Introdução
O
poeta Ferreira Gullar, em sua obra O Menino e o Arco-Íris, afirma que “estamos em guerra”, não apenas nas
disputas externas e visíveis, mas, sobretudo, na guerra silenciosa e cotidiana
que travamos ao lidar com desafios, frustrações e escolhas. De fato, a vida
moderna, com suas exigências materiais e emocionais, coloca o ser humano diante
de um campo de batalhas invisíveis, que exigem não apenas preparo físico, mas,
principalmente, força moral e espiritual.
A
Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec no século XIX, ilumina essa
realidade ao revelar que a verdadeira luta não está apenas na conquista dos
bens transitórios, mas no desenvolvimento do espírito imortal. Assim, o exercício
moral, comparável ao exercício físico para o corpo, torna-se essencial para o
progresso individual e coletivo.
O Exercício Moral como Força do Espírito
O
corpo físico, por meio da disciplina e da atividade, ganha resistência e vigor;
o espírito, pela prática da moralidade, fortalece-se contra o desânimo, o
egoísmo e as tentações do imediatismo. Esse fortalecimento não se limita ao
intelecto lógico, mas alcança a inteligência moral, mencionada em O Livro
dos Espíritos (questões 780 a 785), que impulsiona a humanidade à
verdadeira civilização.
Enquanto
o corpo é transitório, destinado à decomposição natural, o espírito é imortal e
progride de forma contínua, carregando consigo os frutos das experiências
vividas. Como esclarece Kardec na Revista Espírita (julho de 1860), os
sofrimentos e provas não são punições arbitrárias, mas instrumentos educativos
que despertam a consciência e conduzem ao aperfeiçoamento.
A Guerra Invisível do Cotidiano
A luta
pelo sustento, pelas relações humanas e pela sobrevivência material reflete
apenas parte da realidade existencial. A guerra mais profunda é travada no
íntimo de cada ser, entre paixões e virtudes, entre o egoísmo e a fraternidade,
entre a indiferença e a compaixão.
Essas
batalhas silenciosas constituem o campo de provas e expiações descrito em O
Evangelho segundo o Espiritismo. É ali que o livre-arbítrio se manifesta em
sua plenitude: semear é sempre uma escolha, mas colher é uma lei natural
inevitável.
Sofrimento e Evolução: Inteligência Além da Razão
O
Espiritismo ensina que as dificuldades não têm por objetivo castigar, mas
desenvolver faculdades superiores: paciência, resignação, compaixão, humildade.
São os “tesouros que não enferrujam e que
a traça não destrói”, mencionados por Jesus no Sermão da Montanha.
Essa
pedagogia espiritual explica por que as bem-aventuranças, vistas sob a ótica
material, podem parecer absurdas: como ser feliz na dor? Contudo, sob a ótica
espiritual, revelam-se como lições profundas de libertação e progresso.
Emmanuel, em A Caminho da Luz, reforça que cada experiência dolorosa
representa um degrau na ascensão da humanidade, preparando-a para patamares
mais elevados de consciência.
Conclusão
A
guerra de cada dia não é apenas contra as carências materiais, mas, sobretudo,
contra as nossas próprias imperfeições. O corpo serve de instrumento
transitório, mas o espírito recolhe os frutos eternos de cada prova vencida.
Assim,
a prática constante da moralidade — o exercício do perdão, da fraternidade e da
fé raciocinada — é a verdadeira preparação para as batalhas da vida. O
Espiritismo nos mostra que essa guerra invisível não é uma condenação, mas uma
oportunidade redentora, pela qual aprendemos que o sofrimento, quando bem
compreendido, é um poderoso agente de evolução.
Referências
- KARDEC, Allan. O
Livro dos Espíritos. 1857.
- KARDEC, Allan. O
Evangelho segundo o Espiritismo. 1864.
- KARDEC, Allan. Revista
Espírita (1858-1869).
- EMMANUEL (pelo
médium Francisco Cândido Xavier). A Caminho da Luz. FEB, 1939.
- FERREIRA GULLAR. O
Menino e o Arco-Íris.
- SANTOS, Dalmo Duque
dos. A Habilidade e a Competência Espiritual.
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