sexta-feira, 12 de setembro de 2025

 

POLÍTICA, JUSTIÇA E NARRATIVAS VERSUS FATOS CONCRETOS
UMA PERSPECTIVA SOBRE A ÉTICA NO PODER
- A Era do Espírito -

Introdução

Na sociedade contemporânea, política e justiça são frequentemente atravessadas por disputas narrativas que moldam a percepção pública sobre os acontecimentos. As redes sociais e os meios de comunicação de massa ampliaram o poder dessas narrativas, que muitas vezes substituem a análise de fatos concretos por discursos emocionalmente persuasivos.

Contudo, o predomínio da narrativa sobre os fatos pode comprometer a imparcialidade da justiça e a racionalidade da política, gerando polarizações e injustiças. A Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec, oferece uma reflexão ética profunda: o progresso verdadeiro só pode se sustentar sobre a verdade e a responsabilidade moral. Este artigo propõe analisar, à luz do Espiritismo, como funcionam os mecanismos de narrativa e de fatos concretos na política e na justiça, e quais os caminhos para equilibrá-los com discernimento e moralidade.

A força das narrativas: percepção moldada e emoção mobilizada

As narrativas funcionam como molduras cognitivas: simplificam a realidade, destacam certos elementos e silenciam outros. Na política, isso significa criar histórias que definem “heróis” e “vilões”, prometendo soluções rápidas para problemas complexos.

  • Organização da percepção pública: narrativas transformam eventos isolados em histórias coerentes e fáceis de lembrar.
  • Definição de problemas: por meio de símbolos e linguagem estratégica, grupos de interesse dizem o que deve ser visto como problema e quem são os culpados.
  • Mobilização social: ao mostrar quem “ganha” e quem “perde”, as narrativas despertam sentimentos de injustiça e urgência, impulsionando movimentos e protestos.
  • Influência na justiça: quando uma narrativa domina o debate público, pode pressionar legisladores e até influenciar decisões judiciais, antes mesmo da apuração completa dos fatos.

Esse fenômeno não é novo. Na Revista Espírita, Allan Kardec já alertava que paixões e preconceitos podem distorcer o julgamento humano, afastando-o da verdade e da justiça. Para o Espiritismo, a verdade é progressiva, mas deve sempre se apoiar em fatos e não em impressões.

Política e justiça baseadas em fatos: o caminho da razão

O funcionamento institucional da política e da justiça depende, em essência, da apuração de fatos concretos.

  • Política: o poder legislativo cria leis, e o poder executivo as aplica. Eles definem prioridades sociais (como saúde, segurança e educação) com base em diagnósticos e dados da realidade.
  • Justiça: o poder judiciário interpreta essas leis e as aplica a casos concretos, garantindo direitos e resolvendo conflitos. A Constituição Federal do Brasil garante a qualquer cidadão o acesso à Justiça.
  • Fatos concretos: são a base de toda decisão justa. Envolvem coleta de provas, testemunhos e análises objetivas, que permitem à Justiça formar convicção e decidir com equilíbrio.

Essa estrutura busca assegurar a harmonia social, promovendo a paz entre interesses conflitantes. Mas para funcionar, depende de instituições imparciais e da educação moral da sociedade.

Narrativas x fatos: risco de inversão de valores

Quando a narrativa se sobrepõe aos fatos, a verdade se torna relativa e a justiça se enfraquece. A opinião pública passa a julgar com base em impressões e slogans, não em provas.

Esse cenário já é percebido globalmente. Segundo o Instituto Reuters, o consumo de notícias por redes sociais aumentou cerca de 60% na última década, mas a confiança na informação caiu para menos de 40% em média em 2024. Esse fenômeno favorece julgamentos apressados e linchamentos virtuais, minando o devido processo legal.

Para a Doutrina Espírita, a justiça verdadeira exige serenidade e imparcialidade. No capítulo “Lei de Justiça, de Amor e de Caridade” de O Livro dos Espíritos (questões 873 a 885), os Espíritos ensinam que a justiça se baseia no respeito aos direitos de cada um, e que só o amor pode inspirar julgamentos justos.

Portanto, decisões fundadas em narrativas passionais, sem análise racional e moral, violam essa lei natural.

Educação moral: o antídoto espírita contra a manipulação

Allan Kardec afirma, na Revista Espírita (julho de 1862), que “a educação é a chave do progresso moral”. Sem educação moral, as massas ficam vulneráveis a discursos manipuladores.

Para o Espiritismo, a verdadeira transformação social nasce da reforma íntima de cada indivíduo, que deve cultivar valores como honestidade, discernimento e senso de justiça. Um cidadão moralmente educado é menos suscetível a aceitar narrativas falsas e mais comprometido em buscar os fatos antes de julgar.

Essa visão encontra eco em dados atuais: segundo o World Justice Project (WJP), países com altos índices de educação cívica e transparência institucional apresentam também maior confiança na justiça e menor corrupção. Isso confirma que a ética individual fortalece a justiça coletiva.

Conclusão

Narrativas são ferramentas legítimas de comunicação política e social, mas quando se sobrepõem aos fatos e à razão, podem distorcer a justiça e ameaçar a democracia. A Doutrina Espírita lembra que só a verdade liberta o Espírito e sustenta o progresso humano.

O equilíbrio desejável é aquele em que os fatos concretos orientam as decisões políticas e judiciais, enquanto as narrativas servem apenas para explicar e não para substituir a realidade. Para que isso seja possível, é indispensável investir na educação moral e cívica, promovendo cidadãos críticos, responsáveis e comprometidos com a verdade.

O futuro ético da sociedade depende de unir razão e moral, justiça e amor, fato e consciência.

Referências

  • Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. 1ª ed. Paris, 1857.
  • ———. Revista Espírita (1858-1869).
  • ———. O Céu e o Inferno. Paris, 1865.
  • Instituto Reuters. Digital News Report 2024.
  • World Justice Project (WJP). Rule of Law Index 2024.
  • Constituição Federal do Brasil (1988).

 

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