sábado, 6 de setembro de 2025

DOENÇA MENTAL E ESPIRITUALIDADE:
UMA ANÁLISE À LUZ DA DOUTRINA ESPÍRITA
- A Era do Espírito -

Introdução

A história da humanidade revela que, em épocas passadas, os transtornos mentais eram vistos com temor e preconceito. Atribuídos a influências demoníacas ou forças obscuras, os chamados “loucos” eram submetidos a tratamentos brutais e desumanos, muitas vezes reduzidos à tortura ou ao extermínio, a fim de “preservar” a honra das famílias. A Idade Média, com a prática da trepanação e outras mutilações, é exemplo emblemático dessa ignorância.

Somente a partir do Renascimento e do Iluminismo surgiram esforços para racionalizar o tratamento da loucura, ainda que por métodos punitivos ou repressivos, como os de Pinel e Tuke. Com o advento da psiquiatria e da psicanálise, novos paradigmas foram introduzidos, mas ainda insuficientes para compreender a totalidade do fenômeno psíquico. No século XX, o surgimento dos psicofármacos representou avanços importantes, mas também trouxe novos desafios éticos e limitações.

À luz da Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec, é possível reinterpretar o problema da doença mental em perspectiva mais ampla, considerando o ser humano como Espírito imortal, em processo contínuo de evolução. O Espiritismo oferece elementos que articulam as descobertas da ciência com as causas espirituais profundas, ampliando o horizonte da compreensão e do tratamento das enfermidades psíquicas.

1. A Visão Espírita sobre a Loucura

Em O Livro dos Espíritos, Allan Kardec dedica questões específicas ao estudo da alma, do perispírito e das doenças que afetam a mente. Na Revista Espírita (1861, 1863, 1864), ele analisa relatos de possessões, obsessões e casos de loucura, distinguindo o que é de origem orgânica do que é de natureza espiritual.

Para o Espiritismo, a doença mental não pode ser reduzida apenas a fenômenos biológicos. Em muitos casos, ela reflete:

  • Expiações ou provas reencarnatórias, que visam ao reajuste do Espírito perante a lei de causa e efeito.
  • Influências espirituais (obsessões), quando entidades desencarnadas, por sintonia negativa, agravam ou desencadeiam distúrbios psíquicos.
  • Desequilíbrios morais e emocionais acumulados, provenientes de existências anteriores ou da atual.

Assim, o que a ciência médica observa como esquizofrenia, psicose ou demência, o Espiritismo compreende também como expressão das marcas perispirituais e do processo evolutivo do ser.

2. Entre Ciência e Espiritismo

A psiquiatria avançou ao oferecer recursos farmacológicos (clorpromazina, antidepressivos tricíclicos, fluoxetina, antipsicóticos atípicos), que permitem controlar sintomas e reintegrar pacientes à sociedade. Contudo, tais tratamentos atuam principalmente nos efeitos, e não nas causas profundas.

O Espiritismo, sem rejeitar a medicina, propõe uma visão complementar:

  • Integração entre corpo, mente e Espírito.
  • Tratamento espiritual aliado ao médico, por meio de passes, preces, desobsessão e estudo evangélico.
  • Reeducação moral, pois a verdadeira cura se dá quando o Espírito se reconcilia com sua consciência e com a Lei Divina.

Allan Kardec recomendava em O Evangelho Segundo o Espiritismo (cap. XXVIII) a prece pelos enfermos como recurso legítimo de auxílio. André Luiz, em Ação e Reação, analisa como culpas do passado repercutem no psiquismo atual. Joanna de Ângelis, em O Ser Consciente, esclarece que o autoconhecimento é caminho de libertação das enfermidades emocionais.

3. O Valor do Estudo das Causas Espirituais

A Doutrina Espírita ensina que não existe acaso. Cada experiência de sofrimento, inclusive a doença mental, encontra raízes na justiça divina e no merecimento do Espírito. A obsessão, como explicada por Kardec e estudada amplamente na prática dos centros espíritas, é fator desencadeante em muitos casos diagnosticados como psicose.

A pesquisa em hospitais espíritas, como citado nos trabalhos do Dr. Mário Sérgio Silveira, confirma que em grande número de pacientes há forte componente espiritual. Isso reforça a necessidade de união entre a psiquiatria e a espiritualidade, sem preconceitos.

4. Mediunidade e Loucura: A Linha Tênue

Muitos médiuns ostensivos, ao não compreenderem sua faculdade, acabam confundidos com doentes mentais. A Revista Espírita e O Livro dos Médiuns orientam que a educação da mediunidade é essencial para evitar desequilíbrios.

A mediunidade não é doença, mas faculdade natural do Espírito. Quando reprimida ou malconduzida, pode gerar sintomas semelhantes aos transtornos psíquicos. Daí a importância da orientação espiritual segura, sem jamais descartar o acompanhamento médico necessário.

Conclusão

O problema da doença mental é complexo e exige múltiplos olhares. A ciência oferece avanços inegáveis, mas ainda não consegue abarcar toda a dimensão espiritual do ser humano. O Espiritismo, ao integrar a lei de causa e efeito, a reencarnação e a realidade das influências espirituais, amplia o horizonte da compreensão.

O desafio está em unir ciência e espiritualidade, medicina e Evangelho, psiquiatria e mediunidade, sem preconceitos nem dogmatismos. Somente assim poderemos oferecer verdadeiro amparo aos que sofrem, substituindo o estigma pelo respeito, a exclusão pela fraternidade e a desesperança pela certeza da imortalidade.

Referências

  • FOUCAULT, Michel. História da loucura na idade clássica. São Paulo: Perspectiva, 1978.
  • FRANCO, Divaldo Pereira (Joanna de Ângelis – Espírito). O ser consciente. Salvador: Centro Espírita Caminho da Redenção, 1993.
  • KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos.
  • KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo.
  • KARDEC, Allan. A Gênese.
  • KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858–1869).
  • XAVIER, Francisco Cândido (Emmanuel – Espírito). Religião dos Espíritos.
  • XAVIER, Francisco Cândido (André Luiz – Espírito). Ação e Reação. Rio de Janeiro: FEB, 1996.
  • PASSOS, Victor Manuel Pereira de. Demónios, loucos, deficientes mentais e o Espiritismo. Artigo.
  • Notas: Revista Cristã de Espiritismo, nº 27, pp. 6–11.

 

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