terça-feira, 21 de outubro de 2025

DO GENOMA AO ESPÍRITO
O PRINCÍPIO VITAL E O PERISPÍRITO
NA PERSPECTIVA ESPÍRITA E CIENTÍFICA
- A Era do Espírito -

Introdução

O avanço da biologia molecular e o sequenciamento do genoma humano representaram marcos históricos na compreensão dos mecanismos que sustentam a vida orgânica. A ciência revelou com precisão como o DNA e o RNA atuam na codificação e regulação das funções biológicas. No entanto, mesmo diante dessa complexidade molecular, a questão essencial da vida — o que a anima e lhe dá direção — permanece aberta.

A Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec no século XIX, oferece uma contribuição singular a esse debate. Ao introduzir os conceitos de princípio vital e perispírito, o Espiritismo propõe uma visão integradora, que reconhece a base material da vida sem excluir sua dimensão espiritual. Este artigo reflete sobre o diálogo entre esses conceitos e as descobertas científicas atuais, buscando uma síntese racional entre ciência e espiritualidade.

1. Os três elementos universais: Deus, Espírito e Matéria

Em O Livro dos Espíritos (questões 27, 60 a 70), Kardec descreve três princípios fundamentais que compõem o universo:

  1. Deus, causa primária de todas as coisas;
  2. O Espírito, princípio inteligente da criação;
  3. A Matéria, elemento que serve de instrumento à ação do Espírito.

Para que a matéria viva, porém, há necessidade de um terceiro agente intermediário, o princípio vital — uma força que anima os organismos durante a encarnação. Assim, a vida é a associação harmônica de três elementos: o espírito, o perispírito e o corpo físico.

Quando o princípio vital se retira, cessa a atividade orgânica e o corpo retorna à inércia. A morte, portanto, não é destruição, mas libertação do Espírito — que continua vivo e consciente em outra dimensão.

2. O Perispírito: Matriz Organizadora da Vida Biológica

Em A Gênese e em diversos artigos da Revista Espírita, Allan Kardec descreve o perispírito como um envoltório semimaterial, formado a partir do fluido cósmico universal, que estabelece o elo entre o Espírito e o corpo físico. Esse envoltório sutil não é apenas um intermediário passivo, mas o instrumento ativo da vontade do Espírito, transmitindo-lhe as ordens e coordenando as funções vitais do organismo.

Segundo a Doutrina Espírita, o perispírito atua como modelo organizador da forma, servindo de matriz energética sobre a qual a matéria se estrutura. Desde a fecundação, ele orienta a disposição das células, guiando o desenvolvimento embrionário conforme o programa espiritual estabelecido antes da reencarnação. Dessa maneira, a biologia do corpo não é resultado apenas de forças físico-químicas, mas também da ação inteligente que o Espírito exerce por meio desse corpo fluídico.

Essa concepção, que unifica os princípios espirituais e biológicos, antecipa ideias hoje debatidas na biologia sistêmica e nos estudos sobre campos morfogenéticos, segundo os quais a organização da vida ultrapassa a simples soma das partes materiais. O perispírito, à luz do Espiritismo, pode ser compreendido como um campo estrutural e dinâmico, responsável por conferir coerência, identidade e unidade funcional ao ser encarnado.

Portanto, o corpo físico reflete o estado vibratório e moral do Espírito através do perispírito, que registra as experiências vividas e atua como mediador entre o princípio inteligente e a matéria. Assim, o estudo do perispírito oferece à ciência e à filosofia uma chave complementar para compreender a gênese e a manutenção da vida, revelando que a biologia é expressão visível de uma ordem espiritual invisível.

3. DNA, RNA e o princípio vital: os instrumentos da inteligência espiritual

A biologia moderna reconhece que o DNA contém as instruções genéticas e que o RNA executa essas instruções, promovendo a síntese das proteínas que sustentam a vida. Todavia, essas moléculas, por si mesmas, não explicam a origem da organização vital.

Quem coordena, interpreta e dá finalidade a esse processo? O Espiritismo responde: é o Espírito, atuando através do perispírito, que imprime direção ao conjunto das funções biológicas.

O DNA seria, assim, um instrumento de expressão, e não a causa da vida. O princípio vital — energia dinâmica que anima a matéria — é o que permite a manifestação do Espírito na forma orgânica. Essa concepção confere à biologia uma dimensão teleológica (*): a vida não é mero acaso molecular, mas expressão inteligente da consciência em evolução.

(*) Teleologia: Estudo dos fins e propósitos. A teleologia é a teoria filosófica que busca explicar algo a partir de sua finalidade, propósito ou objetivo, e não apenas por suas causas anteriores. O termo deriva do grego télos (fim, propósito, meta) e lógos (estudo, razão).

