Introdução
Desde
os primórdios da humanidade, o ser humano registra experiências de comunicação
com o invisível. O Espiritismo, codificado por Allan Kardec no século XIX, não
apenas reconheceu a realidade dessas manifestações, mas também lhes deu caráter
científico e moral, sistematizando os princípios que regem a mediunidade.
Segundo
a Doutrina Espírita, todos somos Espíritos em evolução, temporariamente
encarnados, e, por isso, mantemos naturalmente intercâmbio com o mundo
espiritual. Esse contato, em geral sutil e inconsciente, pode tornar-se
ostensivo em determinados indivíduos: os médiuns. Assim, a mediunidade não é um
privilégio nem uma anomalia, mas uma faculdade natural da alma humana.
Este
artigo busca analisar a mediunidade e a posição daquele que dialoga com os
Espíritos, à luz da codificação espírita, da coleção da Revista Espírita
(1858-1869) e de obras complementares do Espiritismo, explorando tanto seu aspecto
natural quanto os cuidados necessários ao seu desenvolvimento.
A Natureza da Mediunidade
Em O
Livro dos Médiuns (1861), Allan Kardec define médium como "toda pessoa que sente, num grau
qualquer, a influência dos Espíritos". O termo deriva do latim medius,
significando "intermediário".
Desse
modo, o médium é o intérprete entre os dois mundos: o físico e o espiritual. A
mediunidade é, portanto, a faculdade que permite sentir e transmitir a
influência dos Espíritos, favorecendo a comunicação.
Esse
intercâmbio não é extraordinário. Kardec enfatiza que todos os seres humanos
sofrem a influência oculta dos Espíritos em seus pensamentos, sentimentos e
intuições, embora nem sempre o percebam. A diferença é que, nos médiuns
ostensivos, essa influência se manifesta de forma clara, produzindo fenômenos
como psicofonia, psicografia, vidência ou efeitos físicos.
Mediunidade e Perturbação
Um
equívoco comum, presente desde o século XIX e ainda hoje persistente, é
associar mediunidade a doença ou perturbação mental. A Doutrina Espírita,
entretanto, esclarece que a mediunidade em si não causa desequilíbrio.
Quando
o médium se encontra perturbado, isso se deve a fatores como:
- falta de preparo
moral e doutrinário;
- ação de Espíritos
inferiores, atraídos por sintonia vibratória;
- causas fisiológicas
ou psicológicas independentes da mediunidade.
A Revista
Espírita (novembro de 1859) já registrava casos de médiuns em sofrimento
por desconhecimento da faculdade ou por influência de Espíritos obsessores.
Kardec sempre recomendava, nesses casos, assistência moral, passes, estudo
doutrinário e, quando necessário, acompanhamento médico, reconhecendo a
importância da medicina.
Portanto,
antes de qualquer exercício mediúnico, é indispensável que a pessoa esteja
equilibrada emocionalmente, esclarecida doutrinariamente e disposta a assumir,
com responsabilidade, o compromisso que a mediunidade implica.
Sinais Precursores e Manifestações
O
surgimento da mediunidade pode apresentar sinais característicos, como:
- sensação de
presenças invisíveis;
- alterações de sono
e desdobramentos inconscientes;
- arrepios, tremores,
formigamentos ou percepções fluídicas;
- mudanças repentinas
de humor, crises emocionais sem causa aparente;
- experiências de
vidência ou audição espiritual.
Esses
fenômenos, quando não explicados por causas orgânicas, podem indicar aptidão
mediúnica. Contudo, é importante distinguir manifestações naturais da alma de
estados patológicos.
Kardec,
em O Livro dos Médiuns, ressalta que o desenvolvimento da mediunidade
deve ser feito em ambiente sério, com estudo, disciplina e oração, para que não
se converta em fonte de desequilíbrio ou instrumento para Espíritos
mistificadores.
O Papel do Médium
O
médium não é um ser privilegiado, mas alguém que recebeu uma ferramenta de
trabalho espiritual. A faculdade em si não garante superioridade moral. O valor
do médium está em como utiliza sua mediunidade: se para o bem, com humildade e
disciplina, ou se a transforma em vaidade e instrumento de interesses pessoais.
Emmanuel,
no livro Nos Domínios da Mediunidade (psicografia de Francisco Cândido
Xavier), reforça que o médium deve ser um servidor consciente, colocando sua
faculdade a serviço da caridade e da renovação espiritual.
Assim,
o verdadeiro médium espírita deve unir três elementos essenciais:
- Estudo – para compreender os mecanismos da mediunidade e as leis espirituais.
- Moralidade – para atrair Espíritos superiores pela sintonia elevada.
- Disciplina – para manter constância e equilíbrio no exercício mediúnico.
Conclusão
A
mediunidade é um patrimônio espiritual da humanidade, expressão natural da
ligação constante entre encarnados e desencarnados. Longe de ser uma anomalia,
ela é instrumento de progresso, desde que seja exercida com responsabilidade,
amparo doutrinário e equilíbrio interior.
A
Doutrina Espírita mostra que o médium não é um eleito, mas um intérprete, cuja
missão é servir de ponte entre os dois mundos, iluminando consciências e
auxiliando na marcha evolutiva da humanidade.
O estudo
sério da codificação, aliado à vivência evangélica, garante que a mediunidade
cumpra seu papel de instrumento de esclarecimento, consolo e caridade.
Referências Bibliográficas
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Espíritos. 1857.
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Médiuns. 1861.
- KARDEC, Allan. A
Gênese. 1868.
- KARDEC, Allan. Revista
Espírita (1858-1869). Diversos números.
- XAVIER, Francisco
Cândido. Nos Domínios da Mediunidade. Pelo Espírito Emmanuel. FEB.
- Curso de Iniciação
ao Espiritismo – Cap. Mediunidade e seu Desenvolvimento – Editora e
Gráfica do Lar/ABC do Interior.
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