Introdução
Na vida em sociedade, cedo ou tarde, todos
experimentamos a amarga sensação de sermos incompreendidos, julgados com
injustiça ou até mesmo tratados como vilões em narrativas que não nos
pertencem. Esse fenômeno, tão humano quanto doloroso, revela a fragilidade das
percepções individuais e a influência das paixões, feridas e limitações de cada
um.
À luz da Doutrina Espírita, codificada por Allan
Kardec, essa realidade ganha contornos mais amplos: somos Espíritos em processo
de aprendizado, convivendo uns com os outros para testar, fortalecer e
desenvolver as virtudes necessárias ao progresso moral. Assim, o julgamento
alheio, ainda que injusto, pode ser oportunidade de crescimento espiritual,
desde que saibamos ancorar-nos na consciência tranquila e na prática do bem.
O
Julgamento Humano e as Ilusões da Aparência
Em O Evangelho segundo o Espiritismo (cap.
X, item 11), Kardec destaca que, se a indulgência para com as imperfeições
alheias é virtude, a severidade no julgamento dos outros é falta de caridade.
Ainda assim, muitos se deixam levar pelas aparências ou pelas próprias dores
para projetar nos outros a responsabilidade de suas inquietações.
Quando alguém nos pinta como vilão, isso fala mais
da visão e da história interior dessa pessoa do que da realidade de quem somos.
Trata-se, como ensina a Psicologia e confirma a experiência espírita, de
projeção: ver no outro aquilo que ainda não se aprendeu a reconhecer ou superar
em si mesmo.
A Revista Espírita (dezembro de 1861) traz
relatos de Espíritos que, ao desencarnarem, reconheceram ter feito julgamentos
apressados e injustos, percebendo tarde demais o mal que haviam causado. Esse
testemunho reforça o ensinamento de Jesus: “Não julgueis, para que não sejais
julgados” (Mateus 7:1).
A Força
Interior e a Consciência Tranquila
O Espiritismo ensina que o verdadeiro tribunal do
ser humano é a sua consciência. Em O Livro dos Espíritos (q. 621), os
Espíritos afirmam que “a lei de Deus está escrita na consciência”. Assim, se
nossa intenção é reta, se procuramos agir com honestidade e bondade, não
devemos nos perturbar em excesso com as opiniões alheias.
Kardec, em O Evangelho segundo o Espiritismo
(cap. XXVII, item 10), ressalta a importância da oração como refúgio e
fortaleza para o Espírito. Ao invés de alimentar ressentimentos ou entrar em
disputas intermináveis para defender nossa imagem, cabe-nos cultivar
serenidade, confiar em Deus e deixar que nossas obras falem por nós.
É nesse ponto que o conselho de Emmanuel ecoa com
clareza: “A melhor defesa é a consciência reta”. O que somos em essência,
sustentado pela prática do bem, se sobrepõe às narrativas distorcidas que
porventura se levantem contra nós.
Libertar-se
da Necessidade de Aprovação
Uma das grandes armadilhas da vida é a busca
constante pela aprovação alheia. O Espiritismo nos recorda que encarnamos para
aprender, corrigir erros e avançar moralmente — e esse processo nem sempre será
compreendido ou aceito por todos.
Em O Livro dos Médiuns (cap. XXIX, item
350), Kardec esclarece que a transformação da humanidade se dará gradualmente,
pelo aperfeiçoamento dos indivíduos. Nesse caminho, os que tentam viver de
acordo com valores espirituais inevitavelmente enfrentarão incompreensão,
quando não hostilidade.
Jesus mesmo advertiu: “Bem-aventurados sois vós
quando vos injuriarem e perseguirem... Regozijai-vos, porque é grande o vosso
galardão nos céus” (Mateus 5:11-12). O Mestre, incompreendido e acusado
injustamente, mostrou que a verdadeira grandeza está em manter-se fiel ao amor,
mesmo diante da calúnia e da perseguição.
Considerações
Finais
Não somos o vilão da nossa própria vida, ainda que
a narrativa de outro nos coloque nesse papel. A Doutrina Espírita nos orienta a
separar a opinião transitória dos homens da verdade perene que habita nossa
consciência.
A grande lição é viver de modo íntegro, com coragem
e serenidade, protegendo nossa energia contra o ressentimento e mantendo o
coração firme na prática do bem. O julgamento dos outros é passageiro; o
testemunho de nossa consciência, porém, nos acompanha eternamente.
Assim, quando nos sentirmos alvo de incompreensões
ou acusações injustas, lembremo-nos do ensinamento de Kardec: “A verdadeira
superioridade é a que resulta da prática efetiva da caridade e da humildade” (O
Evangelho segundo o Espiritismo, cap. VII, item 11). Eis a rota segura para
caminhar com paz, sem se perder nas sombras da ignorância alheia.
Referências
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos.
- KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns.
- KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo.
- KARDEC, Allan. A Gênese.
- KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858-1869).
- XAVIER, Francisco Cândido (psicografias de Emmanuel). Fonte Viva.
Federação Espírita Brasileira.
- XAVIER, Francisco Cândido. Caminho, Verdade e Vida.
Federação Espírita Brasileira.
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