Introdução
Uma
das grandes indagações humanas refere-se ao que acontece no instante da morte
física: o espírito permanece junto ao corpo? Por quanto tempo? Sofre ou se
liberta imediatamente?
A
Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec, oferece respostas claras e
racionais a essas questões. Através de obras como O Livro dos Espíritos
(1857), O Céu e o Inferno (1865) e os relatos constantes da Revista
Espírita (1858-1869), aprendemos que o processo do desencarne varia
conforme a condição moral, os hábitos e a evolução espiritual do indivíduo.
Este
artigo explora o tema com base nos ensinamentos dos Espíritos Superiores,
complementando-os com reflexões sobre experiências de espíritos comunicantes
registradas por Kardec.
1. O desprendimento da alma e o laço fluídico
Allan
Kardec ensina que a morte não rompe instantaneamente a ligação entre o espírito
e o corpo. Esse processo é chamado de desprendimento, e se dá pela
ruptura gradual do “laço fluídico” que une o perispírito ao organismo físico (O
Livro dos Espíritos, q. 155-165).
- Espíritos
moralmente adiantados desligam-se com facilidade e serenidade.
- Espíritos presos à
matéria, ao egoísmo ou às paixões encontram maior dificuldade, podendo
permanecer junto ao corpo por tempo variável.
A
natureza desse desligamento define se o espírito vivencia sofrimento, confusão
ou paz logo após a morte.
2. Situações possíveis após o desencarne
2.1. Espíritos materializados e confusos
Alguns espíritos permanecem presos ao corpo,
assistindo ao velório e ao enterro. Kardec descreve, em O Céu e o Inferno
(1ª parte, cap. 2), casos em que o desencarnado sofre por sentir as impressões
da decomposição, reflexo de sua fixação mental na vida material.
Essa situação é mais comum naqueles que não
acreditavam na sobrevivência da alma, pois o choque da realidade espiritual
é, paradoxalmente, a única forma de despertá-los para a imortalidade.
2.2. Espíritos que adormecem após a morte
Outros espíritos entram em estado de sono no
momento do desencarne. A literatura espírita aponta dois desdobramentos
possíveis:
a) Sem virtudes cultivadas: despertam em
meio à perturbação e podem ser atraídos por entidades ainda ligadas às
imperfeições morais, permanecendo em ambientes espirituais menos felizes,
compatíveis com seu estado íntimo. Tais regiões não são lugares de condenação
eterna, mas esferas de aprendizado e depuração, onde o espírito toma consciência
de si mesmo e, pouco a pouco, desperta para a realidade da vida espiritual.
b) Com certas virtudes: são amparados por
Espíritos benfeitores, que os conduzem, ainda adormecidos, a locais de
assistência e tratamento. Ali, recebem cuidados, despertando suavemente em
ambiente de paz, esclarecimento e consolo.
Na Revista Espírita (agosto de 1858), Allan
Kardec relata casos de espíritos que descrevem esse período de sono como um
“longo sonho” do qual emergiram em novas condições de vida, cercados de auxílio
compatível com suas necessidades.
2.3. Espíritos conscientes e preparados
Os espíritos moralmente mais adiantados, que
cultivaram fé e virtude, são amparados desde o primeiro instante.
Permanece junto ao corpo durante o velório, mas consciente da realidade espiritual
e em paz interior.
Assistindo às despedidas, ainda acompanha o cortejo
fúnebre, não por apego material, mas por gratidão e afeto. Logo depois, é
conduzido às esferas condizentes com seu merecimento, onde reencontra
familiares e amigos que o precederam.
Kardec registra na Revista Espírita (março
de 1860) a comunicação de uma jovem desencarnada que, lúcida no momento da
morte, descreveu com serenidade a sua travessia e o reencontro imediato com
entes queridos.
3. Os missionários e os espíritos luminosos
Uma
exceção é feita aos espíritos missionários: almas que já conquistaram
grande elevação espiritual. Esses se libertam do corpo de forma quase
instantânea, muitas vezes irradiando luz, sem experimentar a confusão ou os
sofrimentos da maioria.
Esse processo
confirma a lei de progresso moral e espiritual: quanto mais o espírito se
depura, mais suave e serena é sua transição para a vida espiritual.
Conclusão
O
tempo que o espírito permanece junto ao corpo após a morte não é uniforme:
depende de sua evolução, de seus hábitos e de suas crenças. A Doutrina Espírita
nos ensina que:
- O sofrimento ou a
serenidade após a morte são consequências diretas da vida moral que se
levou.
- O desprendimento é
mais doloroso para os apegados à matéria e mais suave para os virtuosos.
- Todos os espíritos,
entretanto, recebem amparo e oportunidades de esclarecimento, conforme a
lei divina de justiça e misericórdia.
Assim,
a morte deixa de ser mistério ou castigo, tornando-se apenas uma passagem
natural para a verdadeira vida, a espiritual.
Referências
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Espíritos. 1857.
- KARDEC, Allan. O
Céu e o Inferno. 1865.
- KARDEC, Allan. A
Gênese. 1868.
- KARDEC, Allan. Revista
Espírita. Paris, 1858-1869 (diversos números).
- XAVIER, Francisco
Cândido. Nosso Lar. Pelo espírito André Luiz. Federação Espírita
Brasileira, 1944.
- PEREIRA, Yvonne A. Memórias
de um Suicida. Pelo espírito Camilo Castelo Branco. FEB, 1954.
Nenhum comentário:
Postar um comentário