Introdução
O debate
sobre o aborto está longe de ser apenas uma questão de legislação ou de saúde
pública. Ele envolve ética, filosofia, espiritualidade e, sobretudo, a
consciência humana diante da vida. O diálogo reproduzido em um opúsculo de 1998
revela a profundidade do conflito: de um lado, a reivindicação da autonomia da
mulher sobre seu corpo; de outro, o reconhecimento do direito à vida do feto.
A
discussão permanece atual e ainda mais acirrada. Em tempos de polarizações
políticas, muitos reduzem a questão ao slogan de “direito de escolher”,
esquecendo-se que há outra vida envolvida. À luz da Doutrina Espírita,
codificada por Allan Kardec, o aborto é uma decisão que vai além da legislação
humana, pois toca os fundamentos da vida espiritual e das responsabilidades do
Espírito encarnado.
O olhar espírita sobre a vida e o aborto
Em O
Livro dos Espíritos (questões 344 a 360), Kardec questiona os Espíritos
sobre o momento em que a alma se une ao corpo, a sacralidade da vida desde a
concepção e as consequências espirituais do aborto. A resposta é clara: o ser
em gestação é um Espírito em processo de encarnação, não um “amontoado de
células”. O aborto voluntário representa, portanto, uma interrupção violenta de
um processo natural, com repercussões tanto para a mãe quanto para o Espírito
reencarnante.
Na Revista
Espírita (1866, artigo “A Pena de Morte”), Kardec observa que, ao
justificar mortes em nome de ideias ou conveniências sociais, o ser humano se
afasta da moral universal. O mesmo raciocínio pode ser aplicado ao aborto:
quando a consciência tenta “desumanizar” o embrião, nega-se a responsabilidade
espiritual pela vida que se desenvolve.
A retórica da desumanização
O diálogo
citado no opúsculo destaca um ponto essencial: antes de suprimir direitos ou
vidas, cria-se uma narrativa para desumanizar o outro. Foi assim em regimes
totalitários que justificaram genocídios; é assim quando se tenta reduzir o
embrião a um simples “aglomerado celular”.
A
Doutrina Espírita adverte que esse mecanismo de desumanização serve apenas para
aliviar consciências temporariamente, mas não elimina a realidade espiritual. O
Espírito que deveria reencarnar continua existindo, e a responsabilidade diante
das Leis Divinas permanece.
Entre saúde pública e responsabilidade espiritual
É verdade
que milhares de mulheres, especialmente pobres, recorrem a métodos inseguros e
colocam suas vidas em risco. Isso exige políticas públicas que unam educação
sexual, acesso a métodos contraceptivos e apoio social às gestantes.
Entretanto, legalizar o aborto como solução simples significa transferir o
problema para outro plano: o espiritual.
O
Espiritismo não fecha os olhos para a dor das mulheres, mas propõe uma
alternativa de consciência: prevenir em vez de eliminar, apoiar em vez de
punir, orientar em vez de condenar. A verdadeira “modernidade” não está em
legitimar a supressão da vida, mas em construir uma sociedade que valorize a
maternidade responsável e ofereça condições dignas para que nenhuma mulher veja
no aborto a única saída.
Conclusão
A
política pode legislar sobre direitos e deveres, mas não pode alterar as leis
universais que regem a vida e a evolução espiritual. Cada decisão relacionada
ao aborto tem consequências que ultrapassam os limites do corpo e da existência
terrena.
Ao
refletir sobre esse tema, o Espiritismo nos convida a elevar a discussão: não
se trata apenas de um debate jurídico ou ideológico, mas de uma questão de
consciência. Defender a vida desde a concepção não é retrocesso; é reconhecer
que a existência é um bem maior que antecede qualquer direito humano.
Referências
- KARDEC, Allan. O Livro
dos Espíritos. 1857.
- KARDEC, Allan. Revista
Espírita (1858-1869).
- FORMIGA, Luiz Carlos D. “A
política do aborto: O que se quer é ‘desumanizar’ o embrião”. Arigo,
1998. Disponível em: http://www.geocities.com/neurj/neurj.htm.
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