reencarnações,
utilizando os diferentes reinos e estágios como escolas de aprendizado. Assim,
a natureza inteira se apresenta como um vasto educandário da alma, em
que o Espírito, passo a passo, desenvolve suas faculdades e ascende da
simplicidade inicial à plenitude da consciência.
Do
Instinto à Inteligência: O Espírito em Construção
A história humana — da luta primitiva pela
sobrevivência à convivência baseada no debate — reflete o que Allan Kardec
denominou lei do progresso (O Livro dos Espíritos, questões 776 a
785).
- Na luta, predomina o instinto, em que o mais forte
prevalece.
- No jogo, surge a consciência da coexistência, mas
ainda marcada por interesses egoísticos.
- No debate, manifesta-se a inteligência em sua expressão
mais elevada, buscando consenso e harmonia, abrindo caminho para a
fraternidade.
Esse movimento corresponde ao que a Revista
Espírita (1863, “A perfectibilidade da alma humana”) chama de “a marcha
lenta, mas segura, do Espírito rumo à perfeição”.
A
Evolução para Além do Homem Físico
A ciência moderna, ao explorar vibrações e novas
dimensões, aproxima-se da metafísica. Essa visão encontra eco no Espiritismo,
que desde o século XIX já afirmava que a existência não se limita ao mundo
material, mas se estende ao espiritual.
Na obra A Gênese, Kardec demonstra que a
evolução humana não se encerra no corpo físico: o Espírito, ao conquistar
conhecimento e virtudes, transcende as limitações da matéria e avança para
estágios superiores de vida. Assim, o reino hominal não representa o fim da jornada,
mas uma ponte entre a animalidade e a espiritualidade consciente.
O Debate
como Caminho para a Fraternidade
A transição da luta para o debate simboliza a
superação do egoísmo e do orgulho, que são, segundo Kardec (O Evangelho
segundo o Espiritismo, cap. IX), as maiores chagas da humanidade. A
instalação da mentalidade do debate equivale ao esforço individual e
coletivo pela prática da caridade moral, da verdade e do respeito.
Para o Espiritismo, a Humanidade só alcançará sua
plena regeneração quando a inteligência estiver a serviço do bem, e o diálogo
franco substituir a imposição da força ou o jogo de interesses. Esse é o rumo
do planeta em sua transição para um mundo de regeneração, como ensina A
Gênese, cap. XVIII.
Conclusão
O tema aqui abordado encontra profunda ressonância
na Doutrina Espírita. A marcha da evolução, da matéria ao Espírito, mostra que
o homem é, simultaneamente, sujeito e objeto das mudanças universais. Pela
luta, aprendeu a sobreviver; pelo jogo, a conviver; pelo debate, aprenderá a
fraternizar.
A lição é clara: não basta apenas desenvolver a
inteligência; é necessário orientá-la para o bem. O debate sincero, iluminado
pela verdade e pela caridade, constitui a expressão mais nobre do progresso
humano e espiritual.
Referências
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 1857.
- KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. 1864.
- KARDEC, Allan. A Gênese. 1868.
- KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858-1869). Diversos
artigos.
- REIS, César. A viagem do instinto.
- DENIS, Léon. O Problema do Ser e do Destino.
- XAVIER, Francisco Cândido. O Consolador. Pelo Espírito
Emmanuel.
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