Introdução
Diante da realidade contemporânea, marcada por
violência, desonestidade e sofrimento, muitos corações experimentam a tentação
do afastamento. Em busca de preservar a própria paz, alguns preferem reduzir ao
mínimo o convívio com familiares, vizinhos e colegas de trabalho,
justificando-se com a máxima evangélica de que “o meu reino não é deste mundo”
(João 18:36). Nesse raciocínio, o isolamento e a abnegação total dos bens
materiais pareceriam caminhos seguros para a redenção.
Todavia, a Doutrina Espírita, codificada por Allan
Kardec, nos convida a uma reflexão mais profunda. O exemplo de Jesus e o ensino
dos Espíritos revelam que o verdadeiro discipulado não se faz pelo afastamento
do mundo, mas pela vivência consciente no meio dele, colaborando para sua melhoria.
O
equívoco do isolamento espiritual
Ao longo da História, surgiram congregações e
ordens religiosas que, em busca de santidade, optaram pela vida contemplativa e
pelo distanciamento social. Acreditava-se que louvar a Deus em clausura era
suficiente para conquistar a salvação. Entretanto, a mensagem evangélica e a
filosofia espírita apontam em outra direção.
Jesus, nosso modelo e guia, jamais se furtou ao
contato com os sofredores. Convivendo com prostitutas, cobradores de impostos,
enfermos e pecadores, deixou claro que
“os sãos não precisam de médico” (Lucas 5:31; Marcos 2:17). A sua presença
junto aos marginalizados da sociedade demonstrou que o caminho para o reino dos
céus é o da solidariedade ativa, não da fuga.
O amor
como lei universal
Em O Livro dos Espíritos, os benfeitores
espirituais ensinam que a lei de amor é a síntese das Leis Divinas (questões
886 a 890). Jesus já havia resumido toda a moral em duas máximas: amar a Deus
sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo (Mateus 22:37-40).
À luz desses princípios, torna-se incoerente amar a
Deus e desprezar o mundo criado por Ele. O amor ao Criador se manifesta no
respeito à Sua obra e na cooperação para que a humanidade avance em direção ao
bem. O amor ao próximo, por sua vez, só se concretiza no convívio, na ajuda
mútua e no esforço de esclarecimento.
Na célebre resposta à questão 888a de O Livro
dos Espíritos, aprendemos que todo Espírito, qualquer que seja sua posição,
tem sempre um superior a quem deve respeitar e aprender, e um inferior perante
o qual tem deveres a cumprir. Isso significa que todos estamos,
inevitavelmente, em relações de solidariedade. Isolar-se é negar essa lei.
O homem
no mundo
Allan Kardec, em diversas passagens da Revista
Espírita (1858-1869), tratou da importância da vida em sociedade. Ele
esclarece que é no meio das lutas e contradições do mundo que se exercita a
caridade, a paciência e a fraternidade. Não é fugindo das provas que
conquistamos a paz, mas cumprindo os deveres que a vida nos apresenta.
A verdadeira paz não se alcança na omissão, mas na
consciência tranquila pelo dever cumprido. O cristão não deve fugir do mundo,
mas renunciar às ilusões, compreendendo que o céu não é um lugar, mas um estado
de consciência em harmonia com as Leis Divinas.
Conclusão
A missão do homem no mundo não é o isolamento, mas
a cooperação ativa na construção do bem. Jesus nos mostrou, com sua vida, que o
amor se concretiza no contato, no serviço e na solidariedade. O Espiritismo
confirma que nossa evolução se realiza no seio da humanidade, através do
aprendizado mútuo.
Portanto, se desejamos realmente amar a Deus,
devemos aprender a amar e servir aos nossos irmãos. O céu começa dentro de nós
quando nos fazemos instrumentos de paz e de luz, vivendo no mundo sem nos
prender a suas ilusões, mas deixando nele as marcas do amor que nos aproxima do
Criador.
Referências
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 1857.
- KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. 1861.
- KARDEC, Allan. A Gênese. 1868.
- KARDEC, Allan. Revista Espírita. 1858-1869.
- KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. 1864.
- BÍBLIA SAGRADA. João 18:36; Lucas 5:31; Marcos 2:17; Mateus
22:37-40.
- Momento Espírita. O Homem no Mundo. Disponível em: http://momento.com.br/pt/ler_texto.php?id=1313&stat=0.
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