Introdução
Entre todas as tradições religiosas e espirituais,
a prece sempre ocupou um lugar de destaque. Ela é expressão da alma em busca de
auxílio, de consolo e de comunhão com o Criador. O Espiritismo, codificado por
Allan Kardec, não aborda a prece como rito ou fórmula, mas como uma necessidade
universal do ser humano, confirmada pela observação e pela experiência.
A Doutrina Espírita mostra que a prece não é um ato
ilusório nem mero consolo psicológico: ela é uma ação real do pensamento, que
cria um laço entre o orante, Deus e os Espíritos, com efeitos morais,
espirituais e até fluídicos. A força da prece, no entanto, não está nas
palavras, mas na intenção sincera, na humildade e na confiança daquele que ora.
O sentido
e a utilidade da prece
Em O Livro dos Espíritos (q. 658-666), os
Espíritos ensinam que orar é uma necessidade da alma. Pela prece, o homem
louva, pede ou agradece, aproximando-se de Deus e recebendo forças para enfrentar
as lutas da vida. Longe de ser privilégio de religiões ou seitas, a prece é
universal, brotando do íntimo do ser humano em todas as épocas e culturas.
Kardec observa que, sem a prece, o homem se prende
unicamente às coisas materiais, perdendo a oportunidade de elevar o pensamento
e de fortalecer-se moralmente (Revista Espírita, jan. 1866).
Prece,
invocação e evocação
No vocabulário espírita, toda prece é uma
invocação: um chamado a Deus ou aos Espíritos superiores para que nos assistam.
Em certos casos, a prece pode se assemelhar a uma evocação, isto é, um apelo
direto a um Espírito determinado. No entanto, diferentemente dos antigos ritos
mágicos, no Espiritismo a evocação é simples e natural, dispensando fórmulas ou
aparatos externos (Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas).
Assim, seja dirigida a Deus, aos bons Espíritos ou
a entes queridos, a prece é sempre um testemunho de afeto, de simpatia e de
ligação espiritual.
O poder
do pensamento e da vontade
Segundo o Espiritismo, o pensamento é atributo
essencial do Espírito. Pela vontade, esse pensamento se torna força capaz de
agir além dos limites do corpo. Kardec explica que o pensamento se transmite
pelo fluido universal, que envolve todos os seres, estabelecendo correntes
fluídicas que alcançam encarnados e desencarnados (O Evangelho Segundo o
Espiritismo, cap. XXVII, item 10).
É assim que a prece alcança quem a recebe, não
importando a distância. Quando sincera e ardente, ela pode atrair bons
Espíritos, que auxiliam moralmente, sugerem bons pensamentos e transmitem
forças renovadoras.
Efeitos
morais e fluídicos da prece
A ação da prece não se limita ao campo moral.
Kardec, em diversos artigos da Revista Espírita (dez. 1859; jan. 1866),
mostra que a prece também pode ter efeitos fluídicos, auxiliando no alívio de
sofrimentos físicos e morais. Isso ocorre porque o pensamento e a vontade atuam
sobre os fluidos, transmitindo energias benéficas àquele que ora e àquele por
quem se ora.
Todavia, é importante compreender que a prece não
altera as leis divinas nem suprime provas necessárias. Ela fortalece o
Espírito, dá resignação e inspira soluções, sem abolir a justiça ou a lei de
progresso. Como ensinou Jesus: “Ajuda-te, e o céu te ajudará” (O Evangelho
Segundo o Espiritismo, cap. XXV, item 2).
A prece
pelos outros e pelos desencarnados
Orar pelos outros é uma forma elevada de caridade.
A prece sincera em favor de alguém é um ato de amor e solidariedade, que nunca
se perde. Kardec afirma que recusar uma prece a um Espírito sofredor é como negar
um copo d’água a quem tem sede (Revista Espírita, dez. 1868).
As almas necessitadas recebem alívio com nossas
preces, pois se sentem lembradas e amparadas. Mais ainda: a prece pode
despertar nelas o arrependimento e o desejo de se melhorar, atraindo Espíritos
superiores que as esclarecem e consolam. Daí a utilidade de orar pelos
desencarnados, em especial pelos que sofrem.
A
verdadeira prece: espontânea e sincera
Para o Espiritismo, o essencial não é orar muito,
mas orar bem. Não é a multiplicidade de palavras que confere valor à prece, mas
a sinceridade, a humildade e a fé viva. O rito pode ser forma exterior, mas a
verdadeira prece é espontânea, natural, um diálogo íntimo da alma com Deus e
com os Espíritos bons.
As palavras podem ser simples, mas o coração deve
estar presente. E, sobretudo, as ações devem confirmar a prece: o bem
praticado, a caridade, a transformação moral e os esforços contra nossas más
inclinações são, em si, as mais poderosas orações.
Conclusão
A prece, à luz do Espiritismo, não é superstição
nem mera convenção social. É um recurso divino colocado ao alcance de todos,
capaz de elevar a alma, consolar nas dores, fortalecer contra as tentações e
criar vínculos de solidariedade entre os homens e os Espíritos.
Quando sincera e confiante, ela mobiliza o auxílio
dos bons Espíritos, contribui para o alívio dos sofrimentos e nos ensina a
valorizar o autoconhecimento e a reforma íntima como caminhos indispensáveis
para o perdão e para a verdadeira paz.
Assim, compreender e praticar a prece é integrar-se
à lei de amor que rege o universo, tornando-nos participantes ativos da grande
obra de progresso espiritual da humanidade.
Referências
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Livro III, cap. II,
subcap. IV (qq. 658 a 666).
- KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. XVII,
item 4; Cap. XXV, item 2; Cap. XXVII, item 10.
- KARDEC, Allan. Instruções Práticas sobre as Manifestações
Espíritas. Vocabulário.
- KARDEC, Allan. Revista Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos
(1858-1869).
- Dezembro de 1859 – Efeitos da Prece.
- Janeiro de 1866 – Considerações sobre a Prece no Espiritismo.
- Dezembro de 1868 – Sessão Anual Comemorativa dos Mortos.
- KARDEC, Allan. A Gênese. Rio de Janeiro: FEB.
- XAVIER, Francisco Cândido; VIEIRA, Waldo. Evolução em Dois
Mundos. Pelo Espírito André Luiz. Rio de Janeiro: FEB.
- PIRES, J. Herculano. Introdução à Filosofia Espírita.
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