sexta-feira, 8 de agosto de 2025

FÉ RACIOCINADA: A FORÇA ATIVA
QUE UNE RAZÃO, ESPERANÇA E AÇÃO
- A Era do Espírito -
 

Introdução

Na Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec, a fé não é um sentimento passivo ou cego. É antes uma força ativa, sustentada pela razão, pela compreensão e pela ação consciente. Diferentemente da fé dogmática, que se apoia na aceitação acrítica de verdades impostas, a fé espírita se constrói a partir do entendimento, do livre-arbítrio e da experiência pessoal. Kardec sintetizou essa visão na célebre frase: “Fé inabalável é somente aquela que pode encarar a razão face a face, em todas as épocas da Humanidade” (ESE, cap. XIX).

Essa concepção encontra ressonância em pensadores como Erich Fromm, J. Herculano Pires e Jiddu Krishnamurti, que, cada qual a seu modo, destacam a importância da fé como fruto de um movimento interior, libertador e não submisso a sistemas cristalizados. O Espiritismo, ao propor a fé raciocinada, convida à maturidade espiritual, substituindo a crença imposta pelo discernimento conquistado.

A fé como força ativa e racional

Allan Kardec distingue claramente a fé raciocinada da fé cega. Enquanto a primeira se ancora no entendimento e na lógica, a segunda se rende à aceitação irrefletida, abrindo caminho para o fanatismo e para a fragilidade moral diante das crises. No Evangelho Segundo o Espiritismo (cap. XIX), ele ensina que a fé robusta é aquela que confere perseverança, energia e recursos para superar obstáculos, mantendo-se serena porque compreende as leis que regem a vida.

Erich Fromm, em A Revolução da Esperança, chama essa postura de “fé racional” — resultado da atividade interior, da reflexão e da experiência — em oposição à fé irracional, que é submissão a ideias impostas, verdadeiras ou não. Essa proximidade conceitual mostra que, embora partindo de horizontes diferentes, a psicologia humanista e a filosofia espírita se encontram no ponto essencial: a fé só é sólida quando nasce do entendimento.

Esperança ativa e coragem moral

A fé espírita não caminha sozinha: ela é inseparável da esperança. Mas não se trata de uma esperança passiva, que aguarda o milagre sem esforço. É, antes, a confiança dinâmica que impulsiona à ação persistente. Herculano Pires, em O Ser e a Serenidade, recorre à imagem dos “bons nadadores” que, em meio às ondas da História, salvam a si mesmos e ajudam outros a seguir adiante. Esses homens e mulheres de fé atuam para o bem, não se deixam deter pelo fracasso momentâneo e não buscam reconhecimento pessoal.

Essa visão está em harmonia com o Livro dos Espíritos, quando os Espíritos Superiores explicam que a verdadeira coragem está na perseverança e na aceitação ativa das provas, sempre buscando melhorar-se e servir ao próximo (LE, questões 644, 918).

Além dos dogmas: liberdade e responsabilidade espiritual

Kardec adverte que a fé religiosa baseada em dogmas particulares pode ser raciocinada ou cega, mas quando se apoia no erro está fadada a ruir. Ele afirma que a fé não pode ser prescrita nem imposta; é conquista pessoal e acessível a todos. Para crer verdadeiramente, é preciso compreender — e essa compreensão é o alicerce que liberta a alma da submissão cega e do preconceito.

Jiddu Krishnamurti, em sua crítica às organizações religiosas, reforça essa independência espiritual: “A Verdade é uma terra sem caminhos”. Ele alerta contra a cristalização da crença em sistemas fechados, lembrando que a compreensão é pessoal e intransferível, e que a fé viva exige movimento, renovação e liberdade.

O estudo sério como caminho da fé inabalável

O Espiritismo não é apenas um conjunto de princípios morais, mas também um campo de investigação racional da realidade espiritual. Kardec recomenda, na Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita, que a pesquisa seja feita com seriedade, perseverança e ausência de preconceito. A fé raciocinada se fortalece pelo estudo contínuo, que amplia a compreensão e evita interpretações parciais ou deturpadas.

Essa postura evita um dos erros mais comuns dos críticos do Espiritismo: julgar a doutrina por trechos soltos ou interpretações superficiais, sem considerar o conjunto harmônico dos ensinos dos Espíritos, organizado e codificado por Allan Kardec.

Conclusão

A fé espírita, como proposta por Allan Kardec, é um poder ativo, lúcido e libertador. Não depende de imposições externas, mas nasce do entendimento profundo das leis morais e espirituais que regem a vida. Ela se apoia na razão, caminha com a esperança ativa e se manifesta na ação perseverante pelo bem.

Erich Fromm, Herculano Pires e Krishnamurti, cada um em seu campo, reforçam essa visão ao defenderem uma fé que é fruto de maturidade interior e não de submissão. Ao estudarmos e vivenciarmos essa fé, deixamos de ser espectadores para nos tornarmos protagonistas na construção de um mundo melhor — firmes diante das tempestades, serenos na compreensão e confiantes no futuro que nossas próprias ações ajudam a edificar.

Referências

  • Allan KardecO Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. XIX.
  • Allan KardecO Livro dos Espíritos, Introdução e Conclusão.
  • Erich FrommA Revolução da Esperança.
  • J. Herculano PiresO Ser e a Serenidade.
  • Jiddu KrishnamurtiA Verdade é uma Terra sem Caminhos (discurso de dissolução da Ordem da Estrela) e Aos Pés do Mestre.
  • Allan KardecIntrodução ao Estudo da Doutrina Espírita.

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