Introdução
O
ensino de Jesus sobre a busca do Reino de Deus e Sua Justiça (Evangelho segundo
Mateus, 6:25-34) convida a humanidade a um profundo exercício de transformação
moral. Ao afirmar: “Bem-aventurados os
que têm puro o coração, porque verão a Deus” e ao acolher as crianças como
modelo para alcançar o Reino dos Céus, Jesus assinala que a pureza de coração
está intrinsecamente ligada à simplicidade e à humildade, virtudes que excluem
o egoísmo e o orgulho.
Na
atualidade, em meio a crises éticas e morais observadas nos cenários político,
social e ambiental, essa lição evangélica ressurge com vigor renovado. A Revista Espírita (1858–1869) e as obras
da Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec reforçam que o progresso moral
acompanha o desenvolvimento intelectual, sendo responsabilidade de cada
Espírito integrar valores éticos superiores à própria conduta. Este artigo
busca refletir, à luz do Espiritismo, sobre a pureza de coração como fundamento
da Ética Espírita e sobre o papel do discernimento moral no processo evolutivo
do ser humano.
A Pureza de Coração como Fundamento da Ética
Espírita
Na
perspectiva espírita, a pureza de coração não se limita a um estado
sentimental, mas configura um padrão vibratório do Espírito em sintonia com as
Leis Naturais ou Divinas. Segundo O
Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo VIII, Jesus toma a infância como
símbolo dessa pureza justamente por representar a ausência de orgulho e de
egoísmo. Esses são os dois maiores entraves à evolução moral, e combatê-los é o
primeiro passo para construir um mundo interior alinhado ao bem.
O
avanço ético-espiritual se estabelece por meio do exercício do livre-arbítrio
orientado pela razão e pelo amor. À medida que o Espírito compreende o bem e o
mal, aumenta sua responsabilidade individual. Porém, como destaca a Codificação
Espírita, não basta saber: é necessário querer e agir no bem. A pureza,
portanto, se concretiza na ação, não apenas na intenção.
Discernimento Moral e Responsabilidade Pessoal
O
discernimento entre o bem e o mal é progressivo e proporcional ao
desenvolvimento intelectual. No entanto, a decisão de escolher o bem exige
amadurecimento do domínio afetivo, pois as emoções orientam a vontade. A Revista Espírita registra diversos
exemplos de Espíritos esclarecendo que a responsabilidade moral nasce quando
compreendemos as consequências de nossos atos para nós e para os outros.
Nesse
contexto, a Ética Espírita difere da ética convencional ao incluir, além da
comunidade encarnada, os Espíritos desencarnados que participam do progresso
coletivo pela mediunidade. Isso amplia a noção de responsabilidade, pois nossas
atitudes repercutem não apenas no mundo material, mas em toda a rede espiritual
que nos envolve.
O Sistema de Reparação e o Dever de Fazer o Bem
A Lei
de Causa e Efeito, amplamente abordada nos livros da codificação espírita e
desenvolvida em obras como A Gênese e
O Céu e o Inferno, assegura que toda
infração à Lei Divina ativa um mecanismo de reparação. Tal sistema não avalia
apenas o mal praticado, mas também o bem que poderia ter sido feito e foi
negligenciado.
Isso
reforça a máxima espírita de que não basta “não fazer o mal”: é imprescindível
empenhar-se em fazer o bem, cooperando com a obra de Deus. A omissão diante da
necessidade do próximo configura responsabilidade moral, pois cada oportunidade
de servir é também uma oportunidade de evoluir.
Misericórdia e Caridade: O Julgar e o Ser Julgado
Jesus
adverte: “Com a medida com que medirdes,
sereis medidos”. Essa máxima evidencia a íntima ligação entre julgamento e
autotransformação. A severidade com os outros cria em nossa consciência um
padrão de julgamento que será usado contra nós mesmos no momento do “cair em si”.
Por isso, o caminho da pureza de coração exige misericórdia — compreender o
erro alheio e estimular sua reparação com amor.
A
caridade, entendida como benevolência, indulgência e perdão (O Evangelho segundo o Espiritismo, cap.
XV), representa a expressão prática dessa misericórdia. Só podemos “tirar o cisco do olho do irmão” depois
de remover a “trave” do nosso próprio olhar — ou seja, após transformarmos
nossa conduta.
Conclusão
A
pureza de coração, símbolo da infância espiritual, é a pedra angular da Ética
Espírita. Em um mundo marcado pela “demolição de valores”, como apontam
análises sociais recentes, o Espiritismo propõe reconstruir o alicerce ético do
ser humano pelo autoconhecimento, pela caridade e pela vivência do amor
ensinado por Jesus.
Seguir
esse caminho não é isentar-se do mundo, mas atuar nele com responsabilidade,
justiça e compaixão, contribuindo para que o Reino de Deus se manifeste
progressivamente na Terra, tanto no plano individual quanto no coletivo.
Referências
- Allan Kardec. O
Evangelho segundo o Espiritismo. 1864.
- ——————. A Gênese.
1868.
- ——————. O Céu e
o Inferno. 1865.
- Revista Espírita
(1858–1869). Diversos artigos.
- Luiz Carlos D.
Formiga. “Construção e Demolição”. Artigo.
- Evangelho segundo
Mateus, capítulos 5–7.
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