Apesar de compartilharem pontos em comum — como a
crença na imortalidade da alma, na reencarnação e na comunicação com os
Espíritos —, a Umbanda e o Espiritismo são tradições distintas, com origens,
práticas e compreensões diferentes acerca do mundo espiritual. Compreender
essas diferenças e convergências é essencial para promover o respeito e o
entendimento entre religiões que se aproximam em seus princípios de caridade e
de auxílio ao próximo.
Origens e
Influências
O Espiritismo foi codificado por Allan Kardec na
França do século XIX, a partir do estudo metódico das manifestações
espirituais. Apresenta-se como uma doutrina de natureza filosófica, científica
e moral, visando à compreensão racional da existência e da vida espiritual. Já
a Umbanda surgiu no Brasil, no início do século XX, como uma religião de
caráter sincrético, integrando elementos de tradições africanas, indígenas,
católicas e também ideias espíritas, com ênfase em práticas rituais, cantos,
danças, uso de ervas e o culto a diversas entidades espirituais.
Enquanto o Espiritismo valoriza a fé raciocinada e
o estudo doutrinário, a Umbanda enfatiza o aspecto simbólico, místico e
ritualístico das práticas espirituais, ligadas ao sagrado manifestado na
natureza e nas expressões culturais do povo.
Práticas
e Cultos
Na Doutrina Espírita, a prática está centrada no
estudo das obras da Codificação, no aprimoramento moral e na vivência da
caridade. As reuniões mediúnicas são reservadas, sérias e voltadas ao
esclarecimento e auxílio aos Espíritos desencarnados. Não há cultos exteriores,
imagens ou rituais.
Já a Umbanda realiza suas atividades em terreiros,
com a incorporação de entidades espirituais, defumações, pontos cantados e
outras expressões ritualísticas voltadas ao acolhimento dos consulentes. Existe
uma organização entre as entidades espirituais, como Pretos Velhos, Caboclos,
Crianças e Exus, que atuam por meio dos médiuns de forma característica.
Entidades
Espirituais: Pontos de Vista
Sob a ótica da Doutrina Espírita, os Espíritos são
individualidades em constante processo de evolução. Não são classificados por
nomes simbólicos, mas por graus de adiantamento moral e intelectual. Os
Espíritos superiores não se prendem a formas exteriores ou rituais,
manifestando-se com o objetivo de instruir, consolar e orientar para o
progresso espiritual.
Na Umbanda, as entidades apresentam personalidades
definidas e características que representam arquétipos do inconsciente coletivo
e das tradições culturais afro-brasileiras. A Doutrina Espírita reconhece que
essas manifestações podem ser legítimas, desde que estejam orientadas para o
bem, a caridade e o progresso — mesmo que suas formas expressem uma linguagem
simbólica diversa daquela adotada no Espiritismo.
A Razão e
o Misticismo
O Espiritismo propõe uma fé fundamentada na razão.
Ensina que a fé verdadeira é aquela que pode enfrentar a razão face a face, em
todas as épocas da Humanidade. Por isso, rejeita o sobrenatural e o misticismo,
buscando compreender os fenômenos espirituais à luz da lógica, da observação e
da moral.
A Umbanda, por sua vez, trabalha com as energias da
natureza, com o simbolismo dos orixás e com práticas sagradas que evocam a
ancestralidade e o universo simbólico. Essa abordagem não anula a autenticidade
da espiritualidade umbandista — apenas revela um caminho diferente, mais
intuitivo e ritualístico, de comunhão com o divino.
Convergências:
Pontos em Comum
Apesar das diferenças em forma e linguagem, Umbanda
e Espiritismo compartilham princípios fundamentais:
- Crença na reencarnação como expressão da justiça divina e mecanismo
de evolução do Espírito.
- Reconhecimento da comunicação com o mundo espiritual, por meio da
mediunidade, e da influência dos Espíritos em nossa vida cotidiana.
- Prática da caridade como base essencial para o crescimento interior
e a transformação do mundo.
- Inspiração nos ensinamentos de Jesus, reconhecido como guia e
modelo de perfeição moral para a Humanidade.
O que a
Doutrina Espírita pode Ensinar sobre a Umbanda?
A Doutrina Espírita oferece instrumentos para
compreender aspectos da Umbanda, como a lei de causa e efeito, a pluralidade
das existências, a realidade espiritual e a necessidade do aperfeiçoamento
moral. No entanto, é fundamental compreender que a Umbanda não é uma vertente
do Espiritismo, e sim uma religião autônoma, com fundamentos, práticas e
linguagem próprios. O respeito entre as tradições começa pelo reconhecimento
dessa identidade.
Conclusão
A Umbanda e o Espiritismo são caminhos distintos
que conduzem à espiritualização do ser humano. Enquanto o primeiro se ancora na
vivência simbólica, no acolhimento ritual e na ancestralidade, o segundo se
estrutura sobre o estudo, a razão e o esclarecimento progressivo da realidade
espiritual. Ambos, no entanto, buscam aliviar o sofrimento, promover o bem e
elevar o Espírito.
A Doutrina Espírita, com seu convite ao amor e à
lucidez, ensina que todas as religiões que promovem a moral, a fraternidade e o
bem comum são instrumentos válidos de elevação espiritual. O estudo do
Espiritismo nos permite ampliar a visão sobre o fenômeno religioso, sem
preconceitos, com espírito de diálogo e compreensão, reconhecendo que, em
essência, "fora da caridade não há salvação."
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