Introdução
O ser
humano, em sua busca por segurança e sentido, tende a planejar minuciosamente
os caminhos da vida. Desde a escolha de uma carreira até a preparação de festas
e comemorações, somos levados a projetar, organizar e administrar cada etapa da
existência material. Contudo, quando se trata da morte — destino inevitável de
todos os seres encarnados — o silêncio e a omissão predominam. Raros são os que
pensam na própria partida, menos ainda os que planejam seus últimos momentos e
suas consequências.
À luz
da Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec e fundamentada nas Revistas
Espíritas (1858-1869), refletir sobre a morte não é morbidez, mas
sabedoria. Trata-se de reconhecer a continuidade da vida, compreender o sentido
do retorno ao “lar paterno” e preparar-se para essa transição com serenidade e
consciência tranquila.
A Vida Planejada e o Esquecimento da Morte
Um
paradoxo humano: planeja-se a graduação, os convites, os casamentos, a
quantidade de filhos e até os bens materiais, mas raramente se pensa no momento
da partida. A morte continua sendo percebida como ruptura definitiva, quando,
segundo o Espiritismo, é apenas uma passagem — uma “mudança de estado” do
Espírito.
A
Doutrina Espírita, em O Livro dos Espíritos (questões 149 e 150), ensina
que a vida verdadeira é a espiritual, sendo a encarnação apenas um estágio
temporário de aprendizado. Planejar a vida sem considerar a morte é, portanto,
negligenciar a etapa mais certa e natural do processo evolutivo.
Planejar a Partida: Um Ato de Consciência
Embora
não possamos definir a data ou as circunstâncias da morte, podemos preparar-nos
para ela no que diz respeito à consciência, às relações interpessoais e ao
legado moral. São desejos simples e humanos: morrer num dia de sol, cercado de
pensamentos positivos, com flores singelas e lembranças gratas.
Essa
perspectiva não é apenas poética, mas profundamente doutrinária. Em O Céu e
o Inferno, a Doutrina Espírita apresenta exemplos de Espíritos
desencarnados que relatam experiências pacíficas ou dolorosas de passagem,
diretamente relacionadas ao modo como viveram. Conscientemente ou não, ao
desejar partir em paz, é traduzir a essência do que a Doutrina Espírita chama
de “morte sem agonia moral”, fruto de uma vida reta e útil.
O Valor Espiritual do Legado e da Prece
A
Doutrina Espírita reforça que os pensamentos e as preces dos que permanecem
encarnados são recursos reais para o Espírito que retorna ao mundo espiritual.
A evocação de boas lembranças, a gratidão e os sentimentos elevados funcionam
como energia de amparo, iluminando o caminho de quem parte. Na Revista
Espírita de abril de 1860, Kardec registra comunicações de Espíritos
beneficiados por essas vibrações, confirmando que o bem não cessa com a morte.
Planejar
a partida, portanto, não significa decidir apenas sobre cerimônias ou flores,
mas também cultivar, em vida, ações e sentimentos que inspirem lembranças
felizes e orações sinceras.
Flores Simples, Símbolos Eternos
O
desejo de ter flores no caixão — ainda que singelas — simboliza mais do que
estética. Representa beleza, gratidão e ligação afetiva com a Terra. Na
linguagem espírita, a flor é um sinal de esperança e transitoriedade: nasce,
floresce e murcha, assim como os ciclos da existência corporal. Reconhecer a
efemeridade da vida não diminui seu valor; ao contrário, amplia-o.
Conclusão
Planejar
a morte não é fixar-se no fim, mas dar sentido ao percurso. É compreender, à
luz do Espiritismo, que a vida material é preparação para uma vida mais ampla e
duradoura. Cada gesto de amor, cada vínculo construído, cada consciência
tranquila é um passo para uma partida serena. Assim, mais importante do que
escolher o dia ou as flores do adeus é garantir que, ao chegar esse momento,
tenhamos a paz interior de quem esgotou com dignidade o quinhão de energia
recebido da Bondade Divina.
Referências
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Espíritos. 86ª ed. FEB, 2018.
- KARDEC, Allan. O
Céu e o Inferno. 64ª ed. FEB, 2016.
- KARDEC, Allan. Revista
Espírita (1858-1869). Diversos volumes. FEB.
- Momento Espírita. Para
quando ela chegar. Disponível em: momento.com.br/pt/ler_texto.php?id=7521&stat=0
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