sexta-feira, 19 de setembro de 2025

A FÉ COMO ANTÍDOTO AO DESESPERO
REFLEXÕES ESPÍRITAS SOBRE O SUICÍDIO E A ESPERANÇA
- A Era do Espírito -

Introdução

Em meio às tantas desigualdades que marcam o mundo contemporâneo, histórias de dor e resistência nos convidam a refletir sobre a fé, a esperança e o valor da vida. Recentemente, um documentário intitulado Vivendo entre os mortos mostrou a realidade de famílias haitianas que, por falta de condições mínimas de moradia, passaram a viver em jazigos de um cemitério. Entre os depoimentos, destacou-se o de uma anciã que, aflita ao cuidar de dez netos abandonados pela filha, disse: “Se o suicídio não fosse um pecado, há muito eu estaria morta.”

Essa frase, marcada por sofrimento e resignação, revela o drama humano diante da miséria e do desamparo social. Mas também suscita uma reflexão mais profunda: qual é o verdadeiro papel da fé na superação das provações? E por que o suicídio não representa um alívio, mas sim uma dolorosa ilusão?

A Dura Realidade e a Fragilidade Humana

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 700 mil pessoas morrem por suicídio a cada ano, e milhões de outras tentam pôr fim à vida. Os fatores são diversos: pobreza extrema, crises emocionais, doenças, isolamento ou falta de perspectivas. No entanto, por trás de cada caso há uma mesma raiz: a perda de sentido existencial.

No caso da anciã haitiana, a consciência de que o suicídio seria um erro a impediu de ceder ao desespero. Sua crença simples, mesmo limitada a uma noção de pecado, funcionou como amparo moral. Essa fé rudimentar cumpriu o papel de sustentar a vida em meio à dor, mostrando que a ligação com o sagrado é muitas vezes a única barreira contra o abismo.

A Visão Espírita sobre o Suicídio

O Espiritismo, desde O Livro dos Espíritos (questões 943 a 957), trata do suicídio como uma violação grave da lei natural. Não se trata apenas de “pecado” no sentido religioso, mas de uma agressão contra o próprio Espírito, que interrompe o ciclo de provas e aprendizagens programado antes da reencarnação.

Na Revista Espírita (dezembro de 1858), Allan Kardec analisou comunicações de Espíritos suicidas que, em vez de encontrarem a paz esperada, relatavam sofrimentos ainda maiores, consequência direta do ato. A morte voluntária não resolve os problemas, apenas prolonga a angústia em outra dimensão da existência.

Assim, ao ensinar que a vida é uma oportunidade concedida por Deus e que cada provação tem um propósito educativo, o Espiritismo oferece um entendimento racional e consolador: por mais dura que seja a dor, ela é temporária, enquanto o Espírito é eterno.

A Fé como Antídoto contra o Desespero

O antídoto contra a tentação do suicídio é a fé — não uma fé cega, mas esclarecida, capaz de enxergar a vida além da matéria. Kardec afirmou: “A fé inabalável é somente a que pode encarar a razão, face a face, em todas as épocas da humanidade.” (O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. XIX).

Essa fé racional nos dá a certeza de que:

  • a vida continua após a morte;
  • os sofrimentos têm causa justa, ainda que desconhecida no presente;
  • não há dor eterna, mas etapas de aprendizado e reparação;
  • sempre existem recursos espirituais e humanos para amparar quem sofre.

Para quem não possui esse esclarecimento, a fé simples, mesmo baseada apenas na noção de certo e errado, pode ser um sustentáculo poderoso, como no caso da anciã haitiana. Mas para quem conhece a Doutrina Espírita, a responsabilidade é maior: além de manter a própria fé, cabe estender solidariedade aos que caminham no limite do desespero.

Compromisso Moral diante da Dor alheia

A reflexão que nasce dessa história não pode ser individual apenas. Quantos vivem hoje em condições semelhantes, sem teto, sem alimento, sem apoio emocional? Quantos, sem o amparo da fé, cedem à ilusão do suicídio?

A Doutrina Espírita nos conclama à caridade como princípio essencial da vida. Não basta lamentar; é preciso agir. A cada gesto de fraternidade, uma vida pode ser preservada. Como ensinou Jesus: “Não queirais fazer aos outros o que não quereis que vos façam; mas fazei, ao contrário, tudo o que quereríeis que vos fizessem” (O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. XV).

Conclusão

A frase da anciã haitiana ecoa como alerta e convite. Alerta de que o desespero pode atingir qualquer um, em qualquer lugar. Convite para refletirmos sobre a importância da fé como escudo moral contra a tentação do suicídio.

O Espiritismo ensina que a vida é sagrada, que a esperança jamais deve ser abandonada e que, por maior que seja a dor, Deus nunca nos desampara. A fé esclarecida nos dá coragem para suportar as provas e forças para ajudar o próximo em sua luta.

Pensar nisso é mais do que reflexão: é compromisso de transformar a compaixão em ação, a fim de que ninguém precise viver entre os mortos enquanto ainda está entre os vivos.

Referências

  • KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 1857.
  • KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. 1864.
  • KARDEC, Allan. Revista Espírita. 1858-1869.
  • ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Suicide worldwide in 2019: global health estimates. Geneva: World Health Organization, 2021.
  • SILVA, Kayte. Reflexão sobre a Vida. Artigo.

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