Introdução
A
Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec no século XIX, apresenta uma
concepção abrangente e racional sobre a origem e a estrutura do universo. Um
dos conceitos fundamentais dessa cosmovisão é o do Fluido Cósmico Universal
(FCU) — elemento primordial de onde derivam todas as formas de matéria e
energia.
Além
de explicar a constituição da matéria, o Espiritismo aborda a natureza e a
origem dos Espíritos, seres inteligentes da criação, bem como o vínculo entre
Espírito e matéria por meio do perispírito. Esses temas encontram-se
sistematizados em O Livro dos Espíritos, especialmente no Livro Segundo
— Mundo Espírita ou dos Espíritos (Capítulo I, seções I a IV).
Este
artigo explora tais fundamentos, articulando-os ao papel do Fluido Cósmico
Universal e às explicações publicadas por Allan Kardec na Revista Espírita
(1858-1869), compondo um quadro coerente da Criação e da existência espiritual.
1. O Fluido Cósmico Universal: Matéria Primordial
da Criação
Segundo
a Codificação Espírita, o FCU é o elemento primitivo de onde provêm todas as
coisas. Criado por Deus, é a matéria elementar que, sob diversas modificações e
combinações, dá origem tanto às substâncias conhecidas quanto às que ainda nos
escapam à percepção.
Em A
Gênese (cap. XIV, item 2), Kardec afirma que o FCU é o “veículo do
pensamento divino”, a substância sobre a qual a vontade de Deus atua para
formar os mundos e todos os seres vivos. Ele constitui, assim, a base da
matéria tangível e das formas sutis da matéria espiritual.
A Revista
Espírita reforça esse conceito em diversas passagens, sublinhando que o FCU
não é o próprio Deus, mas procede d’Ele como instrumento de Sua ação criadora.
Pela manipulação desse fluido, segundo leis naturais, se dá a formação, a transformação
e a evolução de tudo o que existe no Universo.
2. Origem e Natureza dos Espíritos
Em O
Livro dos Espíritos (questões 76 a 83), os Espíritos Superiores ensinam que
os Espíritos são os seres inteligentes da Criação. Criados simples e
ignorantes, sem conhecimentos ou virtudes adquiridas, possuem, no entanto,
potencial ilimitado para alcançar a sabedoria e a perfeição.
Ao
longo de múltiplas experiências e aprendizados, desenvolvem suas faculdades
intelectuais e qualidades morais, ascendendo das ordens inferiores às mais
elevadas, até o estado de Espíritos puros.
Kardec
explica que os Espíritos não são formados da matéria grosseira, mas de uma
substância sutil, derivada também do FCU. Essa distinção é fundamental: a matéria
comum é inerte e temporária, enquanto o Espírito é ativo, inteligente e
imortal. Seus envoltórios — corpos físicos ou sutis — são transitórios,
subordinados às leis divinas de evolução.
3. O Mundo Espiritual: Morada Primordial dos
Espíritos
De
acordo com Kardec, o mundo espiritual é o mundo primitivo e permanente,
enquanto o mundo corporal é secundário e transitório, servindo apenas como
instrumento para o progresso do ser imortal (O Livro dos Espíritos,
questões 85, 132 e 222).
O
retorno ao mundo espiritual após a desencarnação revela que a verdadeira vida é
a espiritual, ao passo que a existência corpórea é apenas uma etapa de
aprendizado.
Relatos
publicados na Revista Espírita descrevem o plano espiritual como dinâmico,
organizado e hierarquizado, habitado por Espíritos em diferentes graus de
progresso. Cada um ocupa posição compatível com seu nível de evolução,
avançando conforme se purifica moralmente e se desenvolve intelectualmente.
4. Forma e Ubiquidade dos Espíritos
Conforme
O Livro dos Espíritos (questões 88 a 92), os Espíritos não possuem forma
material fixa. Sua essência é imaterial e fluídica. No entanto, podem tornar-se
perceptíveis assumindo formas aparentes, geralmente humanas, mediante o
perispírito, em função de sua vontade ou da necessidade de identificação.
Por
não estarem submetidos às leis da gravidade ou do tempo, os Espíritos
deslocam-se pela força do pensamento. Essa faculdade lhes confere mobilidade e
a possibilidade de ubiquidade aparente, fenômeno descrito por Kardec na Revista
Espírita: o Espírito pode transmitir simultaneamente seu pensamento a
diferentes pontos, sem se dividir em múltiplos seres.
5. O Perispírito: Elo entre Espírito e Matéria
O
perispírito é o envoltório semimaterial do Espírito, formado a partir do FCU (O
Livro dos Espíritos, questão 93). Ele se adapta às condições do mundo em
que o Espírito habita, variando em densidade e sutileza.
Funções
principais do perispírito:
- Permitir a ação do
Espírito sobre a matéria;
- Servir de canal
entre corpo e Espírito, transmitindo sensações e impressões;
- Preservar a
individualidade após a morte, possibilitando reconhecimento e memória no
plano espiritual.
Em O
Livro dos Médiuns e na Revista Espírita, Kardec documenta a
plasticidade do perispírito, que pode condensar-se ou rarefazer-se, explicando
fenômenos como aparições, materializações e mudanças de aparência.
Além
disso, o perispírito desempenha papel essencial:
- Na encarnação, liga o Espírito
ao corpo físico, servindo de molde para sua organização;
- Na desencarnação, se desprende
progressivamente, conduzindo o Espírito de volta à vida espiritual.
Assim,
o perispírito assegura a continuidade da identidade pessoal e a interação entre
Espírito e matéria.
Conclusão
A
Doutrina Espírita apresenta uma visão lógica e harmoniosa da Criação: tudo se
origina no Fluido Cósmico Universal, matéria primordial submetida à vontade divina.
Os
Espíritos, criados simples e ignorantes, percorrem um processo evolutivo
contínuo, no qual a vida corpórea é apenas uma etapa educativa. O mundo
espiritual é sua morada primitiva e definitiva.
O
perispírito, formado do mesmo elemento cósmico, constitui o elo indispensável
entre o princípio inteligente e a matéria, garantindo a preservação da
individualidade e explicando a continuidade da vida além da morte.
Esses
princípios, expostos por Allan Kardec em O Livro dos Espíritos, A
Gênese e na Revista Espírita, revelam um universo regido pela
inteligência e pelo amor divinos, no qual a evolução conduz todos os seres ao
destino de perfeição.
Referências
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Espíritos. 2º Livro: Mundo Espírita ou dos Espíritos. Cap. I
– Dos Espíritos.
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Médiuns. 2ª Parte: Das Manifestações Espíritas.
- KARDEC, Allan. A
Gênese. Cap. XIV – Os Fluidos.
- KARDEC, Allan. Revista
Espírita: Jornal de Estudos Psicológicos (1858-1869).
- KARDEC, Allan. Obras
Póstumas. 2ª Parte – Manifestações dos Espíritos.
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