Enquanto a ciência moderna se concentra em explicar fenômenos com base em causas eficientes (como as coisas funcionam), a teleologia se baseia na ideia de que existe um propósito ou uma razão para que algo seja como é.

4. Epigenética e os campos sutis: um diálogo possível

As descobertas recentes em epigenética (**) e biologia de sistemas mostram que a expressão gênica depende não apenas da sequência do DNA, mas também de fatores ambientais, energéticos e comportamentais. Estresse, alimentação, emoções e pensamentos influenciam a ativação ou desativação de genes, e esses efeitos podem até ser herdados por gerações futuras.

Essa visão interativa e dinâmica da vida biológica aproxima-se do conceito espírita de interdependência fluídica entre o Espírito e o corpo. Pesquisadores espíritas como Hernani Guimarães Andrade e Alexandre Aksakof sugeriram que o perispírito funciona como um campo de informação energética, modulando processos celulares e epigenéticos.

Desse modo, o que a ciência chama de “campos biológicos” ou “padrões epigenéticos” pode ser interpretado, à luz do Espiritismo, como manifestações parciais da ação perispiritual sobre a matéria.

(**) Padrões epigenéticos são modificações químicas que ocorrem no DNA e nas proteínas associadas a ele, como as histonas, e que regulam a expressão dos genes sem alterar a sequência genética em si

5. Espírito, ciência e o mistério da vida

A biologia molecular desvendou o “alfabeto” da vida, mas ainda não identificou o autor do texto. O Espiritismo, sem negar as conquistas da ciência, acrescenta um princípio explicativo mais amplo: a consciência precede a forma. O Espírito é o agente inteligente que dirige e coordena a organização biológica, enquanto o corpo é apenas o instrumento transitório de sua manifestação.

Sob essa perspectiva, a vida não é um produto fortuito da matéria, mas uma expressão do Espírito que molda e ajusta o corpo de acordo com seu grau evolutivo. Cada célula, cada tecido, responde à influência organizadora do perispírito, que serve de intermediário entre a vontade espiritual e os mecanismos fisiológicos. Assim, o organismo reflete a história moral e intelectual do ser que o habita.

Kardec, em A Gênese, explica que “o Espírito é o ser inteligente que preside à formação do corpo”, indicando que a biologia da vida é sustentada por uma inteligência subjacente. Essa concepção amplia o horizonte da ciência contemporânea, ao reconhecer que a mente é uma força ativa capaz de interagir com a matéria viva, orientando seus processos em níveis ainda não plenamente compreendidos.

A morte, sob essa ótica, não representa o fim, mas uma mudança de estado vibratório, em que o Espírito se desvincula do corpo físico e continua sua jornada em planos mais sutis da existência. A vida, portanto, é contínua, e sua essência é espiritual.

Em síntese, o diálogo entre ciência e Espiritismo revela que compreender o mistério da vida exige integrar dois níveis de realidade: o mecânico e o espiritual, o molecular e o consciente. Somente nessa visão de conjunto a biologia alcança sua dimensão completa — a de um universo animado pela inteligência divina, em permanente evolução.

Conclusão

O diálogo entre Espiritismo e biologia moderna revela que vida e consciência são dimensões inseparáveis da existência. DNA e RNA explicam os mecanismos da hereditariedade, mas é o Espírito — através do perispírito e do princípio vital — que lhes confere unidade, direção e propósito.

Ao integrar ciência e espiritualidade, o Espiritismo oferece uma visão de vida contínua e inteligente, em que o ser humano é simultaneamente resultado e artífice da própria evolução.

Assim, compreender o perispírito como o elo entre a inteligência espiritual e a matéria orgânica é abrir caminho para uma nova biologia — a biologia do Espírito, em que o estudo da vida se une à compreensão do amor e da consciência como forças universais.

Referências

  • KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 1ª ed. 1857.
  • KARDEC, Allan. A Gênese. 1868.
  • KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858–1869).
  • ANDRADE, Hernani Guimarães. O Espírito, o Perispírito e a Alma. São Paulo: Instituto de Pesquisas Psicobiofísicas, 1981.
  • SHELDRAKE, Rupert. A Presença do Passado: Campos Morfogenéticos e Causas Formativas. 1988.
  • CHOPRA, Deepak; TANZI, Rudolph. Supercérebro: Libertando o Poder da Mente. São Paulo: Alaúde, 2013.
  • LEMOS, Décio Iandoli Jr. A Biologia do Espírito. São Paulo: FE Editora, 2016.
  • KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. 1861.

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