Introdução
O hábito de reclamar acompanha o ser humano ao
longo de sua história. É tão comum que muitos o tomam como natural, quase como
uma forma de defesa diante das dificuldades cotidianas. Contudo, o Espiritismo,
codificado por Allan Kardec, convida-nos a refletir com mais profundidade: será
que a reclamação é realmente um caminho legítimo para o progresso espiritual,
ou apenas um desvio de foco que nos afasta da gratidão e da compreensão das
leis divinas?
A Doutrina Espírita ensina que Deus,
soberanamente justo e bom, nada faz de inútil ou injusto (O Livro dos
Espíritos, q. 13, 614). Tudo o que recebemos em nossa jornada terrena, seja em
forma de bênçãos ou de provas, é instrumento de aprendizado e crescimento.
Assim, reclamar é não reconhecer a grandeza da providência divina e o valor
pedagógico das experiências que nos são concedidas.
O hábito
da reclamação
Em qualquer parte do mundo encontramos os que
reclamam. Filhos dos pais, cônjuges entre si, patrões dos empregados e
empregados dos patrões, vizinhos e amigos: todos parecem, em determinados
momentos, depositar no outro a causa de suas inquietações. Essa postura reflete
uma visão estreita da vida, focada nas faltas e não nas conquistas, nas
carências e não nas dádivas.
O Espiritismo nos ensina que essa tendência é fruto
do nosso estado evolutivo atual. Espíritos ainda imperfeitos, olhamos para a
vida pelo prisma das necessidades imediatas, esquecendo-nos da eternidade da
alma. Ao invés de percebermos a harmonia do conjunto, fixamo-nos no detalhe que
nos contraria.
A
ingratidão para com Deus
Esse mau hábito revela-se ainda mais grave quando
dirigido ao Criador. Muitos de nós, envolvidos pela ilusão material,
acreditamos que temos direito a mais do que recebemos. Desejamos tranquilidade,
riqueza, poder, fama e beleza, esquecendo que a verdadeira finalidade da vida
terrena é o nosso progresso espiritual.
Na Revista Espírita (dezembro de 1861),
Kardec já alertava que a ingratidão para com Deus nasce da ignorância das suas
leis. A Providência nos cerca de cuidados incessantes: concede-nos o corpo como
instrumento de evolução, permite-nos renascer em famílias adequadas às nossas
necessidades, coloca-nos entre irmãos de jornada que nos ajudam a exercitar
paciência, afeto e fraternidade. Mesmo quando enfrentamos dificuldades, são
oportunidades de redenção e crescimento, frutos da lei de causa e efeito (O
Livro dos Espíritos, q. 964).
O valor
da gratidão
Se, em vez de reclamar, cultivássemos a gratidão,
perceberíamos que muito já nos é dado, a cada instante. A saúde, a
inteligência, a convivência familiar, os amigos, o trabalho, as escolas, os
professores, a paz relativa em que muitos vivem — tudo isso são bênçãos que
tomamos como naturais, quando, na realidade, constituem tesouros.
Em O Evangelho segundo o Espiritismo,
capítulo XVII, Kardec recorda que a verdadeira superioridade do Espírito não
está nas posses ou na posição social, mas no uso que fazemos das oportunidades
recebidas. Cada experiência, agradável ou dolorosa, é uma lição a ser
aproveitada. Assim, a gratidão não deve ser apenas um sentimento, mas uma
postura ativa, que se expressa em bondade e solidariedade para com o próximo.
Conclusão
A vida na Terra é uma estação de aprendizado. Uns
experimentam a saúde, outros a doença; uns gozam de facilidades materiais,
outros vivem em meio à penúria. Mas as posições alternam-se no curso dos
séculos, pois a lei da reencarnação nos coloca em diferentes cenários para que
aprendamos múltiplas lições.
Diante disso, a postura que mais nos engrandece é a
gratidão: reconhecer os cuidados constantes de Deus, cessar as reclamações por
bobagens e transformar nossa vida em um hino de confiança e amor. Reclamar é
estagnação; agradecer é progresso.
Assim, compreender e praticar a gratidão é também
um ato de fé racional, pois nos harmoniza com as leis divinas e nos aproxima da
verdadeira felicidade.
Referências
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Guillon
Ribeiro. FEB.
- KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. FEB.
- KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858-1869). Diversos anos.
- KARDEC, Allan. A Gênese. FEB.
- Momento Espírita. Os muitos cuidados de Deus. Disponível em:
momento.com.br.
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