segunda-feira, 29 de setembro de 2025

PROMESSAS, FANATISMO E A FÉ RACIONAL
À LUZ DO ESPIRITISMO
- A Era do espírito -

Introdução

O ser humano, em diferentes culturas e tradições religiosas, manifesta sua fé por meio de rituais de sacrifício, promessas e demonstrações públicas de devoção. Seja no sertão nordestino, onde fiéis percorrem longas distâncias em condições precárias para cumprir votos diante de imagens, seja em grandes centros de peregrinação, como a templos religiosos, o fenômeno se repete. Em comum, está a crença de que Deus ou os santos respondem com benefícios materiais e espirituais a tais gestos de autoimolação.

No entanto, a Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec, convida-nos a refletir sobre a racionalidade da fé e a compreender que a relação entre a criatura e o Criador não pode ser reduzida a barganhas espirituais. O verdadeiro caminho de elevação não está na promessa material ou no espetáculo de sacrifícios, mas no esforço íntimo de transformação moral, fortalecido pela prece e pelo cumprimento das leis divinas.

O comércio da fé e a promessa como ilusão

Ao analisarmos esse fenômeno com serenidade, percebemos que a promessa, enquanto negociação com Deus, nasce da falta de esclarecimento espiritual. Muitos acreditam que, ao subir escadarias de joelhos ou carregar cruzes pesadas, estarão comprando a misericórdia divina. Mas, como nos ensina O Evangelho Segundo o Espiritismo, o Pai não se deixa comover por exterioridades; sua justiça e bondade não podem ser “compradas”.

As provas e dificuldades da vida fazem parte do processo educativo do Espírito. Tentarmos negociar com Deus para nos livrarmos delas seria negar o próprio sentido da reencarnação, que é o aprendizado pela experiência. Se Deus retirasse todos os obstáculos diante de uma promessa, onde estaria o mérito das nossas vitórias?

Fanatismo e fé cega

Kardec alerta, em O Evangelho Segundo o Espiritismo, que o fanatismo nada mais é do que a fé cega levada ao excesso, aceitando o falso como verdadeiro sem exame racional. É exatamente esse fanatismo que sustenta práticas exteriores destituídas de sentido espiritual.

A fé espírita, ao contrário, é racional: “Não basta ver, é preciso compreender” — ensina a Codificação. Uma fé que se fundamenta na razão e na experiência não precisa de artifícios, mas se traduz em serenidade, confiança e prática do bem.

O papel do esclarecimento e da caridade

Não se trata de criticar ou ridicularizar aqueles que recorrem às promessas, mas de compreender que todos nós, em algum momento de nossa caminhada evolutiva, já recorremos a práticas semelhantes, seja nesta ou em outras existências. O que nos cabe hoje é auxiliar com fraternidade e humildade, oferecendo esclarecimento e mostrando caminhos mais elevados.

A caridade, que segundo a Doutrina Espírita é benevolência, indulgência e perdão, também se manifesta no esforço de instruir nossos irmãos sem presunção, mas com amor. Como lembra a Revista Espírita, o conhecimento das leis divinas é uma das maiores formas de caridade, pois ilumina consciências e evita sofrimentos desnecessários.

A verdadeira promessa

Em vez de negociar com Deus, a proposta espírita é simples e profunda: fazer da prece um recurso de fortalecimento íntimo, pedindo coragem e serenidade para enfrentar as dificuldades. A verdadeira promessa que podemos oferecer ao Criador é o compromisso íntimo de progredir moralmente, de lutar contra nossas más inclinações e de praticar a caridade em todas as circunstâncias.

Esse é o sacrifício mais agradável a Deus: o da nossa vaidade, do egoísmo e do orgulho.

Conclusão

O fenômeno das promessas, ainda tão presente em diferentes culturas, expressa uma fé que, embora sincera, carece de esclarecimento. O Espiritismo nos recorda que não há necessidade de negociar com o Criador, pois Ele já nos ama infinitamente. O que nos cabe é transformar a fé cega em fé raciocinada, sustentada pelo conhecimento, pela razão e pela prática da caridade.

A verdadeira libertação espiritual não se encontra em joelhos feridos ou cruzes carregadas, mas na renovação da consciência que, conhecendo a verdade, aprende a caminhar de cabeça erguida e coração sereno rumo ao progresso.

Referências

  • KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 1857.
  • KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 1864.
  • KARDEC, Allan. Revista Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos. 1858-1869.
  • COSTA, Mauro da Silva. “As Promessas”, artigo.

 

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