sábado, 18 de outubro de 2025

OS PEQUENINOS E A LEVEZA DO ESPÍRITO
UMA REFLEXÃO ESPÍRITA SOBRE A SIMPLICIDADE
- A Era do Espírito -

 

Introdução

Em meio à complexidade do mundo moderno — marcado por pressões, consumo, ansiedade e busca incessante por reconhecimento —, as palavras de Jesus sobre os pequeninos soam mais atuais do que nunca. “Deixai vir a mim os pequeninos, porque deles é o Reino dos Céus” (Mateus 19:14). No simbolismo do Evangelho, a infância representa não apenas a pureza, mas também a leveza espiritual, a capacidade de se desapegar e confiar. Essa lição, reinterpretada à luz da Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec, convida o ser humano a reencontrar o equilíbrio entre o saber e a simplicidade, entre o progresso e a humildade.

A pipa, surge como imagem perfeita desse ensinamento: feita de materiais leves, só se mantém no ar quando não carrega peso em excesso. Assim também é o Espírito — quanto mais livre das paixões materiais e do egoísmo, mais alto pode ascender na escala evolutiva.

1. A Leveza como Condição do Progresso Espiritual

Em O Livro dos Espíritos, os Espíritos Superiores ensinam que “a perfeição moral consiste na depuração das imperfeições da alma” (questão 909). A leveza espiritual, portanto, é fruto do esforço individual por libertar-se das paixões inferiores, do orgulho e do apego às coisas transitórias.

Como a pipa que precisa estar despojada de adereços para alcançar o céu, o Espírito necessita desprender-se das ilusões materiais para avançar.

Na Revista Espírita de março de 1862, Kardec observa que “os Espíritos felizes não são os mais sábios segundo os homens, mas os mais simples e puros de coração”. O progresso intelectual, sem o correspondente progresso moral, torna-se peso que impede o voo da alma. É na pureza de intenções — não na erudição — que reside a verdadeira sabedoria.

2. A Simplicidade como Virtude Esquecida

O homem moderno multiplicou suas necessidades artificiais. Vive cercado de tecnologias, informações e objetos, mas sente-se cada vez mais vazio. Essa saturação material reflete-se também no campo espiritual: os sentimentos tornam-se complexos, os relacionamentos superficiais e a vida, pesada.

Em O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo VIII, “Bem-aventurados os que têm puro o coração”, Kardec comenta: “A pureza de coração é inseparável da simplicidade e da humildade; exclui todo pensamento de egoísmo e de orgulho.”

Jesus, ao exaltar os pequeninos, propunha um retorno à essência — não à ignorância infantil, mas à confiança espontânea, à autenticidade e à receptividade interior que caracterizam a criança.

A simplicidade não é atraso, mas equilíbrio. É a capacidade de viver com o necessário, de pensar sem complicar, de sentir sem corromper. No mundo atual, ela é virtude revolucionária, pois se opõe ao excesso, à pressa e à superficialidade que dominam a cultura contemporânea.

3. A Infância como Símbolo do Espírito Renovado

Do ponto de vista espírita, a infância é uma fase de recomeço moral. Em O Livro dos Espíritos (questão 383), aprendemos que, ao reencarnar, o Espírito passa pelo estado de infância para “se aproximar da simplicidade primitiva e se despojar, por algum tempo, do caráter e dos hábitos anteriores”.

A criança é, assim, o símbolo do Espírito em regeneração — leve, receptivo e ainda desprovido das cristalizações mentais que o orgulho produz com o tempo.

Jesus utilizou essa imagem para nos recordar que o progresso espiritual não se mede pela idade da carne, mas pela disposição da alma em aprender e amar. Tornar-se como os pequeninos significa reviver, conscientemente, essa pureza interior que nos aproxima de Deus.

4. A Vida Moderna e o Peso do Supérfluo

A metáfora da pipa permanece atual. Muitos de nós tentamos “voar” com a alma sobrecarregada — de bens, culpas, vaidades e ansiedades. O resultado é o mesmo de uma pipa cheia de adornos: não sai do chão.

No campo social, essa condição reflete-se em fenômenos crescentes de sofrimento psíquico: depressão, ansiedade e sensação de vazio existencial, especialmente entre os jovens. O Espírito, sufocado pelas exigências do ego e do consumo, busca inconscientemente o retorno à simplicidade perdida.

É por isso que o Espiritismo, ao unir ciência, filosofia e moral, oferece uma resposta moderna e racional à necessidade de leveza: a compreensão das Leis Divinas e o cultivo da vida interior. O conhecimento espiritual liberta quando é vivido com humildade e aplicado no bem.

Conclusão: O Chamado à Leveza

A lição dos pequeninos é um convite à transformação íntima e à depuração moral. Para ascender espiritualmente, é preciso reencontrar o equilíbrio entre o saber e o sentir, entre o progresso técnico e o amor fraterno.

Assim como a pipa, o Espírito só alcança as alturas quando se torna leve — leve de orgulho, leve de vaidade, leve de ambição. O fio que o sustenta é a fé, e o vento que o eleva é o amor.

Resgatar a pureza e a simplicidade não significa voltar ao passado, mas avançar com consciência, desprendimento e confiança nas Leis Divinas. Somente os corações simples compreendem plenamente o Evangelho, pois, como ensinou Jesus, “bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus”.

Referências

  • Allan Kardec. O Livro dos Espíritos. 1857.
  • Allan Kardec. O Evangelho segundo o Espiritismo. 1864.
  • Allan Kardec. Revista Espírita (1858–1869).
  • Cechelero, Andrey. Os Pequeninos.
  • Momento Espírita. Os pequeninos de Jesus no poema. Disponível em: momento.com.br/pt/ler_texto.php?id=7534&stat=0
  • Evangelho de Mateus, cap. 19, vers. 14.
  • Emmanuel (psicografia de Chico Xavier). A Caminho da Luz. FEB, 1939.

 

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