sábado, 20 de setembro de 2025

TERRITÓRIO, CULTURA E CIDADANIA
UMA REFLEXÃO À LUZ DA DOUTRINA ESPÍRITA
- A Era do Espírito -

Introdução

O ser humano é, por natureza, um espírito imortal que, em cada encarnação, encontra na Terra um território e um grupo social para desenvolver suas experiências. Embora a Doutrina Espírita ensine que somos, em essência, cidadãos do universo, cada existência terrena exige um ponto de referência, um “lugar” que nos acolhe e nos molda. É nesse território — geográfico, cultural e afetivo — que o Espírito encontra oportunidades para crescer moralmente, relacionar-se, cultivar valores e aprender a conviver com as diversidades.

Se o Espiritismo é universalista e transcende fronteiras, ele também reconhece que a vida encarnada nos obriga a valorizar o espaço e a cultura nos quais estamos inseridos. Mais que uma questão política, trata-se de uma exigência moral: aprender a respeitar a diversidade, cooperar e construir coletivamente uma sociedade mais justa.

Território, lugar e pertencimento

Allan Kardec (em A Gênese, cap. XVIII) já apontava que a humanidade vive um período de transição, deixando para trás formas de organização baseadas na opressão, no egoísmo e no autoritarismo. O território, nesse contexto, é mais do que espaço físico: é o laboratório da vida moral.

Ao nascer em determinada região, o Espírito encontra uma língua, uma cultura, uma memória coletiva. Esse vínculo favorece sua integração social, fortalece a solidariedade e combate o sentimento de isolamento. A Doutrina Espírita nos lembra que não estamos no mundo ao acaso (O Livro dos Espíritos, q. 258-273); nossas condições de vida, inclusive o local onde nascemos, são instrumentos educativos escolhidos conforme as necessidades de progresso.

Globalização e os riscos da alienação moral

O processo de globalização, embora facilite a circulação de ideias e de pessoas, também gera desterritorialização e perda de vínculos culturais. Muitos indivíduos, desenraizados de suas tradições, sofrem com a chamada “morte psíquica”, isto é, a perda de referências que dão sentido à vida.

Do ponto de vista espírita, esse fenômeno é mais que social: é moral. Quando uma sociedade privilegia o consumismo e o individualismo em detrimento da solidariedade, instala-se um vazio interior. A alienação espiritual manifesta-se na dificuldade de encontrar significado na existência, levando a desequilíbrios emocionais, à violência e ao aumento das desigualdades.

A função moral da cidade

As cidades são, em última análise, expressões coletivas do estado moral de seus habitantes. Nelas se desenvolvem experimentos políticos, econômicos, culturais e religiosos. Se a competição e o lucro desenfreado dominam, geram exclusão; mas se valores éticos e fraternos orientam a convivência, as cidades se tornam berços de progresso moral e social.

Na Revista Espírita (dezembro de 1868), Kardec enfatizou que a verdadeira revolução esperada pela espiritualidade não é a das armas, mas a revolução moral, capaz de transformar consciências. Essa revolução começa no território íntimo de cada ser humano e se expande para os lugares em que vive, transformando-os.

Diversidade, religiosidade e tolerância

Outro ponto essencial é o respeito à diversidade cultural, religiosa e de gênero. O mundo globalizado frequentemente tenta homogeneizar modos de vida, apagando singularidades. No entanto, para o Espiritismo, a pluralidade é lei da natureza: espíritos diferentes, em graus distintos de evolução, convivem lado a lado, aprendendo uns com os outros.

Em O Evangelho segundo o Espiritismo (cap. XI), lemos que a lei de amor é a base da vida social. Isso exige tolerância, respeito às diferenças e rejeição de toda forma de preconceito. A diversidade cultural e religiosa não deve ser vista como ameaça, mas como oportunidade de crescimento mútuo.

O paradigma emergente: cidadania moral e espiritual

Se o modelo atual privilegia a concentração de riquezas e a exploração da natureza, os sinais de um novo tempo já se manifestam. Esse novo paradigma, apontado tanto pela ciência quanto pela espiritualidade, baseia-se na cooperação, na solidariedade e no respeito à vida em todas as suas formas.

Para o Espiritismo, esse é o caminho do mundo de Regeneração, previsto por Kardec em A Gênese. Trata-se de uma transformação moral coletiva, na qual a cidadania vai além de direitos políticos: envolve o compromisso de cuidar do próximo, do território e da Terra como patrimônio comum.

Conclusão

O território é mais do que espaço físico: é cenário de experiências espirituais e campo de aprendizado moral. A Doutrina Espírita nos convida a superar o individualismo e a viver a verdadeira cidadania, fundada na lei de amor, na solidariedade e no respeito à diversidade.

As dificuldades atuais — globalização excludente, desigualdades sociais, crises culturais — são sinais de um modelo em decadência. Mas, como ensina Kardec, “a humanidade está madura para compreender ideias mais amplas” (A Gênese, cap. XVIII). Cabe a cada um de nós transformar o lugar em que vivemos num espaço de fraternidade, contribuindo, assim, para a regeneração da humanidade.

Referências

  • KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 1857.
  • KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. 1864.
  • KARDEC, Allan. A Gênese. 1868.
  • KARDEC, Allan. Revista Espírita (1858-1869).
  • XAVIER, Francisco Cândido (pelo espírito Emmanuel). A Caminho da Luz. 1939.

 

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