Introdução
A
infertilidade, tema sensível e multifacetado, vai além do diagnóstico médico e
das estatísticas demográficas. Sob o prisma da Doutrina Espírita, ela é
compreendida como uma experiência educativa inscrita nas Leis Naturais —
particularmente na Lei de Reprodução, conforme revelada pelos Espíritos
Superiores em O Livro dos Espíritos (questões 686 a 692).
Em uma
era de grandes avanços científicos na medicina reprodutiva, o Espiritismo
oferece uma visão ampliada, integrando corpo, mente e espírito na compreensão
desse fenômeno. A infertilidade deixa de ser apenas uma limitação biológica e
se revela como um campo de aprendizado moral e espiritual, em consonância com a
lei do progresso e da reencarnação.
1. A Lei de Reprodução e o equilíbrio da vida
Segundo
Allan Kardec, a Lei de Reprodução é uma das engrenagens da harmonia
universal. Através dela, a vida corporal se perpetua e os Espíritos encontram
meios de reencarnar, prosseguindo em seu aperfeiçoamento.
Na
questão 686 de O Livro dos Espíritos, os Instrutores afirmam que “sem reprodução, o mundo corporal pereceria”.
A fecundidade, portanto, não é um acaso biológico, mas parte de um plano divino
que assegura a continuidade da vida e a renovação moral da humanidade.
Quando
a capacidade de gerar se interrompe ou se ausenta, isso não significa injustiça
ou punição, mas manifestação das Leis de Causa e Efeito, que ajustam
cada ser conforme suas necessidades evolutivas.
2. A infertilidade como prova ou expiação
De
acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2024), cerca de 15% dos
casais em todo o mundo enfrentam dificuldades para conceber. As causas
físicas — disfunções hormonais, alterações genéticas, endometriose, fatores
imunológicos ou emocionais — são conhecidas e tratadas por meio de técnicas
como a fertilização in vitro (FIV), inseminação intrauterina (IIU),
microinjeção intracitoplasmática (ICSI) e doação de gametas.
Contudo,
a Doutrina Espírita convida a olhar além da matéria. A infertilidade pode
representar:
- Prova escolhida, antes da
reencarnação, para fortalecer laços conjugais, desenvolver paciência ou
exercitar o amor desinteressado;
- Expiação necessária, em função de
abusos anteriores das energias criadoras, como o uso irresponsável da
sexualidade, o aborto deliberado ou a negligência dos deveres familiares.
Em
ambos os casos, a infertilidade atua como instrumento de educação da alma,
que aprende a transformar a energia criadora em amor e serviço. Emmanuel
sintetiza esse conceito ao afirmar:
“A esterilidade não
existe para o Espírito, que pode ser fecundo em obras de beleza e redenção.” (Emmanuel,
psicografia de F. C. Xavier)
A
verdadeira fecundidade, assim, é espiritual — manifestando-se em obras,
virtudes e exemplos de amor.
3. A ciência e a fé: caminhos convergentes
Kardec
ensina em A Gênese (cap. XI, item 14) que “o Espiritismo e a Ciência se completam mutuamente”. Os avanços
médicos nas técnicas de reprodução assistida são expressões da inteligência
humana, atributo do Espírito em progresso.
A
ciência, ao aliviar o sofrimento e proporcionar esperança a muitos casais,
cumpre função divina, desde que orientada pela ética e pela responsabilidade
moral.
A lei
natural, no entanto, também impõe limites — recordando que o uso da vida deve respeitar
seus fins espirituais, sem transformá-la em objeto de manipulação ou lucro. A
fecundidade não é apenas biológica: é também moral e afetiva.
4. Adoção e paternidade espiritual
A
Doutrina Espírita valoriza a adoção como um dos mais sublimes gestos de
amor universal. Kardec ensina que os laços espirituais são mais fortes que os
laços de sangue, e que muitos reencontros redentores se dão justamente por meio
da filiação adotiva.
A
impossibilidade biológica, assim, pode abrir caminho à paternidade moral,
acolhendo Espíritos que necessitam de amparo e renovação. Nessa perspectiva, a
adoção é também um ato reparador, que transforma a dor da esterilidade em
instrumento de redenção e progresso mútuo.
5. A energia criadora e o amor responsável
A
energia sexual é força divina, originária do amor que sustenta o universo.
Emmanuel adverte:
“O amor, vindo de Deus,
é livre; mas, no terreno do sexo, ele é responsável.” (Dos Hippies aos
Problemas do Mundo, lição 27)
A
sexualidade equilibrada é expressão da harmonia interior. Quando mal
direcionada, gera desequilíbrios físicos e espirituais; quando sublimada,
converte-se em poder criador do bem.
A infertilidade, vivida com fé e serenidade,
pode ser o caminho de purificação dessa força, orientando-a para obras de generosidade
e elevação.
Conclusão
A
infertilidade, à luz do Espiritismo, é lição de amor e sabedoria divina.
Cada
Espírito, ao vivenciar essa experiência, recebe uma oportunidade singular de
crescimento, seja pelo aprendizado da renúncia, pela paternidade espiritual,
pela adoção ou pela fecundidade moral das boas ações.
Deus,
em sua justiça perfeita, não fecha portas sem abrir novas vias de evolução. A
alma que ama, serve e confia jamais é estéril aos olhos do Criador.
Como
ensina o Evangelho, o Pai Celeste transforma toda limitação em oportunidade de
luz. A verdadeira fecundidade não está no ventre, mas no coração que gera amor.
Referências
- ALLAN KARDEC. O
Livro dos Espíritos. 1867. Questões 258, 262, 686–692, 718–723.
- ALLAN KARDEC. A
Gênese. Cap. XI, item 14.
- EMMANUEL
(Espírito). Dos Hippies aos Problemas do Mundo. Psicografia de F.
C. Xavier.
- EMMANUEL
(Espírito). Mensagens diversas. Psicografia de F. C. Xavier.
- ORGANIZAÇÃO MUNDIAL
DA SAÚDE (OMS). Infertilidade: relatório mundial 2024.
- VICTOR PASSOS. Infertilidade
numa Visão Espiritual.
- Revista Espírita (1858–1869),
artigos sobre reencarnação e leis naturais.
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